A Clintonlândia foi da animação à depressão em apenas uma hora
Donald Trump, o magnata e estrela da televisão que era visto como uma piada, vai mesmo ser o próximo Presidente dos EUA.
A noite começou animada para os apoiantes de Hillary Clinton no bar Clydes, perto do centro de convenções em Manhattan onde Hillary Clinton aguardava o momento de se tornar na primeira mulher Presidente dos Estados Unidos da América. Mas quando a fila interminável de ecrãs, todos sintonizados na CNN, começou a cuspir os primeiros resultados, a animação deu lugar à apreensão, que depois trouxe com ela a incredulidade, passou pelo estado de negação e terminou em desespero. Donald Trump, o magnata do imobiliário e estrela da televisão que não ia passar de uma piada quando anunciou a candidatura à nomeação pelo Partido Republicano, o nomeado que ia perder quase de certeza nas eleições gerais, vai mesmo ser o próximo Presidente dos Estados Unidos da América.
Perder a Florida já era um aviso, mas depois vieram atrás o Ohio, a Pensilvânia, o Wisconsin, o Iowa, a Carolina do Norte, e as mãos na boca de espanto.
Cá fora, no passeio, vários apoiantes de Hillary Clinton espreitavam através dos vidros, em direcção aos ecrãs, e as expressões imitavam as que se viam lá dentro: a cada estado que caía para Donald Trump, alguém gritava sozinho um grito colectivo: “Oh, no!”
Jeff Williams era um dos que estavam cá fora, no passeio, todo ele em estado de negação. “Ouve, isto não quer dizer nada, é sempre assim. Primeiro contam os estados mais pequenos, onde os republicanos ganham sempre, mas depois no final da noite chegam os estados maiores e ela vai ganhar.”
Pegamos no telemóvel e mostramos ao Jeff que o site do New York Times dava agora 78% de probabilidades de vitória a Donald Trump, quando uma hora antes se lia 81% de probabilidades de vitória para Hillary Clinton. A resposta chega na forma de duas perguntas: “Tu és mesmo jornalista? Queres que o Trump ganhe, é?”
Pouco depois, Jeff vê-se metido numa discussão com um apoiante de Donald Trump que passava no meio da multidão de democratas. “Ele é louco! Na semana passada tiveram de lhe tirar a conta do Twitter!” E a discussão seguiu por alguns minutos, sempre no mesmo registo, com variações das mesmas ideias: “Ele até pode ser louco, mas ela é corrupta, e eu prefiro um louco a uma corrupta!”
Mais e mais pessoas regressavam a pé da zona do centro de convenções onde Clinton esperava fazer a festa, e bastava olhar para as expressões delas para perceber que a festa já tinha sido cancelada muito antes de ter sido anunciado o resultado final.
As longas ruas de Manhattan iam agora todas desaguar na Avenida das Américas, em frente ao hotel da cadeia Hilton onde Donald Trump acompanhava a contagem dos votos rodeado pela família e por outros conselheiros de campanha. Era impossível perceber se lá dentro o ambiente era de festa, mas cá fora já soavam buzinas nas ruas, sempre recebidas com muitos "Fuck Yeah!", "God bless America" e "Trump! Trump! Trump!”
John e Susan Fox vieram de Indianapolis, no estado do Indiana, com a esperança de assistirem de perto a uma vitória de Donald Trump. John diz que é fã de Donald Trump há 30 anos e viajou mais de mil quilómetros só para ver "um sonho tornado realidade". O quarto para este dia foi reservado há quatro meses.
"Li todos os livros dele, reservámos um quarto no Trump International Hotel há quatro meses. Ele vai ser um óptimo Presidente", diz John, já convencido da vitória. "As pessoas querem menos políticos e mais empresários a governar este país.” Susan prefere não falar do muro que Trump prometeu: "Eu só quero que ele crie mais postos de trabalho e que controle o défice.”
Alguns apoiantes de Trump já festejavam como se o seu clube de qualquer coisa tivesse ganho qualquer coisa pela primeira vez na vida, mas outros estavam tão incrédulos e surpreendidos como os eleitores de Hillary Clinton que tinham ficado lá para trás.
“Não estava à espera disto”, diz William. “Parece que a minoria silenciosa já não é assim tão silenciosa. Estou muito orgulhoso. Disso e da América. O Bernie Sanders e a Hillary Clinton são comunistas. Eu só quero ter mais dinheiro no meu bolso.”
Jennie é mais uma das vozes que gritam e não cabem em si de contentes, todas espremidas num passeio que era bem maior há poucas horas. Entre elas e o seu herói, lá dentro no hotel Hilton, estava uma outra multidão, esta de jornalistas e polícias. “Esperava que ele tivesse bons resultados na votação popular, mas estava preocupada com os votos para o Colégio Eleitoral, não acreditava que ele pudesse ganhar”, diz Jennie, que não pára de abanar a cabeça e, com ela, o seu chapéu prateado com letras a vermelho: “Make America Great Again.”
O diagnóstico já tinha sido feito por Donald Trump, e Jennie recita-o facilmente: “Precisamos de uma mudança. Tivemos oito anos de Obama, o défice está fora de controlo, a imigração está uma desgraça. Há cada vez mais pessoas a entrar no país e a causar problemas.”
Eram duas da manhã em Nova Iorque e ainda ninguém conseguia acreditar no que estava a acontecer – nem os apoiantes de Hillary Clinton, cabisbaixos, indignados e envergonhados, nem os apoiantes de Donald Trump, orgulhosos, desafiantes até na forma como andam pelas ruas, e de peito cheio com a avalancha de sondagens que saíram furadas.