Portugueses arriscam subida da factura da luz em 2017

Nem Passos, nem Costa transferiram dinheiro para o fundo do sistema eléctrico e o Estado já deve 50 milhões de euros à REN.

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Sistema eléctrico ficou sem transferência de 50 milhões em 2015 Rita Franca

Há 50 milhões de euros da taxa extraordinária sobre as empresas de energia que ainda não foram transferidos para o sistema eléctrico, revelou nesta terça-feira o presidente da ERSE, Vítor Santos, alertando para a possibilidade de um agravamento da factura da luz em 2017. Trata-se de um valor que deveria ter sido transferido, até 31 de Dezembro de 2015, para um fundo gerido pelas Finanças com o objectivo de reduzir a dívida tarifária da electricidade, mas cujo depósito ainda não ocorreu, “até à data de hoje”, como adiantou o mesmo responsável. Por isso, o presidente da ERSE reconhece que “há um desvio que pode ter impactos tarifários”.

Segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, na prática, esse valor já foi utilizado pelo regulador dos serviços energéticos para diminuir os encargos dos consumidores com os custos políticos do sistema, anulando pagamentos que deveriam ter sido feitos à REN, a empresa gestora da rede eléctrica nacional, por via das tarifas da luz. A expectativa era a de que o dinheiro que entrasse para o Fundo de Sustentabilidade Sistémica do Sector Energético (FSSSE) por via da Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético (CESE) seria utilizado para ressarcir a REN, mas o problema é que a conta está a zero.

Assim, o que acontece é que neste momento o Estado não só incumpriu o prazo de transferência do produto da CESE para o FSSSE, como está devedor ao sistema que, por sua vez, já deve à REN 50 milhões de euros. Isso mesmo reconhece a empresa liderada por Rodrigo Costa no relatório e contas de 2015, onde refere ter um “montante a receber de 50 milhões de euros, tal como definido pelo regulador ERSE, no quadro das medidas de sustentabilidade do Sistema Eléctrico Nacional”.

“Se o dinheiro não chegar”, a ERSE admite que poderá ser forçada a fazer um ajustamento na proposta tarifária para 2017 (em Outubro), o que se traduzirá num agravamento das facturas da luz, como explicou Vítor Santos à margem da audição parlamentar. E o mesmo poderá voltar a acontecer no ano seguinte, já que do montante da CESE relativo a 2015 (e que deverá ser transferido para as tarifas até ao final deste ano) também não há notícias, apesar de não se poder falar em incumprimento.

De quem é a responsabilidade? O prazo para transferir este montante para o sistema eléctrico terminava a 31 de Dezembro do ano passado e a transição de executivos deu-se em Novembro. As Finanças do Governo PSD/CDS, tuteladas por Maria Luís Albuquerque, não fizeram o depósito. E o actual executivo, que tem como ministro das Finanças Mário Centeno, também não resolveu o problema.

E não está claro que o faça, pelo menos a tempo de impedir que as facturas da electricidade se agravem no próximo ano. "O Governo está a trabalhar para que neste ano, do exercício de 2016 [o primeiro deste Governo] esta situação seja regularizada, sendo que os anos de 2014 e 2015 são da responsabilidade do anterior Governo", disse fonte oficial da secretaria de Estado da Energia.

A mesma fonte frisou que o valor das tarifas nos dois últimos anos "foi construído no pressuposto de que esta verba seria arrecada pelo sistema eléctrico nacional" e que "esse era o compromisso do Governo anterior".

O PÚBLICO tentou contactar a anterior ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, bem como o anterior ministro da Energia, Jorge Moreira da Silva, mas sem sucesso. Em declarações à Lusa, Moreira da Silva responsabilizou o actual ministro das Finanças pela situação.

"Pelos vistos, a transferência dos serviços do Ministério das Finanças para o Fundo, que deveria ter ocorrido no final do ano, não teve lugar, como não teve nestes primeiros sete meses do ano pelo que qualquer esclarecimento deve ser dado pelo actual ministro dos Finanças", disse o ex-governante.

Responsabilidades à parte, apesar das incógnitas sobre o que poderá acontecer às tarifas da luz em 2017, certo é que, apesar de estar prevista uma receita de 150 milhões de euros por ano com a CESE, não tem sido esse o valor a chegar aos cofres do Estado. A EDP, com uma taxa de 60 milhões, é quem tem pago a conta mais pesada, e a REN pagou outros 25 milhões (embora tenha contestado a taxa judicialmente); já a Galp, que deveria ter pago perto de 30 milhões optou por apresentar uma garantia bancária e foi para tribunal.

O PÚBLICO tentou precisar junto do Ministério da Economia (que tem a tutela da Energia) e do Ministério das Finanças o montante total já arrecadado com a CESE, mas não obteve essa informação.

Seja qual for o montante entregue pelas empresas, o que a lei diz é que um terço desse valor teria forçosamente que ter sido encaminhado para o FSSSE para redução da dívida tarifária. Os outros dois terços deveriam ter sido igualmente canalizados para este fundo para “financiamento de políticas do sector energético de cariz social e ambiental, relacionadas com medidas de eficiência energética”. O PÚBLICO também não conseguiu confirmar se o produto da CESE chegou a ser entregue ao FSSSE.

 

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