Sanders oferece as duas mãos a Clinton para serem usadas contra Donald Trump

Candidato considera que muitas das suas exigências foram aceites pelo Partido Democrata e quis "deixar o mais claro possível" que Hillary "deve ser a próxima Presidente" dos Estados Unidos.

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Hillary Clinton e Bernie Sanders falaram juntos no estado do New Hampshire Justin SAGLIO/AFP

A aproximação nos discursos era cada vez mais evidente, mas foi preciso um palco decorado com as palavras "Juntos somos mais fortes" para convencer os mais cépticos: Bernie Sanders, o candidato do Partido Democrata que ganhou milhões de votos com a promessa de uma revolução no sistema político norte-americano e um combate sem tréguas a Wall Street, declarou esta terça-feira o apoio oficial a Hillary Clinton.

Perante uma sala cheia, na escola secundária da pequena cidade de Portsmouth, no estado do New Hampshire, Bernie Sanders subiu ao palco com Hillary Clinton minutos depois de a multidão ter gritado várias vezes a palavra "União".

Este cenário de unidade fez todo o sentido agora, a apenas duas semanas da convenção do Partido Democrata (de 25 a 28 de Julho, em Filadélfia), que vai carimbar a nomeação de Clinton e permitir que todas as baterias fiquem apontadas ao representante do Partido Republicano, Donald Trump.

Mas se Clinton pudesse entrar no DeLorean transformado em máquina do tempo pelo cientista Emmet Brown e conduzido por Marty McFly na saga Regresso ao Futuro, e se marcasse a data 30 de Abril de 2015 no mostrador, seria confrontada com um cenário muito, muito diferente – com estradas, é certo, mas também com um relvado à frente do edifício do Capitólio, onde Bernie Sanders anunciava a sua candidatura à nomeação pelo Partido Democrata perante um punhado de jornalistas, sem provocar especial excitação nos media e no eleitorado.

Nos 14 meses seguintes, Sanders não só conseguiu sair do relativo anonimato do seu lugar no Senado norte-americano, eleito pelo estado do Vermont, como se transformou numa das mais importantes figuras das eleições primárias e obrigou Clinton a ter mais trabalho do que quase todos os analistas e até a maioria dos eleitores pensavam no início.

Ao contrário do que tem sido habitual nas últimas décadas, o candidato que ficou atrás nas eleições primárias, neste caso Bernie Sanders, resistiu quase até ao último momento para baixar os braços e declarar o seu apoio incondicional à candidata mais votada, neste caso Hillary Clinton – ao longo das primárias, Clinton conquistou 2220 delegados que têm de votar nela na convenção e recebeu a promessa de apoio de 591 "superdelegados" (congressistas, governadores, o próprio Presidente dos EUA, Barack Obama, e outras grandes figuras do Partido Democrata, que têm liberdade de voto), contra os 1831 delegados de Bernie Sanders e o apoio de apenas 48 "superdelegados".

Há quem veja no apoio de Sanders a Clinton uma declaração de derrota, já que o candidato deu muitas esperanças a um exército de fervorosos apoiantes, muitos deles jovens, sem os mesmos complexos em relação à palavra "socialismo" que os seus pais e avós ainda têm, e que desejam mais do que pequenos avanços – querem a revolução que Sanders lhes prometeu, e muitos deles olham para Hillary Clinton como uma das caras do sistema que querem ver em ruínas.

Mas se o ponto de partida for aquela apresentação ao eleitorado norte-americano no relvado em frente ao Capitólio, no dia 30 de Abril de 2015, então é impossível não olhar para o caminho feito por Bernie Sanders como uma batalha épica, recheada de conquistas – no fim-de-semana passado, o órgão que define a plataforma com que o Partido Democrata se vai apresentar ao eleitorado em Novembro adoptou algumas das suas mais importantes reivindicações, como a defesa do aumento do salário mínimo federal para 15 dólares por hora e a entrada dos cidadãos norte-americanos no sistema de saúde público conhecido como Medicare aos 55 anos, quando actualmente só podem beneficiar dele a partir dos 65 anos.

E foi porque o Partido Democrata acabou por abraçar algumas das propostas mais à esquerda defendidas por Sanders que o candidato decidiu finalmente dizer aquilo que era evidente para quem – como ele próprio já reconhecera – sabe fazer contas: a maioria dos eleitores escolheu Hillary Clinton para fazer frente a Donald Trump.

"Tenho orgulho na campanha que fizemos aqui no New Hamphire e em todo o país", começou por dizer Bernie Sanders no regresso ao estado que lhe deu a primeira vitória nas primárias, no dia 9 de Fevereiro, com uma vantagem de 22 pontos percentuais sobre Clinton.

"Mas não foi suficiente para ganhar a nomeação. A secretária [de Estado] chega à convenção com mais delegados do que nós e com muitos mais 'superdelegados'", reconheceu Sanders, dando mais uma bicada ao sistema de nomeação do Partido Democrata – ouviram-se vaias na sala quando a palavra "superdelegados" foi proferida.

Apesar de nunca ter dito que abandona a sua candidatura (algo que costuma acontecer quando um candidato declara o seu apoio oficial a outro), Sanders pôs um sorriso do tamanho do mundo na cara de Cliton quando desfez quaisquer dúvidas que ainda pudessem existir: "A secretária [de Estado] Clinton ganhou o processo de nomeação do Partido Democrata. Dei-lhe os parabéns por isso. Vai ser a nomeada do Partido Democrata para candidata a Presidente e eu tenciono fazer tudo o que puder para garantir que ela será mesmo a próxima Presidente dos Estados Unidos."

Clinton escapa aos tribunais mas não se livra do rótulo de desonesta

Enquanto Bernie Sanders falava em Portsmouth, o magnata Donald Trump estava no Twitter a cortejar quem se sentiu traído com o apoio do candidato a Hillary Clinton: "A todos os eleitores do Bernie que querem travar os maus negócios e os interesses globais, recebemo-vos de braços abertos. As pessoas em primeiro lugar" e "O Bernie Sanders abandonou os seus apoiantes ao apoiar a pró-guerra, pró-TPP, pró-Wall Street Hillary Desonesta" foram duas das mensagens.

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