Dicionário da língua da antiga Mesopotâmia terminado ao final de 90 anos
A obra, chamada "O dicionário de Assírio de Chicago", foi produzida pelo Instituto Oriental da Universidade de Chicago, Estados Unidos, e tem a explicação de 28 mil palavras em acádio, uma língua semita que foi falada e escrita nas cidades do Médio Oriente da região da Mesopotâmia, onde hoje ficam a Síria e o Iraque. Antigamente, chamava-se a esta língua o assírio, e o dicionário acabou por ficar com este nome.
Apesar da língua ser mais antiga, os significados das palavras referem-se a um período entre 2500 a.C. até 100 da nossa era. A obra ultrapassa a função de explicar o significado de uma palavra e coloca cada termo no seu contexto, fazendo várias associações históricas à literatura, à lei, à religião, ao comércio ou ao quotidiano.
“Cada termo, cada palavra torna-se uma janela para a cultura”, disse citada pelo New York Times a reitora de humanidades da Universidade, que trabalha no projecto desde 1979 e é a editora principal desde 1996.
A explicação da palavra “umu”, que significa “dia”, estende-se por 17 páginas. Uma das referências é a sua utilização na "Epopeia de Gilgamesh", escrita em acádio, uma das primeiras epopeias poéticas da humanidade, que diz: “Aqueles que tomaram coroas que em dias passados regeram a terra.”
“Muito do que se vê é absolutamente reconhecível”, disse à AP Matthew Stolper, professor da Universidade de Chicago que trabalhou na obra, intermitentemente, durante 30 anos. “As pessoas a expressarem medo e raiva, a expressarem amor, a pedirem amor.”
“Há inscrições de reis a dizerem quão fantásticos eram, e inscrições de outros que diziam que estes homens não eram assim tão fantásticos”, disse Stolper. “E há uma frase comum em cartas antigas babilónicas que quer dizer literalmente ‘não te preocupes com nada’.”
O acádio é escrito em símbolos cuneiformes e é um dos sistemas de escrita mais antigos da humanidade. Os especialistas analisaram textos em pedra e argila. “Retirava-se o pó, e poderia emergir uma carta de alguém sobre uma nova criança na família, ou outra carta que podia ser sobre um empréstimo até à época da colheita”, disse Robert Biggs, um professor emérito do instituto que trabalhou durante 50 anos neste projecto e que como arqueólogo desenterrou tábuas que foram utilizadas para a obra.
“Apercebemo-nos que isto não foi uma cultura só de reis e rainhas, mas também de pessoas comuns, como nós, com as mesmas preocupações de segurança, alimentação e de abrigo para elas e para a sua família”, disse o arqueólogo citado pelo The Guardian, acrescentando que estas cartas lidas hoje dão vida às suas experiências. Ao longo dos 90 anos, os editores da obra foram-se sucedendo. O primeiro volume foi publicado em 1956.
Segundo Gil Stein, o director do Instituto Oriental, esta obra é “uma ferramenta de investigação indispensável para qualquer estudioso que quer explorar o registo escrito da Mesopotâmia”, disse, citado pelo New York Times, numa conferência esta segunda-feira.
“Tudo o que temos como certo tem a sua origem na Mesopotâmia, quer sejam as próprias cidades, as sociedades estatais, a invenção da roda, a forma como medimos o tempo, ou o mais importante, a invenção da escrita”, disse Matthew Stolper à AP. “Se alguma vez quisermos compreender as nossas raízes, temos que compreender esta grande primeira civilização.”
A colecção custa ao todo 1358 euros, mas está disponível livremente na internet aqui.
Notícia corrigída às 16h15 de 8 de Julho