Raquel Freire confirma pressões na RDP e ERC entra em acção

Foto
Cineasta era uma das cinco vozes do programa que acabou Foto: PÚBLICO

"Desde as últimas eleições tenho sentido um incómodo por parte de algumas pessoas sempre que falo de política e denuncio os ataques feitos à democracia por quem está no poder”, contou Raquel Freire, ao PÚBLICO, num dia em que o PÚBLICO noticiou que a RDP pôs fim a um programa de opinião que foi palco de duras críticas a Angola e à emissão especial que a RTP fez do programa Prós e Contras, a 16 de Janeiro, a partir de Luanda. Quatro dos cinco cronistas da referida rubrica de opinião confirmaram ao PÚBLICO que a decisão de acabar com aquele espaço só foi comunicada na segunda, ao final da tarde.

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) vai chamar para audições a direcção de informação da RDP e o director-geral da RTP, assim como o jornalista Pedro Rosa Mendes por causa da polémica sobre o fim do programa de opinião "Este Tempo.

Numa entrevista disponível na edição desta quarta-feira do PÚBLICO e também na edição online exclusiva para assinantes, Rosa Mendes conclui que "Angola é um dos assuntos tabu em Portugal".

Raquel Freire aproveitou a sua crónica de terça-feira, a última da sua autoria, para anunciar que também foi informada do fim desse espaço. A cineasta dedicou-a ao tema da liberdade, fazendo referência ao filme Good Night and Good Luck, que retrata um grupo de jornalistas que lutam pelo direito à informação e por denunciar alguns dos atentados políticos aos direitos fundamentais cometidos pelo senador Joseph McCarthy. Na crónica, Raquel Freire questiona “para que serve uma rádio pública e um serviço público?” se não for para servir as pessoas que não têm voz, adiantando duas respostas, em jeito de interrogação: “Para dar voz às pessoas ou para ser a voz do dono?”. O programa estava no ar há cerca de dois anos e os contratos terminariam agora.

Pedro Rosa Mendes disse ao PÚBLICO ter sido informado, por telefone, que a sua próxima crónica, a emitir na quarta-feira, será a última. “Foi-me dito que a próxima seria a última porque a administração da casa não tinha gostado da última crónica sobre a RTP e Angola”, adiantou o jornalista, por telefone, a partir de Paris.

O PS quer explicações e admite solicitar a presença do ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, na Assembleia da República, para esclarecer esta matéria. Nesse sentido, João Portugal deixou “um apelo” aos deputados do PSD e do CDS “para que votem favoravelmente o requerimento”, que dará entrada ainda nesta terça-feira na mesa da Comissão Parlamentar de Ética, Cidadania e Comunicação.

Contactado pelo PÚBLICO, na manhã desta terça-feira, o gabinete do ministro Miguel Relvas declinou comentar o assunto, limitando-se a dizer que "é uma decisão exclusivamente do foro editorial da RDP".

“Nos últimos tempos, no que respeita a um conjunto de directores de informação que chamámos ao Parlamento, designadamente os da RTP Madeira e Açores, PSD e CDS inviabilizaram sempre os requerimentos do PS. No caso concreto de uma possível censura de uma opinião de um jornalista, esperamos que PSD e CDS votem desta vez favoravelmente”, disse o socialista João Portugal.

“Na Antena 1, alguém responsável deve vir aqui prestar esclarecimentos. Em segunda instância, depois de ouvirmos os directores de informação e de programação, se entendermos conveniente, chamaremos também a comissão o ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares”, acrescentou o deputado.

Miguel Relvas foi já interpelado, por escrito, pelo Bloco de Esquerda. A deputada Catarina Martins endereçou ao governante um pedido de esclarecimentos sobre o fim do espaço de opinião “Este tempo”. A bancada “bloquista” quer saber se o Governo tinha conhecimento da decisão da RDP de terminar com aquele segmento, de quem é a responsabilidade dessa decisão e quais os fundamentos em que esta se baseia.

“É de registar a coincidência temporal entre a difusão da referida crónica – que é crítica sobre a emissão de um programa que teve como representante do Governo justamente o ministro que tutela a comunicação social – e a decisão de suspensão deste espaço de opinião”, lê-se na pergunta enviada pelo BE a Miguel Relvas. “A confirmar-se que este espaço de opinião terminará devido ao teor da referida crónica, esta atitude configura um acto de censura inaceitável num estado democrático, que tem na liberdade de imprensa e na sua independência dos poderes instituídos um dos seus pilares fundamentais.”

Sugerir correcção
Comentar