Falhas do Governo dificultam novo acordo para o salário mínimo
Patrões alertam que o acordo assinado no início do ano não está a ser cumprido e que o Orçamento do Estado também não responde às necessidades das empresas. Perante este cenário, o entendimento em torno do aumento do salário mínimo para 580 euros torna-se difícil.
As confederações patronais dão como certo o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) de 557 para 580 euros no próximo ano, a grande questão é saber que contrapartidas o Governo lhes vai apresentar e se são suficientes para colocarem a sua assinatura num novo acordo em torno da subida da remuneração mínima que abrange à volta de 728 mil trabalhadores. O tema vai estar em cima da mesa na reunião da Comissão Permanente de Concertação Social desta sexta-feira, mas as expectativas dos patrões são reduzidas até porque, alertam, o Governo não está a cumprir uma parte significativa do compromisso assinado em Janeiro deste ano.
O alerta começou por ser lançado por João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), que, numa entrevista ao PÚBLICO, garantia que menos de 10% dos contratos entre o Estado e as empresas prestadoras de serviços onde o SMN tem um peso significativo foram revistos. Dias depois, foi a vez de António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), denunciar ao Negócios e à Antena1 que a revisão do Fundo de Compensação do Trabalho, outro ponto do acordo, continua por concretizar. A juntar a estas queixas, os patrões lamentam que o Orçamento do Estado (OE) para 2018 não dê respostas às necessidades das empresas. “O OE está muito centrado na despesa e na reposição de direitos, sem dar à economia capacidade de resposta para suportar estar reposições”, resume Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal.
Perante este cenário, acrescenta o representante das empresas do sector agrícola, “não há, à partida, condições para que a negociação seja positiva”. “Os 580 euros não são para negociar, são para levar para a frente. Para pôr a minha assinatura num acordo preciso de saber que outras compensações poderão surgir”, desafia Eduardo Oliveira e Sousa.
Este é também a questão colocada pela CIP. “O Governo tem um compromisso político-partidário de escalonar o salário mínimo. Um acordo não se esgota no salário mínimo, tem de ter medidas que dêem condições às empresas para melhorarem a sua competitividade. Vamos ver o que o Governo traz”, afirma António Saraiva. Mas avisa: “Vai ser mais difícil este ano”.
Do lado da CCP, Vieira Lopes duvida da credibilidade do Governo para proposta um novo acordo, quando “não está a cumprir o acordo assinado este ano”. O problema da CCP não é apenas esse, mas a ausência de medidas destinadas às empresas que até estavam contempladas no acordo tripartido assinado no início do ano, em particular ao nível fiscal ou da redução dos custos de contexto ou da energia.
Do lado das centrais sindicais as reivindicações são outras. A UGT alerta que é preciso avançar na penalização dos empregadores que optam pelos contratos precários, beneficiando os que optam pela contratação sem termo, um ponto que também constava do acordo para ser discutido em 2017 e que acabou por não avançar. A central aceita os 580 euros do Governo, mas entende que é possível chegar aos 585 euros mensais. Quanto a um possível acordo este ano, dependerá do que for colocado em cima da mesa. A CGTP continua a insistir que o SMN deve subir para os 600 euros em 2018 - valor que tem defendido também para anos anteriores.
O relatório mais recente apresentado pelo Governo aos parceiros sociais revela que no primeiro semestre de 2017 havia 729 mil trabalhadores a receber o SMN, o que corresponde a 22,7% do total. O documento destaca ainda o “impacto positivo” do aumento do SMN na correcção das assimetrias salariais: entre Abril de 2016 e Abril de 2017, o rácio entre os salários dos 10% de trabalhadores com remunerações mais elevadas e os 10% com remuneração mais baixas caiu de 6,32 para 5,96.
Patrões querem redução dos descontos para fundos
A revisão do Fundo de Compensação do Trabalho (FCT) é precisamente um dos pontos do acordo assinado no início de 2017 que não foi ainda cumprido e o Governo colocou-o na agenda da reunião desta sexta-feira.
O mecanismo, juntamente com o Fundo de Garantia de Compensação do Trabalho (FGCT), foi criado na sequência da redução das indemnizações por despedimento e é alimentado pelas empresas, que todos os meses descontam 1% do salário dos trabalhadores admitidos de 1 de Outubro de 2013 em diante. O valor acumulado serve para, um dia, assegurar o pagamento de 50% da compensação dos trabalhadores despedidos.
Os patrões defendem a redução dos descontos, num primeiro momento, e não põem de parte a sua suspensão ou eliminação.
“Estamos no fim de Novembro e não se compreende que a questão do FCT não se tenha ainda discutido”, critica António Saraiva. O presidente da CIP defende que “as empresas têm de ser aliviadas dos sete milhões de euros” que todos os meses descontam para o fundo. “Estamos, felizmente, a empregar. O fundo não precisa de estar tão capitalizado”, diz.
Também o presidente da CAP defende que é preciso negociar a diminuição da contribuição. “Se o desemprego está a diminuir, porquê obrigar as empresas a suportar um encargo desta dimensão”, questiona. Posição semelhante tem o dirigente da CCP João Vieira Lopes que defende uma “racionalização” dos descontos.