Algumas matérias e propostas em discussão
O plano de trabalhos da comissão da transparência é alargado e as propostas de alteração dos vários partidos mexem com legislação diversa.
Das propostas em causa resultam alterações no regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, no estatuto dos deputados, na lei de controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos, na lei geral tributária, no regime geral das infracções tributárias e no código do IRS. Aqui está uma selecção de propostas.
Enriquecimento injustificado
PCP e Bloco apresentam propostas para criminalizar o enriquecimento injustificado que abrangem todos os cidadãos, mas PSD e PS limitam-se a reforçar os mecanismos de controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos. Os partidos terão que se esforçar para contornar as dificuldades dos chumbos do Tribunal Constitucional a diplomas anteriores, por colocarem em causa o princípio da presunção de inocência constitucionalmente consagrado.
O PCP propõe que se criminalize a não declaração dos acréscimos patrimoniais anuais superiores a 100 salários mínimos (53 mil euros), depois de o contribuinte ser obrigado a entregar uma comunicação inicial do património superior a 212 mil euros. A punição pode ser uma pena de prisão de um a cinco anos ou até oito anos, caso se trate de funcionários e titulares de cargos políticos ou públicos e a perda do património.
O BE quer vigilância apertada da Autoridade Tributária sobre quem declara rendimentos anuais acima de 25 mil euros e o seu património anual aumentar mais 20% do que isso. Se não o conseguir justificar, esse património reverterá para o Estado.
O PS propõe que passem a entregar declaração de rendimentos e património todos os altos dirigentes da administração directa e indirecta do Estado bem como da administração local e regiões autónomas – no início, durante, no final e três anos depois de terminadas as funções. PS e PSD propõem que, se o TC entender que o património declarado aumentou mais do que os rendimentos fazem supor e se provar que o titular escondeu esse património intencionalmente, este pode ser punido com prisão até três anos. Os socialistas querem que os bens não justificados de valor superior a 100 mil euros sejam taxados a 80% (agora é 60%).
Registo de interesses
O Bloco e o PSD querem ir mais longe na informação sobre interesses, rendimentos e património dos titulares dos cargos políticos e públicos. O BE, por exemplo, quer estendê-los às juntas de freguesia, comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas (como o PS), mas também aos membros dos gabinetes dos ministros e secretários de Estado e a quem intervenha como consultor, representante ou perito em processos de venda ou concessão. E que o façam até seis anos depois de saírem do cargo. E ainda que a declaração passe a incluir, além dos bens de que a pessoa é proprietária, também aqueles de que seja “possuidor ou detentor” – que use por empréstimo de amigos, por exemplo –, justificando a situação.
Já o PSD quer que as ofertas recebidas pelos políticos e titulares de altos cargos em virtude das funções desempenhadas sejam registadas pela entidade a que pertencem – Parlamento ou Governo, por exemplo – e publicitadas na Internet.
Lobbying
Neste pacote da transparência, o CDS quer regulamentar o lobbying. Para já – e à semelhança do que já existe no Parlamento Europeu – é proposta a criação de um registo público e obrigatório para os “representantes de interesses legítimos”, ou seja, os lobistas. Estão abrangidos pelos projectos de lei todas as entidades públicas, entre as quais a Assembleia da República, os membros do Governo, órgãos e serviços da administração directa e indirecta do Estado, bem como a administração das Regiões Autónomas e autárquica. O registo é acompanhado por um código de conduta que exorta os lobistas a inscreverem-se no registo e a declarar os clientes que representam. Embora não haja qualquer sanção em caso de incumprimento, só poderá fazer lobby quem estiver registado, sob pena de a actividade ser ilícita. De fora deste regime ficam a actividade dos advogados, dos parceiros sociais e as actividades em respostas a pedidos directos e individualizados das entidades públicas.
Exclusividade
É uma antiga batalha do BE e que nunca conseguiu vingar: a exclusividade dos deputados. A bancada bloquista volta a propor que os deputados exerçam o mandato em regime de exclusividade, em nome de uma maior transparência do sistema político e de uma “requalificação da democracia”. O BE considera que a actual lei de incompatibilidades e impedimentos é insuficiente e, por isso, quer impedir que os deputados acumulem o mandato com outras actividades profissionais no sector privado. A proposta não tem o apoio das outras bancadas.
Substituição temporária
O BE propõe que voltem a ser permitidas as suspensões temporárias de deputados – para além das motivadas por questões de saúde, por exemplo - e a substituição destes, desde que por razões de “actividade profissional inadiável”, exercício de funções específicas no partido e “razões importantes relacionadas com a vida e interesses do deputado”.
O CDS também propõe que se possa pedir a substituição por “motivo importante, relacionado com a vida ou interesses do deputado, designadamente, de natureza pessoal, profissional ou académica” – mas impõe como limites que seja feito duas vezes por mandato e apenas por 45 dias.
Entidade da transparência
Para evitar a dispersão das declarações e a multiplicação de entidades de fiscalização do controlo público do património, o Bloco propõe a criação da Entidade de Transparência dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos que tomaria a seu cargo algumas funções actuais do TC, de coligir a informação sobre o património e rendimentos dos altos responsáveis do Estado. Além do controlo da riqueza, teria também a seu cargo o regime de incompatibilidades. É uma proposta que não deverá ter aceitação.