Altice compra TVI debaixo de fogo do Governo
Negócio da Altice com a Prisa é conhecido na semana em que o primeiro-ministro arrasou a Altice no Parlamento e a Anacom está a analisar as falhas na rede durante os incêndios de Pedrógão.
Depois de longos meses de rumores e negociações, a Altice fechou acordo com a espanhola Prisa para a compra da TVI, confirmou o PÚBLICO, após a Bloomberg avançar com a informação. A empresa francesa que há dois anos é dona da Meo vai agora anunciar formalmente o negócio e espera que todo o processo fique encerrado - e concretizado - até ao final do ano.
Seguindo a mesma estratégia que já implementou noutros mercados, o grupo liderado por Patrick Drahi entra finalmente no sector dos media em Portugal. E se a estratégia é a mesma, o remédio a aplicar à Media Capital - e em particular à sua unidade mais rentável, mas também mais dispendiosa, a TVI - em nada irá diferir daquele que é aplicado em todas as empresas que a Altice compra. Entrar, fazer as contas que ainda houver para fazer, e cortar tudo o que for possível para diminuir custos. Foi assim na francesa SFR, está a ser assim na PT (ainda esta semana o presidente da operadora, Paulo Neves, explicou tratar-se de um “processo de agilização” em várias fases) e já tinha sido assim na Oni e na Cabovisão.
Segundo informação recolhida pelo PÚBLICO, o plano da equipa de Drahi para a Media Capital (em cujo conselho de administração se senta o ex-ministro da Economia António Pires de Lima, que os franceses conhecem bem do tempo em que andavam em conversações com a brasileira Oi para comprar a PT) é bastante exigente. Os salários mais altos são aqueles já na mira do grupo e os fornecedores têm razões para estar apreensivos (basta lembrarem-se dos cortes nos valores dos contratos que foram impostos aos fornecedores da PT e que se disse andarem em torno dos 30%).
A operação de concentração terá de ser analisada do ponto de vista concorrencial, sendo que a Altice decidirá se deve notificar o negócio à Comissão Europeia (avaliando se os volumes de negócio têm a chamada dimensão comunitária, como no caso da PT), o que não significa que não possa ser o regulador português a analisar o negócio.
Resta saber também como reagirão a Nos e a Vodafone. O presidente da primeira, Miguel Almeida, tinha afirmado ao Expresso que “se a Altice comprar a TVI e os reguladores não fizerem nada haverá guerra”, mas nunca chegou a explicar o que quis dizer com isso. Já o presidente da Vodafone, Mário Vaz, afirmou ao PÚBLICO que quando do ponto de vista económico a televisão é um negócio difícil, então o objectivo de quem compra “deve ser devidamente investigado e esclarecido” pelos reguladores.
Anacom avalia falhas na rede
O timing não deixa de ser curioso. O negócio é anunciado dois dias depois de o primeiro-ministro António Costa ter arrasado a Altice no Parlamento, dizendo temer pelo “desemembramento” da PT e o futuro dos seus trabalhadores e acusando a empresa (que também é accionista do SIRESP) de ter pior serviço que as rivais Nos e Vodafone.
“Espero que a entidade reguladora olhe com atenção o que aconteceu, só nestes incêndios de Pedrógão Grande, com as diferentes operadoras e para compreender bem como houve algumas que conseguiram manter sempre as comunicações e houve outra que esteve muito tempo sem conseguir manter comunicações nenhumas”, atirou inesperadamente o primeiro-ministro durante o debate do Estado da Nação, quando as dúvidas levantadas pela esquerda se cingiam à situação laboral na PT.
“Isso é muito grave”, disse o primeiro-ministro. E para desfazer quaisquer dúvidas que ainda restassem, concluiu: “Olhe, eu por mim já fiz a minha escolha da companhia que utilizo”.
Questionada pelo PÚBLICO após as declarações de António Costa, a Anacom confirmou que “foram reportadas falhas de rede ao Centro de Reporte de Notificações da Anacom, na sequência dos incêndios ocorridos no passado mês de Junho”.
“No quadro das suas competências, a Anacom está a acompanhar a evolução da situação e já solicitou informação adicional”, revelou a entidade reguladora. Adiantando que não é possível identificar qual ou quais dos operadoradores reportou falhas por trata-se de informação confidencial, a mesma fonte adiantou que “o Governo não pediu qualquer relatório à Anacom” sobre o tema.