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O Último Viking

Enquanto esperamos pela estreia iminente do magnífico "remake" de "The Thomas Crown Affair", numa curiosa recorrência do nome de John McTiernan como realizador, apresenta-se esta semana, entre nós, "O Último Viking", precedido de múltiplas histórias de dissidências entre o cineasta e o romancista, Michael Crichton, bem como do relato de inúmeras tentativas de montagem alternativa para "salvar" o material filmado do descalabro total. A história de sucesso de McTiernan, com "Assalto ao Arranha.Céus" (1988) como título de glória, seguido de "Caça ao Outubro Vermelho" (1990) teve, aliás, recentes oscilações com o êxito mitigado de "Medecine Man" (1992) e com as reservas postas por uma boa parte dos incondicionais de Arnold Schwarzenegger a "O Último Grande Herói" (1993), inteligente veículo para a complexificação da "persona" da estrela, mas, porventura, demasiado sofisticado para corresponder às expectativas dos fãs. Na origem de "O Último Viking", de certo modo um regresso ao imaginário mais cru de um dos primeiros filmes de McTiernan, "Predador" (1987), também com Schwarzenegger, está um "best-seller" de Michael Crichton, "Eaters of the Dead", em que a ideia dominante passa por um choque de culturas: Ibn Fahdlan (papel concebido por medida para Antonio Banderas), um árabe banido pelo seu próprio povo cruza os seus caminhos com um grupo de guerreiros nórdicos empenhados em deslindar o mistério de uma estranha raça que consome todos os seres vivos por onde quer que passe, não só decepando as vítimas, como fazendo desaparecer os seus próprios mortos em combate. Entre o altíssimo grau de civilização do Sul muçulmano e a barbárie germânica traça-se uma linha sobre a qual repousa a essência da aventura: da bruma e dos mistérios do Norte surge o imponderável a exigir, para que se alcance a proeza, um décimo-terceiro guerreiro (o título original é precisamente "The 13th Warrior"), vindo de outras paragens. Com estes materiais se constrói uma narrativa sólida, mas algo desequilibrada pela procura simultânea de realismo nas cenas de acção e de uma representação mítica da Europa lendária dos fins do primeiro milénio. Esta vontade milenarista, algo subterrânea numa visão global do filme, emerge sobretudo na belíssima sequência da visita ao campo do inimigo, com a exploração de grutas e ídolos, totens e crenças de uma primitividade religiosa, que se confronta com o desejo de avançar para mais complexas representações do humano. Por isso, o enterro final abre para o mundo das sagas germânicas da Idade Média dos ideais de cavalaria, com a subida ao Valhalla dos heróis e dos semi-deuses a lembrar a personagem mítica de Siegfried, mas com a memória de um certo cinema de aventuras ainda muito presente: "Os Vikings" (1958), de Richard Fleischer, constituirá, até por razões temáticas, um dos referentes mais óbvios. Dito isto, não pode ocultar-se o falhanço de uma procurada dimensão épica, que sossobra na fragmentação dos episódios, por vezes demasiado anedóticos, ou a pouca credibilidade da personagem de Banderas como "humanista do Sul". No entanto, há na simplificação ficcional um gosto pelo primitivo, que lembra o melhor do universo de Mc Tiernan. Podemos, assim, minimizar o filme por via do seu excessivo esquematismo, por uma certa confusão formal, mesmo na definição do plano, pelo atabalhoado tratamento das grandes cenas de combate; o que não pode é negar-se a "O Último Viking" uma força vital, que resiste às debilidades do argumento ou às atribulações das filmagens: não chegará aos píncaros da aventura épica, que pretendia atingir, mas toca, mesmo que só ao de leve, na matéria do sonho, de que se faz o cinema.

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