Human Rights Watch acusa polícia turca de tortura

Governo suspendeu garantias contra a possibilidade de polícias torturarem na sequência do golpe falhado, diz a organização de defesa dos direitos humanos. E os casos de tortura repetem-se.

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A Human Rights Watch pede ao Governo de Erdogan que volte a ter garantias contra a tortura Reuters

Na sequência do golpe falhado de Julho, depois de entrarem em vigor leis de emergência que retiraram aos detidos garantias de protecção, a política turca torturou pessoas à sua guarda, diz a organização de defesa de direitos humanos Human Rights Watch.

A organização dá detalhes sobre 13 casos de alegados abusos, incluindo manter os detidos em posições de stress, privação do sono, agressões extremas e abusos sexuais num relatório de 43 páginas intitulado A Blank Check: Turkey’s Post-Coup Suspension of Safeguards against Torture (“Um cheque em branco: a suspensão de garantias contra a tortura na Turquia pós-golpe”, tradução livre).

“O chefe de polícia que me deteve começou por me agredir, batendo-me na cara e nos olhos”, disse um detido numa declaração a um procurador. “Atingiram-me nas solas dos pés, no estômago, depois apertaram-me os testículos, dizendo-me que me iriam castrar”, continuou. Os relatórios médicos, que poderiam ajudar as vítimas, não chegam a ser entregues nem às vítimas nem aos seus advogados. As autoridades alegam segredo de investigação.

A organização pede ao Governo turco que volte a adoptar as garantias contra a tortura, já que, ao suspendê-las, “o Governo passou efectivamente um cheque em branco às autoridades para torturarem e tratarem indevidamente os detidos, do modo que quiserem”, disse o director da organização para a Europa e Ásia Central Hugh Williamson. “Os casos que documentámos parecem indicar que fizeram justamente isso.”

O estado de emergência decretado na sequência do golpe falhado em que morreram mais de 240 pessoas, entre as que o promoveram e as que se opuseram, deve ser investigado e os culpados punidos – mas não deve dar ao Governo carta branca para suspender direitos, sublinha a HRW, relembrando que a proibição de tortura é absoluta: não deve haver excepções nem em tempo de guerra. A decisão da Turquia de adiar uma visita do responsável pela tortura da ONU faz temer que Ancara não queira prevenir a prática da tortura.

A lei aumentou o prazo de detenção policial sem informação judicial de quatro para 30 dias, impediu acesso dos detidos a advogados até cinco dias, restringiu a escolha de advogados e negou o direito a conversas confidenciais entre advogado e detido. Mesmo assim, a Human Rights Watch encontrou casos em que até estes prazos foram violados. Isto tanto em pessoas objecto de inquérito por ligação com o golpe como por questões não relacionadas com ele: activistas curdos e de esquerda foram também sujeitos a estas medidas.

“A tortura é como uma doença contagiosa – quando começar, vai espalhar-se", disse um advogado detido na sequência do golpe juntamente com pessoas que ele pensa terem sido torturadas. Depois de ter havido uma diminuição nos casos de tortura nos últimos anos, volta a assistir-se a um aumento.

Tudo isto num clima de medo, em que advogados, detidos, activistas de direitos humanos, médicos e especialistas forenses admitiram à HRW que temem ser os próximos na purga levada a cabo pelo Governo. 

Temendo as purgas, muitos turcos pediram asilo a outros países. Alguns militares, suspeitos por Ancara de terem estado envolvidos no golpe, fizeram-no até de modo dramático, chegando às ilhas gregas entre refugiados em barcos ou de mota de água. Também à Alemanha chegaram cerca de 35 pedidos de asilo político de diplomatas turcos e famílias, segundo o diário norte-americano New York Times.   

Em Agosto, o diário de Nova Iorque fazia o balanço da purga: “Raras vezes na História moderna um líder deteve e despediu tantos potenciais adversários como Erdogan depois do golpe falhado.” Passado um mês, tinham sido despedidos 9000 polícias, 21 mil professores de escolas privadas, 21.700 funcionários do Ministério da Educação (a educação foi particularmente atingida pelas ligações às escolas de Fetullah Güllen, o líder religioso que vive nos EUA e que Ancara acusa de estar por trás do golpe). Houve ainda mais de 10 mil soldados detidos, 2745 juízes e outros funcionários judiciais suspensos, mais de cem jornais ou outros media foram encerrados. Também responsáveis de grandes grupos económicos foram visados: 187 foram detidos.

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