Contrapartida pela compra dos submarinos foi avaliada em 210 milhões de euros a mais

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Os Estaleiros de Viana são um dos beneficiários das contrapartidas Hugo Delgado/arquivo

É um caso exemplar no sensível dossier das contrapartidas na compra de equipamento militar. E da falta de fiscalização e rigor. O caso envolve os Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC) e uma contrapartida dada pelo consórcio German Submarine Consortium (GSC), que inclui a Ferrostaal, e englobada no programa de venda de dois submarinos a Portugal. Pedro Catarino, presidente da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC), admitiu, na Comissão parlamentar de Defesa Nacional há uma semana, onde foi ouvido à porta fechada, que houve uma sobreavaliação, de acordo com os relatos feitos ao PÚBLICO.

A diferença de avaliação é enorme: o consórcio avaliou a contrapartida em 250 milhões de euros, um valor que o Estado português aceitou, mas os Estaleiros Navais fazem uma avaliação muito mais baixa: 40 milhões de euros. E a questão não é de pormenor. Afinal, o valor das contrapartidas é um dos elementos com peso na negociação da compra de equipamento.

A história conta-se em poucas palavras. O consórcio alemão, que prometera 1,2 mil milhões de euros de contrapartidas – negócios com empresas portuguesas pela compra dos dois submarinos – entregou aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo equipamento usado do estaleiro Flender, que entretanto encerrou na Alemanha. A empresa alemã apresentou uma proposta para que fosse contabilizada esta contrapartida como “fornecimento de equipamento a custo zero” no valor de 250 milhões de euros. E a Comissão de Contrapartidas aceitou. É isso que se lê na página 61 do relatório de 2009 da CPC, entregue há duas semanas à Assembleia da República.

Na reunião da Comissão de Defesa, Pedro Catarino foi confrontado com este caso e com informações de que, na avaliação feita pelos estaleiros de Viana do Castelo, através do inventário do equipamento, o valor da contrapartida seria de 40 milhões, seis vezes menos do que o prometido pelo GSC. O presidente da CPC admitiu então que esse era um dos casos em que uma contrapartida foi avaliada por cima, ainda de acordo com relatos da reunião feitos ao PÚBLICO.

No total, o consórcio em que está a Ferrostaal prometeu um total de 650 milhões de euros em negócios aos estaleiros de Viana do Castelo, em que se incluíam os 250 milhões do material do estaleiro de Flender. Um valor que levou o ministro da Defesa em 2004, Paulo Portas, a dizer que salvava os estaleiros da falência.

O incumprimento das contrapartidas na compras de equipamento militar está no centro de uma polémica que levou o BE a propor uma comissão parlamentar de inquérito, entretanto adiada.

A Comissão de Defesa está a fazer uma série de audições a entidades ligadas ao sector, no âmbito da qual já foi ouvido Pedro Catarino e o ministro da tutela, Augusto Santos Silva.

Nem os Estaleiros de Viana nem a Comissão das Contrapartidas quiseram prestar quaisquer outras informações ao PÚBLICO.

Um inquérito adiado

Fernando Rosas, deputado do Bloco de Esquerda (BE), não tem dúvidas que sobreavaliação do equipamento alemão para os Estaleiros de Viana do Castelo é um caso exemplar. De como as contrapartidas "não eram levadas a sério" até 2008 por "agentes político e económicos ligados ao dossier". "É uma razão mais para justificar a comissão de inquérito [proposta pelo BE] às contrapartidas" na defesa, disse, questionado pelo PÚBLICO. O inquérito está adiado, enquanto se concluem as audições na Comissão de Defesa sobre as contrapartidas, até fim de Maio.

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