Há uma caixinha de música e palhaços assassinos no palácio dos espelhos. Há ferrugem e uma infância abençoada. De um lado um circo demoníaco. Do outro aniversários com balões, carrinhos e piões.
Está na estrada “A Grande Tribulação”, o último trabalho dos Dealema — cuidado: cantado de fresco —, que tem dois lados: um luminoso; o outro obscuro, quase gore. Fuse, Maze, Mundo, Ex-peão e DJ Guse ainda brincam, mas estão mais velhos. Dois deles (Fuse e Ex-peão) já são pais e o “pentágono” já tem fãs que ainda não eram nascidos em 1996, ano do “Expresso do Submundo”, primeiro álbum do grupo. “É um bocado estranho. Já vemos pais e filhos a curtirem nos concertos”, disse Maze ao P3.
Por isso é que os Dealema falam do “futuro da raça”, das novas gerações e da nova educação. Por isso é que há um single “A última criança”. Por isso é que “A Grande Tribulação” tem tanto de luminoso como de sombrio. “Sempre tivemos uma visão reivindicativa. E nos tempos que correm as nossas letras infelizmente passaram a fazer mais sentido. Sentimos a crise na pele, como qualquer artista que vive na precariedade. Por isso é inevitável passarmos essas frustrações para a música”.
Ouvimos os Dealema falarem de frustrações, de Economia, da “bancarrota planetária” e não estranhamos. “Os problemas sociais estão espalhados pelo disco todo”, assume Maze. Pelos discos todos. “Sem tomar partido político”.
Parque de diversões com poço da morte
Se “A Grande Tribulação” tem um “A última criança”, também tem um “Verdade ou consequência” (tema incluído no disco a pedido de várias famílias), um sinistro “circo demoníaco” que mistura o espectro do mundo real e parte da colecção de filmes de terror (“Killjoys Revenge” e “Clownhouse”) de Fuse (aka Inspector Mórbido).
Essa é o lado negro da força que os Dealema, vasto arsenal, exploram até ao tutano. Sejam bem-vindos ao parque de diversões. Mas não se esqueçam que lá dentro há um poço da morte — e uma versão quase heavymetal de um álbum que é puro hip-hop.
“A Grande Tribulação” (com participações especiais de Ace, Guito Maldiva e Ana Correia) apresenta-se ao país em três grandes concertos. De Sul para Norte: em Faro (dia 8, na Associação dos Músicos), em Lisboa (dia 9, na Sala TMN) e no Porto (dia 10, no Hard Club). Os três concertos contam com a presença do espanhol Nach (o Hard Club junta ainda o norte-americano Rob Swift).
“O disco”, explica Maze, é um retrato da humanidade em pleno processo de desumanização, “é como se fosse um filme com vários capítulos”. Ainda vamos a tempo? Os Dealema acham que sim. Mas quem vacilar...