Temas que Passos Coelho não deve abordar com José Eduardo dos Santos
Mas Monica Sawyer, gestora de operações para Angola do BM, lembra que, apesar da colaboração do Governo angolano, há passos a dar, sobretudo no cumprimento da lei. Exemplos: o BM "não tem registo de que estejam a ser aplicadas" a lei da probidade pública ou a lei sobre as aquisições públicas, que servem para assegurar o controlo de desvios de fundos e a transparência.
O Governo angolano tem ainda respostas por dar, diz Diarmid O"Sullivan, um dos autores do relatório sobre o petróleo em Angola da GW. Com quem faz negócios a Sonangol? Como os faz? Por que faz com aquelas empresas específicas e quem beneficia? Há ainda dúvidas sobre a relação entre o Governo e a Sonangol ou sobre o que a Sonangol tem exactamente em países como Portugal. Saber quem são os seus parceiros, o que a Sonangol faz com o seu dinheiro e, novamente, as relações que tem com o Governo são as grandes questões em aberto. A GW, sublinha, não afirma que a Sonangol é corrupta, mas "pode dizer que a corrupção oficial em Angola é um problema".
Deve Passos Coelho abordar estes temas sensíveis na sua visita? Para O"Sullivan, Portugal deveria demarcar "uma fronteira entre o que é fazer negócios e o que é fazer acordos secretos que podem levar à corrupção". Deve assegurar que as leis internacionais contra a corrupção são aplicadas nos negócios que assina e fazer pressão para uma maior transparência na relação entre o Governo angolano e a Sonangol. "É claro que é difícil para o primeiro-ministro abordar o assunto, mas não é do interesse de Portugal ter negócios caóticos em Angola." A Passos Coelho perguntaria também: "O que está a fazer para assegurar que não há dinheiro sujo em bancos portugueses?"
A falta de transparência de empresas petrolíferas - nomeadamente o facto de serem detidas por subsidiárias com sede em paraísos fiscais, sem que se saiba quem são os accionistas - não é um problema exclusivo de Angola, mas "um enorme problema global", sim. "Está muito além de um país em particular. Em relação a Angola, quando o Estado detém petrolíferas, isso cria todo o tipo de riscos."
Luís de Sousa, presidente da Transparência e Integridade Associação Cívica (TIAC), ponto de contacto com a Transparência Internacional, não tem dúvidas sobre o posicionamento de Portugal: "Ninguém dá lições de moral a Angola." A questão da transparência pode, no entanto, colocar-se no contexto da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), que tem nos seus estatutos a progressão nas boas práticas de governação, a salvaguarda dos direitos humanos e o reforço dos direitos democráticos, mas que, como entidade internacional, "está a fazer zero". Resumindo: "A tónica não é condenar especificamente Angola, porque muitos empresários portugueses vão lá e pagam subornos."
Mas a questão não é consensual. Heather Lowe, conselheira jurídica e directora na Global Financial Integrity, defende que temas como a corrupção devem estar nas agendas diplomáticas e não devem ser "tabu". Políticos como Passos Coelho devem dizer a governos com quem estão a negociar como o de Angola: "Há muita pressão pela transparência, há leis: estão preparados para isso?" Mais, é importante ainda que Portugal mostre a Angola que as suas empresas, o seu sistema financeiro "não são um paraíso seguro para a corrupção".
Não é o que tem acontecido, critica o jornalista angolano Rafael Marques, que na segunda-feira apresentou na Procuradoria-Geral da República de Luanda uma queixa-crime contra sete generais ligados a empresas de extracção de diamantes por "actos quotidianos de tortura". Na verdade, ao aceitarem fazer negócios com empresas detidas por políticos angolanos, as entidades portuguesas "estão a alimentar a alta corrupção em Angola". Mais do que se pronunciar sobre questões internas, Passos Coelho deve "conter o envolvimento do Estado e das empresas portuguesas em actos que violam as leis internacionais, portuguesas e angolanas". Fundamental é Portugal "garantir" que não é "um dos principais acessórios da alta corrupção em Angola". A Passos Coelho "bastaria" dizer publicamente que "as empresas portuguesas devem contribuir para a transparência em Angola e que o Governo vai trabalhar com as empresas portuguesas e o Estado angolano para apoiar a política de tolerância zero contra a corrupção", acrescenta.
A jurista e professora universitária angolana Mihaela Webba concorda: ao primeiro-ministro português não compete interferir nos assuntos de Angola, mas poderia verificar se a legislação de combate à corrupção e branqueamento de capitais está a ser cumprida nos negócios entre os dois países. "A imagem de Angola que se vende em Portugal é a do Eldorado. Mas confunde-se crescimento económico, liquidez, com desenvolvimento económico. Luanda é a capital mais cara do mundo e o custo média de vida é de 500 euros quando o salário mínimo ronda os 100 euros..." Como é que Portugal se tem posicionado? "Fechando os olhos."