South Park faz 20 anos

A irreverente comédia animada sobre quatro miúdos, com muita escatologia à mistura, estreou-se a 13 de Agosto de 1997.

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Há seis anos, a primeira metade da 15.ª temporada de South Park acabou com um episódio chamado You’re Getting Old. A premissa era que Stan, uma das quatro crianças à volta das quais a série animada gira, tinha acabado de fazer dez anos e tinha deixado que o cinismo tomasse conta dele: via e ouvia tudo como se fosse – e não há maneira mais delicada de dizer isto – merda.

Que uma crise existencial pudesse co-existir com escatologia diz muito da série animada que hoje celebra 20 anos. Foi a 13 de Agosto de 1997 que a criação de Matt Stone e Trey Parker, que se tinham conhecido na Universidade do Colorado no final dos anos 1980, foi para o ar pela primeira vez no canal Comedy Central.

Um sucesso retumbante, a série animada que em Portugal passou na SIC Radical já resultou em 20 temporadas, 277 episódios, um filme, vários videojogos e zero sinais de abrandar: a 21.ª época está marcada para daqui a exactamente um mês. Stone e Parker têm contrato para mais duas, com muitas indicações de que quererão continuar depois disso – ao contrário do que You’re Getting Old poderia deixar antever –, sempre a evoluir e a experimentar novos conceitos, sem nunca ficar estanque.

Após terem passado uma temporada inteira a satirizar as eleições dos Estados Unidos, os criadores já prometeram que vão evitar Donald Trump. Isto porque, dizem, a realidade é mais hilariante do que qualquer história que possam inventar. Essa última época foi a terceira seguida a usar serialização, com histórias a alongarem-se ao longo de vários episódios, e também já anunciaram que vão deixar isso para trás.

Actualidade e política

Antes de South Park, reflectir a actualidade não era comum em séries animadas, já que o processo é normalmente moroso. Não aqui: a animação é rudimentar e rápida de se fazer, às vezes com episódios a serem fechados pouco antes de irem para o ar. O que pode trazer problemas. No ano passado estavam convencidíssimos de que Hillary Clinton iria ganhar as eleições. Quando Trump ganhou, os planos para a época saíram furados, o que tornou os episódios que se seguiram bastante diferentes do que fora planeado, com claro prejuízo para a qualidade da temporada.

Não foi, aliás, a primeira vez que se enganaram num presidente: antes de fazerem That’s My Bush, uma sitcom de imagem real no início dos anos 2000 sobre o presidente e a família, tinham passado meses a desenvolver algo sobre Al Gore. Mas o alvo era o mesmo: as próprias sitcoms, mais do que a política.

É que Stone e Parker sempre pareceram mais preocupados em fazer rir do que em se focarem em mensagens políticas concretas. Os dois identificam-se como libertários e dizem odiar conservadores e liberais – estes últimos mais do que os primeiros –, posicionando-se algures ao centro. Ainda assim, quem os ouvir falar em entrevistas recentes percebe que os resultados das eleições não os afectaram só por terem gorado a temporada. E é complicado, por vezes, perceber a verdadeira opinião de ambos, já que a pressa de fazer episódios pode afectar a ponderação com que tratam as questões e deixar ideias a meio. Uma certeza: não gostam de celebridades endinheiradas que usam o seu púlpito para dizer às pessoas normais como devem ou não viver. Team America: Polícia Mundial, o filme que realizaram em 2004, é exactamente sobre isso.

Em Maio deste ano, no jornal Financial Times, o colunista político Janan Ganesh perguntava-se se Stone e Parker, que não são propriamente fãs de Trump, não teriam inventado acidentalmente a alt-right, se o espírito de “ninguém está certo” e “nada é sagrado” não teria contribuído para a filosofia dessa corrente política. Talvez em termos de humor, mas é algo com que os próprios criadores têm andado a tentar lidar. A 19.ª época da série, por exemplo, explorou o politicamente correcto e o velho contra o novo, vendo os dois lados da questão e sem chegarem a uma conclusão concreta. Na mais recente temporada, ponderaram sobre trolls de Internet e o que é que os separava a eles, os autores, desses trolls. A ilação tirada parece ter sido a de que os dois têm realmente piada e há certas coisas com que se conseguem safar.

Em 2011, os dois escreveram um musical de sucesso da Broadway chamado The Book of Mormon, sobre a religião mórmon. Na altura, em entrevista à The Hollywood Reporter, Trey Parker dizia que sempre que um grupo se insurgia contra algo que eles tinham feito, nunca ficava contente, e que provavelmente tal acontecia porque tinha feito algo mal. O objectivo nunca é causar dor, é sempre fazer rir. E isso continuam a fazer, corram como correrem as temporadas.

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