Cristina Clara à luz da Lua, sob influência de Cecília Meireles

Cantora e, durante anos, enfermeira, Cristina Clara deu uma volta à profissão e prepara o lançamento de um álbum a solo. Lua, agora revelada, é a canção que o anuncia.

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Cristina Clara DARYAN DORNELLES

O seu nome já começa a ser conhecido nalguns círculos, mas só agora é que Cristina Clara lança oficialmente a sua primeira canção no circuito comercial. Chama-se Lua e é a primeira de um álbum que sairá ainda este ano, intitulado Lua Adversa. Título que é também o de um poema da brasileira Cecília Meireles (1901-1964), que o influenciou.

Nascida no Minho, em Vila Nova de Famalicão, a 19 de Dezembro de 1983, Cristina Clara rumou a Lisboa depois de concluir o curso de Enfermagem no Porto, dividindo os seus dias entre a música e o trabalho de enfermeira no Hospital de Santa Maria. Até que, e essa decisão foi recente, quis dar mais tempo à música. Não deixou a área da saúde, mas trocou de funções e instalou-se no Porto. E é de lá que conta a sua história.

A começar pelo tema que antecipa o disco. “Lua foi o primeiro tema deste trabalho”, diz Cristina ao PÚBLICO. “Encontrei-me realmente com um poema da Cecília Meireles que se chama ‘Lua adversa’, apresentei-o na altura ao Pedro Loch, um compositor brasileiro do Sul do Brasil que vive agora em Portugal, e ele musicou-o. E começámos a tocá-lo nas nossas tertúlias”. Até chegaram a gravá-lo, com intenção de mais tarde o editar. Só que a família da Cecília Meireles não deu autorização para o tema ser editado, e isso levou Cristina a mudar de planos. Mas não de título. “Pensei que podia manter este diálogo, e a inspiração original, daí que o nome do disco tenha ficado Lua Adversa. Mas decidi fazer uma letra minha, própria, dialogando com o poema que nos inspirou inicialmente. E este tema ficou Lua, como homenagem a essa inspiração primeira.”

Lisboa, epicentro de encontros

Cristina Clara participou em duas tertúlias da Rua das Pretas, projecto criado e animado pelo cantor e compositor brasileiro Pierre Aderne, mas não foi isso que a inspirou a fazer este disco de pontes entre culturas, foi aliás o contrário. “Foi precisamente por eu ter esta vivência muito presente que o Pierre me convidou a participar. Quando vim para Lisboa, vim para exercer enfermagem. Entretanto, fiz parte do elenco de uma peça de teatro que era alusiva a uma casa de fados e o fadista Marco Rodrigues convidou-me para cantar no Café Luso. Começou aí a minha incursão pelo universo fadista, fui-me apaixonado pelo fado e, a partir dele, pelas outras canções populares tradicionais. Frequentava muitas tertúlias, nomeadamente o Tejo Bar, em Alfama, onde se encontram músicos de várias origens. Lisboa é, neste momento, um epicentro de encontros de grandes músicos. E acho interessante que este disco, incluindo músicos de Portugal e do Brasil, acabe por, humildemente, fazer um bocadinho parte desse movimento.”

O álbum de estreia de Cristina Clara, Lua Adversa, junta, diz ela, “temas tradicionais da canção popular portuguesa, como da canção popular brasileira, e originais que vieram dessas inspirações, dessas tertúlias, que surgiram nas nossas partilhas”. No single agora publicado (e respectivo videoclipe) participam, além de Cristina Clara (voz), Bernardo Couto, Pedro de Castro, Sandro Costa (guitarra portuguesa), Edu Miranda (bandolim e cavaquinho), Pedro Loch (guitarra clássica), Francisco Gaspar (baixo acústico), Carlos Barretto (contrabaixo), Rafael Calegari (baixo eléctrico), Barbara Piperno (flauta transversal), João Ventura (piano), Quiné Teles e Sami Tarik (percussões).

A fatalidade das (boas) influências

A maior virtualidade destas experiências? Cristina não hesita: “Acho que é impossível viver na Lisboa destes dias e manter-se impermeável a estes encontros. São uma fatalidade, utilizando a linguagem do fado e o aspecto positivo da palavra. É inevitável, para qualquer músico, sentir-se influenciado, deixar-se influenciar e influenciar. Não é nada de exótico, nos tempos que correm. E se formos aprofundar as origens do choro, da canção popular portuguesa, do fado, na morna cabo-verdiana, vamos sempre parar a África. A maior virtude destes encontros é homenagear uma raiz comum.”

Após muitos anos a viver em Lisboa, onde exerceu enfermagem no Hospital de Santa Maria durante 15 anos, resolveu em 2021, “com a perspectiva de lançar o disco”, tomar a decisão de mudar de profissão, sem, contudo, abandonar a área. “É também na área da saúde, mas já não na prestação de cuidados. E isso dá-me maior flexibilidade de horário e tempo para me dedicar a este novo projecto musical como ele merece.”

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