Governo anula adjudicação do Siresp logo após as eleições

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O Governo declarou nula a adjudicação do polémico sistema de telecomunicações Inácio Rosa/Lusa

A decisão, concretizada num despacho conjunto dos ministros da Administração Interna e das Finanças, a que o PÚBLICO teve acesso, tem por base um parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República, que considera este acto ferido de nulidade por o Governo PSD-CDS, em funções de gestão na altura do acto, não possuir a competência necessária para tal.

O parecer da PGR invoca a violação do número 5 do artigo 186 da Constituição, que circunscreve os poderes do Governo demissionário aos "actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos".

O anterior Governo concretizou a adjudicação três dias depois das eleições legislativas de Fevereiro passado, com base numa informação oral prestada pelo auditor jurídico do MAI, o magistrado do Ministério Público Dias Gomes, que justificava o acto com a sua "urgência". O Siresp é um negócio avaliado em 538 milhões de euros e tem por finalidade dotar as polícias, os bombeiros e a emergência médica de comunicações integradas e tecnologicamente mais avançadas.

A decisão do actual Governo não anula todo o concurso, cuja legalidade, aliás, é salvaguardada no parecer da PGR. A sua consequência mais directa é a de fazer com que o processo regresse à fase de apreciação do relatório final da comissão de avaliação. Na prática, o Governo vai negociar outra vez com este consórcio, que foi o único concorrente depois de outras empresas terem optado por não concorrer ao considerarem que o concurso estava previamente decidido. No limite, os contactos podem ser abertos a outras empresas interessadas.

O processo que agora culmina nesta decisão do Governo foi desencadeado em 30 de Março passado por um despacho de António Costa, em que eram suscitadas várias questões sobre o acto de adjudicação do Siresp. António Costa quis saber se o Executivo de Santana Lopes, sendo de gestão, era competente para produzir o acto de adjudicação; se havia "adequação financeira" na solução proposta pelo consórcio; se a opção tecnológica era a mais acertada e, também, se juridicamente tudo estava correcto.

Neste contexto, o MAI pediu pareceres à PGR, ao Ministério das Finanças e ao Ministério da Ciência e Tecnologia, bem como à Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), e também que o auditor jurídico do MAI formulasse por escrito o despacho favorável que dera.

O parecer da PGR foi elaborado depois de uma análise prévia dos regimes jurídicos das parcerias público-privadas e da contratação pública e começou por afastar uma eventual ilegalidade do concurso. "Em face dos dados disponíveis, afigura-se que o procedimento relativo à concepção, projecto, financiamento, montagem, construção, gestão e manutenção do Siresp não revela, até ao acto de adjudicação, a existência de vícios geradores de invalidade dos actos aí praticados susceptíveis de serem ainda [...] impugnados", é afirmado no documento.

O conselho consultivo considera, no entanto, que não tem elementos para se pronunciar sobre uma eventual "existência de actuações violadoras do princípio da imparcialidade da administração".

Quanto ao despacho de adjudicação, assinado por Daniel Sanches e Bagão Félix, a interpretação é diferente. "O Despacho Conjunto nº 219/2005 de 23 de Fevereiro, do ministro das Finanças e da Administração Pública e do ministro da Administração Interna, membros de um governo de gestão, em funções após a sua demissão, operada pelo decreto do Presidente da República [...], enferma de nulidade, por violação do nº5 do artigo 186º da Constituição", afirma o parecer da PGR. Ou seja, a declaração de nulidade aplica-se ao acto de adjudicação mas não ao conjunto do processo.

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