Burj Khalifa: O gigante está meio vazio

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Um T2 no Burj Khalifa pode ser alugado por cerca de 20.000 euros anuais Foto: Ahmed Jadallah/Reuters

O impressionante espectáculo pirotécnico que, há pouco mais de um ano, assinalou a inauguração oficial do edifício mais alto do mundo já não disfarçava completamente o clima de desânimo que assolava o Dubai. Mas os meses seguintes encarregaram-se de acinzentar ainda mais o cenário. Hoje, o Burj Khalifa, imponente nos seus 828 metros de altura, é um gigante parcialmente vazio.

O próprio baptismo do arranha-céus é um sinal dos tempos. Era para se chamar Burj Dubai ("burj", de forma simplista, quer dizer "torre" na língua local), mas as dificuldades financeiras enfrentadas pelo emirado, onde não parecia haver impossíveis para a engenharia humana (lembremos, nomeadamente, os projectos das ilhas artificiais ao largo da costa), obrigaram o xeque Mohammed bin Rashid Al Maktoum a pedir ajuda a outro dos Emirados Árabes Unidos (EAU), o vizinho Abu Dabi. Os petrodólares chegaram com generosidade e a situação estabilizou. E o edifício mais alto do mundo, orgulho do Dubai, passou a chamar-se Burj Khalifa, homenageando o presidente dos EAU, Khalifa bin Zayed Al Nahyan.

Lançado em plena febre do imobiliário, o projecto nasceu e cresceu a uma velocidade estonteante. As escavações iniciaram-se em Janeiro de 2004, pouco mais de um ano depois (Março de 2005) o edifício começou a crescer. Com a altura final sempre mantida em segredo, o Burj alcançou os 50 andares em Junho de 2006 e os 100 em Janeiro de 2007. Daí para a frente (e com a torre a afunilar), os andares eram cada vez mais pequenos e nasciam ao ritmo de dez por mês. Em Julho de 2007, com 141 pisos, já era o edifício mais alto do mundo. Em Setembro desse ano batia o recorde para a estrutura mais alta construída pelo homem.

A altura final de 829 metros foi alcançada em Janeiro de 2009, apenas cinco anos depois do início das obras. Seguiram-se os arranjos exteriores e interiores, antes de uma inauguração com pompa e circunstância, a 4 de Janeiro de 2010. O Burj mudava a paisagem, mas o cenário que o esperava era agora, também ele, bastante diferente. A crise financeira que surpreendera o mundo três anos antes obrigara o próprio Dubai a pedir ajuda externa. E, apesar da espantosa proeza tecnológica e humana que representa, o maior arranha-céus do mundo luta agora para ser financeiramente bem sucedido.

Os promotores garantem que cerca de 90 por cento das residências particulares já estavam vendidas no dia da inauguração. Mas quem as comprou, na maior parte dos casos com a ideia de as arrendar posteriormente, tinha-se metido num sarilho. Hoje, calcula-se que 825 das 900 residências vendidas a preços que chegaram a atingir os 6500 euros por metro quadrado estarão vazias. Ninguém as arrenda, apesar de o valor dos alugueres ter caído cerca de 40 por cento no último ano.

Mais barato do que Lisboa

Ainda assim, a quebra no mercado de arrendamento representa apenas uma fracção da registada nas aquisições: para quem quiser comprar um apartamento no Burj Khalifa, o valor médio do metro quadrado anda agora pelos 1800 euros, menos de um terço do que se praticou na fase mais eufórica da procura. A título de exemplo, o valor médio do metro quadrado em Lisboa ronda os 2500 euros...

Curiosamente - ou não, sabendo-se como o sector de superluxo nunca está em crise -, os apartamentos que melhor resistiram à erosão dos preços são os que têm a marca Armani (entre os pisos 9 e 16). Decorados pela celebérrima casa italiana, estas 144 distintas residências vendem-se por qualquer coisa à volta dos 3000 euros por metro quadrado, quase o dobro do que custam as outras (situadas entre os pisos 45 e 108). O primeiro hotel de Giorgio Armani, com 160 quartos e suites, ocupa a base da torre até ao 8.º andar e também os pisos 38 e 39. O terço superior da torre foi reservado para escritórios e há poucos dados disponíveis sobre os níveis de ocupação destes 37 pisos.

A expectativa é que o mercado de arrendamento comece a mexer-se a partir do momento em que se atingir um equilíbrio de valores entre a procura e a oferta. Ainda pode demorar um pouco, não só porque o impressionante boom imobiliário no Dubai faz com que não faltem alternativas no mercado, como também porque os proprietários de apartamentos no Burj Khalifa não são propriamente do tipo de ficar à mercê de súbitas dificuldades financeiras que os obriguem a alugar abaixo do preço de custo...

Neste momento, e já com os tais 40 por cento de abatimento à conta da crise, um T2 no Burj Khalifa pode ser alugado por cerca de 20.000 euros anuais, qualquer coisa à volta de 1670 euros por mês. Não é, propriamente, barato, mas talvez seja o preço a pagar para se poder dizer: "Eu vivo no edifício mais alto do mundo!"

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