Amélie Poulain, o filme que quer mudar a vida das pessoas

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A longa-metragem de Jeunet é pré-candidata aos Óscares e foi considerada o Melhor Filme Europeu DR

Odiado e criticado por muitos dos intelectuais do cinema francês, provocando artigos e editoriais extremos, tanto no "Libération", por Serge Kaganski, redactor da revista "Inrockuptibles", como nos "Cahiers du Cinéma", "O Fabuloso Destino de Amélie" gerou um sentimento colectivo de adoração pela parte do público, levando 7,7 milhões de espectadores às salas de cinema em França, desde que estreou a 25 de Abril. O filme é pré-candidato aos Óscares e conquistou também os prémios de Melhor Filme Europeu e Melhor Realizador, atribuídos recentemente, em Berlim, pela Academia de Cinema Europeu.A polémica também já estalou em Portugal nas páginas do PÚBLICO, com Eduardo Prado Coelho a considerar o filme uma "abjecção em estado puro, a mais descarada pornografia dos sentimentos, uma história de escuteiros mágicos narrada segundo uma estética de publicidade e preservativos". Na resposta a Prado Coelho, esteve o jornalista e director do PUBLICO.PT José Vítor Malheiros, que escreveu que "criticar Amélie por não ser profundo ou tenebroso" será a mesma coisa que "criticar uma sanduíche por não ser Nouvelle Cuisine ou um batido de banana por não ser um livro".
Os críticos franceses acusam sobretudo o filme de Jeunet de ser uma obra "passadista", retrógrada, fascista, que dá uma imagem de uma França que não existe, ignorando os seus conflitos, as suas tensões e pulsões sociais, culturais e étnicas. Kaganski designa Jeunet de anti-cineasta, afirmando que o realizador é mais um virtuoso do visual do que um cineasta. Pela lógica de ideias, o cinema para estes críticos não deverá ser um meio para recriar um mundo sonhado, mas sim um meio de descobrir o real, de experiência dos tempos que correm - algo semelhante ao que todos os dias é servido aos espectadores nos telejornais e nos documentários.
De facto, Amélie Poulain, interpretada por Audrey Tautou, não encaixa nesse modelo. O filme dá uma visão feliz de Paris, fala dessas coisas simples e inocentes do quotidiano de que é feita a felicidade e deixa-nos com uma sensação de optimismo e encantamento.
Amélie é empregada num café em Montmartre, explorado por uma ex-bailarina equestre, e tem como colegas uma hipocondríaca deprimida e uma rapariga "endireita" com uma vida amorosa torta. Em criança, cresceu sozinha, privada da companhia de outras crianças, encerrada à força no seu mundo por alegadas arritmias cardíacas. Amélie gosta de atirar pedrinhas ao rio, de partir a crosta estaladiça do leite creme, de sonhar e chorar a imaginar grandes feitos.
Mas um dia, um trágico acontecimento muda a vida desta rapariga com uns olhos que parecem querer abraçar o mundo. Aí, Amélie Poulain descobre que a sua verdadeira vocação é tornar melhor a vida dos outros. Usando uma série de estratagemas imaginativos, ela consegue trazer felicidade à porteira, ao empregado da mercearia, à empregada hipocondríaca e ao "homem de vidro", um velho vizinho que passa os dias e os anos a pintar o mesmo quadro de Renoir. Por cobardia Amélie não consegue mudar a sua própria vida e procurar a sua felicidade junto de Nino, um estranho personagem que é empregado em part-time num comboio-fantasma, num "peep-show" e colecciona fotografias de passe que as pessoas deitam para o lixo.
Os críticos afirmam que "Amélie Poulain" não ficará para a história do cinema, com os seus "zooms", os seus traços do imaginário, a sua linguagem que deve tanto à banda desenhada como aos contos infantis, mas o café-tabacaria "2-Moulins" e a mercearia "Collignon" já se tornaram locais de culto. Os turistas deliciam-se a tirar fotografias no café ou perto da mercearia, recriando situações, sonhando que, um dia, um trágico acontecimento também irá mudar as suas vidas, para melhor.
Falta agora o veredicto do público português.

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