Presidente da República quer debate amplo e participado sobre morte assistida

Marcelo Rebelo de Sousa disse que seria “prematuro” mostrar qual a sua posição sobre a eutanásia.

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Rui Gaudencio

Não há como não ler as palavras de Marcelo Rebelo de Sousa a propósito da despenalização da morte assistida sem pensar no sketch dos Gato Fedorento, emitido há uma década, sobre o referendo ao aborto. “O aborto é proibido, mas pode-se fazer. Mas é proibido. Mas pode-se fazer. Só que é proibido. O que é que acontece a quem o faz? Nada. É proibido. Mas pode-se fazer. Só que é proibido.”

Ricardo Araújo Pereira fazia de professor Marcelo, na altura comentador televisivo, e copiava-lhe os gestos e as respostas que, na verdade, não davam resposta nenhuma. Tal como não dava o candidato Marcelo, há pouco mais de um ano, quando questionado sobre a eutanásia. “Eu teria de olhar para a lei e ver se no quadro daquilo que eu entendo que é a conjugação da minha convicção, das minhas convicções, com a avaliação objectiva da realidade que ali me é apresentada se se justificava tomar uma posição positiva ou negativa”, dizia em entrevista à Rádio Renascença.

Hoje, porém, o Chefe de Estado foi um pouco mais claro, não na sua posição sobre a despenalização da morte assistida, mas em relação ao debate que a sociedade tem de fazer para lá chegar. "O Presidente da República quer é que haja um debate amplo, o mais participado possível, com iniciativas populares, como petições, com a iniciativa de partidos e de cidadãos e de grupos de cidadãos, portanto isto significa que não irá intervir tão depressa sobre esta matéria", disse Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas, no Palácio de Belém.

O Presidente, cuja família política de origem é a facção humanista e cristã do PSD, considerou "prematuro" assumir uma posição sobre o tema neste momento, frisando que vai ser discutida uma petição, esta quarta-feira, e que "se fala de vários projectos de lei, de várias origens". "Será um processo necessariamente longo com um debate profundo, não faz sentido que o Presidente da República se apresse a intervir sobre a matéria, dando a sensação de que quer condicionar o debate", defendeu.

Interrogado sobre a sugestão do novo bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, para que seja convocado um referendo sobre o assunto, Marcelo Rebelo de Sousa também não quis pronunciar-se, alegando que "neste momento não faz sentido o Presidente da República avançar nada sobre matéria nem sobre o conteúdo nem sobre a forma". "Debater se há referendo ou não é debater a forma de auscultação da vontade dos portugueses e por outro lado de decisão política. Eu não irei intervir nesta fase do processo nem sobre o conteúdo", afirmou.

Sem esconder o desconforto com questões fracturantes, como esta, Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou que "está adquirida na sociedade portuguesa" a necessidade de um debate sobre o tema: "Houve um debate numa estação pública de televisão. Há de haver na televisão, na rádio, certamente serão ouvidos os órgãos competentes como é o caso do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, as ordens".

 

O Parlamento debate na quarta-feira uma petição a favor da despenalização da morte assistida, enquanto se aguarda o agendamento de dois projectos de lei sobre a matéria, do Bloco de Esquerda (BE) e do PAN (Pessoas-Animais Natureza).