À procura de rumo
O Governo não diz que a sua política é melhor para o país, mas apenas que respeita os acordos políticos e a sua interpretação da lei.
Há um ano tínhamos saído de eleições legislativas e a configuração do Governo era motivo de grande especulação. Havia três soluções genéricas: a continuidade do Governo de coligação PSD/CDS-PP viabilizado por uma abstenção do PS, um Governo de bloco central (PSD, PS e CDS-PP) ou um Governo do PS com apoio do BE e do PCP. Foi esta solução que vingou no Parlamento.
A reorientação da política orçamental foi significativa, e o Governo cunhou a nova política com a expressão “reposição de rendimentos” pretendendo dar prioridade à conformidade da política com a interpretação maioritária da Constituição em detrimento da sua conformidade com as restrições financeiras do estado. A política orçamental acabou por ser um pouco mais mitigada do que a negociada politicamente devido ao diálogo que houve com Bruxelas sobre o Orçamento do Estado para 2016.
Duas coisas parecem ter ficado relativamente claras. Por um lado, que o Governo irá tentar cumprir, nos seus próprios termos, o Tratado Orçamental e o Pacto de Estabilidade e Crescimento. E em segundo lugar que os critérios políticos dominam os económicos na definição da política orçamental. O Governo não diz que a sua política é melhor para o país, mas apenas que respeita os acordos políticos e a sua interpretação da lei. Há assim uma contradição insanável entre a visão político-jurídica da política económica e a perspectiva económico-financeira sobre a mesma.
O país espera pela resolução dessa contradição. A minha solução preferida seria que o Governo repensasse, livre dos seus compromissos políticos, a melhor forma de conseguir equilibrar as contas públicas. A política de reposição de rendimentos combinada com um certo respeito pelos critérios orçamentais traduz-se, na prática, numa transferência de recursos do investimento para consumo, o que agrava o já muito baixo potencial de crescimento da economia portuguesa.
Acresce que no último ano se adicionarem pressões significativas sobre o sistema financeiro português. Em particular os custos da crise do BES continuam a acumular-se e as necessidades de capital da Caixa Geral de Depósitos são também significativas. E as necessidades de capital do sistema financeiro português são ainda volumosas, o que pressiona a dívida pública portuguesa.
A evolução dos indicadores económicos mostra um ligeiro retrocesso nas expectativas de recuperação nos últimos 12 meses. Três indicadores merecem destaque. Em primeiro lugar o aumento da taxa de juro implícita das OTs a 10 anos, e também do seu spread face às obrigações alemãs e espanholas, é muito significativo estando agora em valores superiores ao inicio de 2014. Estamos muito melhor do que em 2011, mas já não se pode dizer que estejamos melhor que em 2014 e muito menos em Outubro de 2015.
Em segundo lugar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Tudo indica que 2016 terá um crescimento inferior aos 1,6% de 2015. Estes dados são mais consistentes com uma quase estagnação do que com a continuação da recuperação e aceleração da economia. E a orientação e incerteza sobre a política económica em 2017 dificilmente trará a desejada recuperação.
Em terceiro lugar o investimento, que tinha ensaiado uma ténue recuperarão em 2015, de uma queda brutal acumulada superior a 30% desde 2010, parece que terá tornado a recuar em 2016. Na minha opinião em parte devido à prioridade política dada ao consumo em detrimento do investimento. E ao acréscimo da percepção de risco da nossa economia.
A minha expectativa face a 2017 é grande. E penso que há ainda espaço para reorientar a economia portuguesa no médio-prazo. O compasso de espera de 2016 não precisa de se manter durante quatro anos. É, porém, responsabilidade do Governo desenhar uma estratégia económica que se baseie nos dados e na evidência, e não apenas nas preferências expressas nos documentos políticos que assinou no passado.
Professor da Universidade Católica Portuguesa