Frida Kahlo morreu há 50 anos

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Vista como um símbolo da arte mexicana da primeira metade do século XX, foi, porém, a sua tempestuosa vida que a tornou única DR

Nascida num outrora subúrbio da Cidade do México, a 6 de Julho de 1907, com apenas seis anos sofre uma ataque de poliomielite que afectará para sempre a sua perna direita. Os seus estudos, iniciados em 1922, vão pô-la em contacto com a sua alma gémea, quando das janelas da Escola Nacional Preparatória vê o muralista Diego Rivera pintar o mural "La Creacion". Mas o encontro - e os desencontros - com Diego ainda está para vir. Antes, quando era noiva de Alejandro Gómez Arias, sofre um acidente de viação que lhe parte a coluna vertebral em três sítios, bem como a clavícula, três costelas, a perna e o pé direito. Mas o mais grave é que o acidente, que lhe fura o sexo em três sítios, impedi-la-á de ter filhos, um facto que não só a atormentará ao longo da sua vida como terá reflexos na sua obra enquanto artista.

Corria o ano de 1926. Enquanto se mantém em convalescença, Frida começa, na cama do hospital, a dar os primeiros passos na pintura, e da sua paleta saem retratos obscuros, com formas rígidas e convencionais. Um ano depois, dá-se o primeiro encontro com Diego Rivera - já então pintor célebre, rodeado de uma aura de boémio: Frida mostra-lhe os seus quadros e o pintor mostra interesse por ela. Em 1929, estão casados - ela tem 22 anos, ele 43.

Até 1934 - ano em que Diego tem um romance com a irmã mais nova de Frida, Cristina Kahlo -, o casal parece viver sem problemas, viajando pelos Estados Unidos: se Diego continua a pintar murais, nos quadros de Frida começam a aparecer motivos de forte carga simbólica, onde a presença de ex-votos, o popular e o religioso se combinam com os símbolos do imaginário mexicano.

"Pinto a minha própria realidade"

Sozinha, depois da relação entre a irmã e o marido, regressa de Nova Iorque em 1937. Também não é uma data qualquer: Leon Trostky e a sua mulher Natalia refugiam-se no México e instalam-se na sua casa de Coyoacán, mais conhecida como Casa Azul. Além da chegada de um dos líderes da Revolução Bolchevique de 1917, o ano de 1937, se é considerado como um dos mais prolixos na obra de Frida, é também aquele em que o problema que tem com o álcool se torna mais problemático e evidente.


Depois de Trotsky - com quem Frida terá um caso amoroso -, chega ao México, em 1938, André Breton. Equivocado ou não, Breton inscreve o trabalho de Frida no cânone surrealista. Ela não aceita a classificação e observa: "Pensaram que eu era surrealista, mas não o fui. Eu pinto, não os meus sonhos, mas a minha própria realidade."

Realiza a sua primeira exposição em Nova Iorque, na Julien Levy Gallery, ao mesmo tempo que partilha a sua vida com o fotógrafo Nicholas Muray. Depois de Nova Iorque, segue para Paris, onde participa na exposição "México", organizada por André Breton, com 18 telas. As relações com Diego deterioram-se ao ponto de chegarem ao divórcio.

Embora tenha recusado a inscrição do seu nome na vertente surreal, em 1940 participa na Exposição Internacional do Surrealismo. "Nem tu, nem Derain, nem eu sabemos pintar rostos como os de Frida Kahlo", escreve Picasso a... Rivera. O seu exotismo chega à alta roda do mundo da moda: Elsa Schiaparelli cria o "vestido Madame Rivera" e a revista "Vogue" faz capa com a sua mão cheia de anéis.

Mas a outra face da moeda da vida voltam à tona d'água: deprimida, com a ausência de Diego, o assassinato de Trotsky (a mando de Estaline) e a dependência do álcool levam-na a aproximar-se do ex-marido e, em finais de 1940, voltam a casar-se.

"Mar, tempestade, nebulosa, mulher"

Em 1942, começa a escrever um diário. Da escrita sobre a espuma dos dias, o que ressalta são as contínuas declarações de amor a Diego, marcas de solidão, e sobre o corpo que a continua a torturar. Incansavelmente, porém, não deixa de trabalhar: expõe no Boston Institute of Contemporary Arts, no MoMA de Nova Iorque e em várias outras cidades dos Estados Unidos. Desde então, a figura de Diego é, para Frida, o centro do seu mundo. Se o pintor escreve no ensaio "Frida Kahlo e a Arte Mexicana" que " (...) para Frida, o tangível é a mãe, o centro de tudo, a matriz; mar, tempestade, nebulosa, mulher", de 1944 a 1949, Frida pinta obras tão emblemáticas como "Retrato de Diego", "Diego no Meu Pensamento" e "Diego e Eu".


Os anos 50, para a pintora, voltam a ser traumáticos: em 1950 é internada durante nove meses com uma infecção na coluna vertebral e, em 1953, é-lhe amputada a perna direita por gangrena. "A minha pintura tem em si a mensagem da dor", diz.

Ao mesmo tempo que pinta - tem a sua primeira exposição individual e simultaneamente retrospectiva no México, em 1953 -, participa, a 2 de Julho de 1954, numa manifestação contra o golpe de Estado na Guatemala, depois de ter estado internada duas vezes com uma bronco-pneumonia. Onze dias depois, Frida Kahlo falecia na sua Casa Azul de Coyoacán: no funeral cantou-se "A Internacional", canções folclóricas e o hino do México (Diego juntar-se-lhe-ia três anos mais tarde).

A vida de Frida já deu um romance - "Frida Kahlo (Auto-Retrato de uma Mulher)", de Rauda Jamis (Quetzal Editores) - e vários filmes - o mais recente dos quais, "Frida" (2002), de Julie Taymor, foi produzido e interpretado por Salma Hayek. Ela tinha uma visão muito clara da relação entre o que fez e o que viveu: "A minha obra é a biografia mais completa que alguma vez podia ser feita sobre mim."

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