Vivem no fio da navalha, num estado limite quase permanente, sem perspectivas de futuro. A precariedade não se resume ao emprego e não é temporária: é um modo de vida do qual muitos arriscam não sair. Este é o retrato de uma geração feita no livro “Jovens em Transições Precárias – trabalho, quotidiano e futuro”, um estudo do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE, coordenado por Nuno de Almeida Alves.
O livro explora a realidade de jovens trabalhadores de Lisboa, Porto, Guimarães e Setúbal, inseridos em trabalhos pouco qualificados (dos 80 jovens entrevistados, apenas dez eram licenciados) e de baixa remuneração (o tecto salarial era de 700 euros e eram poucos os que conseguiam esse valor).
“Experimentação, estágio, 'part-time'”: o sociólogo Nuno de Almeida Alves lança as três palavras para definir o mercado de trabalho actual. “A dificuldade de integração laboral, substituída por uma sucessão de estágios não remunerados, define trajectos laborais longos, que podem mesmo chegar a nunca ser concluídos”.
Sem perspectivas
É uma realidade que terá “consequências muito graves do ponto de vista social”, lamenta o sociólogo: “As pessoas chegam aos 30 ou aos 40 anos e nunca tiveram um emprego estável”. O adiamento da transição para a vida adulta tem efeitos, por exemplo, na natalidade (“as condições para a maternidade, quando são conseguidas, surgem mais tarde”) e na diminuição das prestações para a Segurança Social, devido aos contratos intermitentes ou aos recibos verdes com que muitos jovens trabalham.
Um traço comum desta população – com idades compreendidas entre os 18 e os 34 anos – é a percepção de que estudar compensa. Para os jovens menos qualificados, a escolarização é vista como uma das únicas vias para “viabilizarem as suas aspirações sociais e económicas”. “Foi uma agradável surpresa”, conta o sociólogo.
Mesmo os licenciados, ainda que se sintam “muitas vezes frustrados” por não terem um emprego condizente com a formação, “acham que [a faculdade] foi uma valorização pessoal importante”.
Emigração em cima da mesa
A descrença em relação ao país – outro traço comum da amostra entrevistada no segundo semestre de 2010 – leva alguns dos jovens a pensarem na emigração como “algo plausível”: “Algumas pessoas – não muitas – referiram que não acreditavam que a sua situação possa melhorar sem que saiam do país”.
A autonomia face à família é em quase todos os casos inexistente: “Todos precisam da ajuda dos pais, seja apoio financeiro seja apoio prático no dia-a-dia”. Nuno de Almeida conta que, para estes jovens, “é difícil pensar o futuro, mesmo que a curto prazo”. “Vamos ter de trabalhar mais horas, isso é certo, e às vezes trabalhar em mais do que um sítio”. Uma tendência para se manter? “Só as circunstâncias da economia podem determiná-lo.”
Se o estudo fosse feito no ano de 2011, “provavelmente teríamos mais pessoas a querer emigrar”, acredita. “O cenário é semelhante [ao de 2010], mas as pessoas estão ainda mais pessimistas, com menos expectativas e desencantadas”. É aquilo a que o sociólogo chama de “peso diário”: “O receio de não vir a ter direito a um futuro”.