Isto são canções pop contagiantes: melodias para cantarolar e harmonias ideais para libertar falsetes pouco afinados.
Mas isto também é rock'n'roll desafiante, matéria visceral alimentada por alienação adolescente e espoletada pela razão mais antiga de todas: o aborrecimento do quotidiano. E é punk em regime lo-fi, um "menos é mais" feito com o material que está à mão porque, na realidade, não é preciso nada mais. Isto são os Wavves, ou seja, o californiano Nathan Williams.
"Wavvves" é o seu último álbum, sucessor da estreia homónima, editada em cassete - o "v" a mais marca a diferença. Por trabalhar o ruído num contexto pop, a música dos Wavves foi comparada à dos também californianos No Age. Sendo inevitável o paralelismo, os Wavves são uma outra coisa. Enquanto aqueles são um levantamento comunal concentrado em dois tipos apostados em fazer as coisas acontecer, os Wavves são o miúdo que, simplesmente, se está nas tintas. Sobra-lhe o humor para sobreviver ao tédio do dia que corre, sobra-lhe uma guitarra, uma bateria, um sintetizador e uma evidente capacidade para extrair dali canções - estão soterradas em ferrugem mas agraciadas por um sol retemperador.
"You see me, I don't care", frase repetida insistentemente em "To the dregs", resume a atitude - e vem embrulhada em melodia de inocência Beach Boys e interpretação corrosiva. Já o "when I die" visceral que é a base de "California goths", seguido do "na-na na na na" de girl-group que se lhe segue, seguido de explosão garageira irresistível, serve tanto para revelar o humor da empreitada quanto o talento intuitivo de Williams.
Estes Wavves que intercalam as descargas eléctricas com "suites" cósmicas danificadas - quais Animal Collective de antigamente, ainda mais primitivos -, que inventaram um hino pop para o século XXI nos três minutos de "So bored", que investem sobre o lo-fi dos Beat Happening com a ferocidade do solo de "In bloom", dos Nirvana, estes Wavves que fazem pop para cantarolar e o seu exacto contrário - na mesma canção, o que é obra -, conseguiram um feito raro. Capturaram um estado de espírito, uma sensação de impotência perante o correr dos dias. Mas fizeram-no em música que, simplesmente por existir, é uma vitória sobre essa apatia. Entusiasmante e inspirador.
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