Um admirável mundo

Apesar de não ser tão conhecido como outros músicos que exploraram a fundo a alquimia dos sons, como Miles Davis ou Brian Eno, o trompetista Jon Hassell construiu uma carreira que atravessa de forma oblíqua toda a música do final do século XX, projectando-a agora, poderosamente, para o novo século. Com este novo disco e uma extensa digressão norte-americana, Hassell revela uma vitalidade surpreendente para um músico de 72 anos que redefiniu parâmetros, nos anos 80 e 90, nos mais variados géneros músicais, do "ambient" ao jazz, electrónica, pop, ou à chamada "música do mundo".

Regressado à ECM, 23 anos depois de "Power Spot", Hassell encontra nos valores de produção da editora o contexto ideal para uma re-actualização dos seus princípios sonoros, que aqui surgem mágicos, mais brilhantes do que nunca, evocando diversos pontos chave da sua discografia, nomeadamente a série "Fourth World", o já referido "Power Spot", "City: Works of Fiction", "Dressing for Pleasure" ou "Fascinoma". Simultâneamente acessível e experimental, a música de Hassell desafia categorizações e é baseada em estímulos sensoriais não tangíveis. Para isso, o trompetista realiza inúmeras sessões de estúdio, pesquisando sons, explorando ritmos e arranjos, num ritual que tem tanto de racional como de instintivo. Em "Last Night the Moon...", a música desenvolve-se lentamente, numa polirritmia subtil que é acentuada pelas linhas profundas do baixo e pelas melodias intemporais do trompete de Hassell - metamorfose constante de formas e sons que fazem do álbum uma peça única. Com sucessivas audições, o admirável mundo de Hassell é-nos progressivamente revelado numa imensidão de detalhes sónicos. Um mundo que, apesar de já não ser novo (os alquimistas fizeram escola e estão por todo o lado), raramente nos é revelado com tamanho brilho.

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