Depois do Estado Islâmico, Al-Qaeda reivindica morte de activistas no Bangladesh

Terceiro ataque num mês contra autores seculares acabou no linchamento do editor de uma revista para a comunidade LGBT e um amigo. Grupos jihadistas podem estar a aproveitar-se da onda de intolerância no país.

Foto
Os corpos mutilados de Xulhaz Manna e Mahbub Tonoy, retirados do apartamento. Rehman Asad/AFP

A morte por linchamento de dois activistas dos direitos da comunidade homossexual e transgénero no Bangladesh foi reivindicada esta terça-feira por um grupo filiado da Al-Qaeda, o Al-Islam, que publicou um comunicado nas redes sociais acusando os dois homens de serem “pioneiros na prática e promoção da homossexualidade”. Xulhaz Manna e Mahbub Tonoy, 35 e 25 anos, foram assassinados na segunda-feira por um grupo de homens armados com catanas, no mais recente acto de violência contra activistas e intelectuais anti-islamistas no Bangladesh.

Os homicídios ocorreram no apartamento de Manna, fundador da primeira e única revista para a comunidade LGBT no Bangladesh e colaborador na agência humanitária norte-americana USAID. O grupo de atacantes feriu também com gravidade um guarda do edifício. Este é o terceiro ataque executado por fundamentalistas islâmicos só em Abril contra intelectuais e activistas seculares. Foram todos assassinados com catanas: o primeiro foi um estudante universitário crítico do islão, o segundo um poeta e professor universitário laico.

O homicídio do professor universitário foi reivindicado pelo grupo Estado Islâmico, mas autoridades e Governo do Bangladesh duvidam que estes ataques sejam verdadeiramente autoria de grandes grupos jihadistas. Nesta terça-feira, o porta-voz da polícia de Daca, a capital, descredibilizou estas reivindicações, tratando-as como actos de propaganda. Os atacantes, dizem vários observadores, são mobilizados pelos pequenos grupos radicais islâmicos que germinaram ao longo dos últimos anos de instabilidade política.

“Há um estado de choque absoluto”, disse um amigo de Xulhaz Manna à Reuters, que pediu para não ser identificado por receio de represálias. Só desde o último ano morreram pelo menos 17 activistas, intelectuais ou funcionários de assistência humanitária no Bangladesh, vítimas de ataques de fundamentalistas islâmicos. A comunidade LGBT é uma das mais vulneráveis: a homossexualidade é ilegal e a revista publicada por Manna estava proibida — o mesmo acontece a publicações que de alguma maneira questionem, critiquem ou se desviem do islão.

Como em ataques passados, esta semana o Governo acusou a oposição de se aliar a grupos armados islamistas para desestabilizar o país — as eleições de 2014 provocaram meses de violência em que uma cerca de uma centena de pessoas morreu. “[A oposição] tem-se dedicado a este tipo de homicídios secretos e hediondos”, afirmou esta terça-feira o primeiro-ministro, Sheikh Hasina. “Este tipo de matança está a ser planeada.”

Mas grupos de direitos humanos como a Human Rights Watch (HRW), por exemplo, apontam o dedo ao Governo de Hasina por não estar a fazer o suficiente para travar a onda de intolerância religiosa no Bangladesh. “O Governo parece muito mais obcecado em oprimir a oposição política do que em que criminosos com catanas deixem de linchar aqueles que não acreditam com uma visão extremista do islão”, afirmou esta terça o director da HRW para o Sul da Ásia, Meenakshi Ganguly.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários