A oferta de serviços complementares como incentivo à filiação sindical

No longo prazo a perda de filiados por parte dos sindicatos questionará ainda mais a sua legitimidade e relevância no quadro das relações laborais.

Só recentemente é que foi estabelecido em Portugal um sistema de recolha sistemática sobre filiação sindical e a inscrição das empresas em associações de empregadores. Este sistema tem como base o Relatório Único o qual, desde 2010, permite à Administração do Trabalho ter dados sobre a abrangência dos instrumentos de regulamentação colectiva, nomeadamente quanto ao impacto dos contratos coletivos de trabalho e subsequentes portarias de extensão. Assim, é agora possível medirmos com maior rigor a densidade sindical do mercado de trabalho em Portugal, ou seja, a percentagem de trabalhadores por conta de outrem (TCO), excluindo trabalhadores da Administração Pública, que estão filiados num sindicato. Os dados publicados pelo recente Livro Verde das Relações Laborais indicam que, em 2014, apenas 9,2% dos TCO eram sindicalizados. Outras fontes, como o caso da OCDE, reportam taxas de sindicalização superiores (18,9% em 2012), mas incluem os trabalhadores da administração pública, os quais deverão representar um pouco mais de metade dos trabalhadores sindicalizados em Portugal.

As baixas taxas de sindicalização atual são o resultado de um processo acelerado da sua diminuição observado nas últimas décadas, a qual deveria rondar os 40% aquando da adesão de Portugal à CEE (em 1986), segundo a base de dados disponibilizada pela Universidade de Amsterdão ICTWSS. De acordo com o artigo de Schnabel, publicado em 2013 na revista European Journal of Industrial Relations, Portugal é, a par da Áustria, da França e do Reino Unido, um dos países onde a taxa de sindicalização mais caiu.

Embora não haja dúvidas quanto à perda de representação dos sindicatos no mercado de trabalho, continuam a existir áreas de atividade onde a representação sindical é significativa. Esta tende a ser relevante em grandes empresas e em setores protegidos da concorrência internacional, onde a existência de lucros associados ao poder de mercado que estas empresas possuem incentivam a ação dos sindicatos, como são o caso dos transportes e da energia, ou então de empresas do setor público, bem como do setor financeiro.

Uma outra forma de avaliar a importância dos sindicatos no funcionamento do mercado de trabalho é através da análise do grau de conflitualidade laboral medido, por exemplo, através do número médio de dias de trabalho perdidos por ano em greves ou outro tipo de conflitos laborais, por mil trabalhadores. De 2009 a 2015, o valor observado para Portugal foi de 20 dias, quase metade dos 38 dias observado no mesmo período para um conjunto representativo de países da União Europeia. É de destacar que esta menor conflitualidade laboral se dá num período temporal em que o mercado de trabalho português observou uma forte deterioração dos principais indicadores, com redução acentuada do emprego e dos salários.

A erosão do poder sindical nas empresas tem sido parcialmente compensada através de uma maior pressão junto do poder político para que este tome decisões mais favoráveis aos trabalhadores, em alternativa aos resultados obtidos através da negociação entre empresas e representantes dos trabalhadores. Uma demonstração do peso cada vez maior do decisor político nas relações laborais é o recurso a decisões administrativas, nomeadamente o recurso às portarias de extensão, as quais permitem que cerca de 90% das relações laborais do setor privado sejam negociadas pelos sindicatos, bem como a alteração do salário mínimo nacional, a qual determina o nível salarial de um proporção cada vez maior de trabalhadores.

Se a capacidade de influência do poder político pelos representantes dos sindicatos pode gerar ganhos a curto prazo para os trabalhadores, no longo prazo a perda de filiados por parte dos sindicatos questionará ainda mais a sua legitimidade e relevância no quadro das relações laborais e a sua capacidade na defesa de políticas redistributivas e do emprego. A utilidade dos sindicatos no futuro estará dependente da sua capacidade em aumentar quer a sua representatividade dos diferentes participantes no mercado de trabalho quer as taxas de sindicalização num número significativo de setores. A oferta de serviços complementares, por exemplo no âmbito da proteção na saúde, desemprego ou na velhice, uma maior ligação e coordenação com as comissões de trabalhadores, tal como acontece nos modelos vigentes nos países do norte da Europa, poderá ser uma via para criar novos incentivos à filiação sindical.

 

CIDADANIA SOCIAL - Associação para a Intervenção e Reflexão de Políticas Sociais - www.cidadaniasocial.pt

 

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