Demissões em bloco na Saúde após morte de jovem no Hospital de São José

Jovem de 29 anos morreu por falta de equipa de neurocirurgia ao fim-de-semana. Presidente da ARS de Lisboa e administradores do hospital demitiram-se.

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Enric Vives.Rubio

A presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar de Lisboa Central, a que pertence o Hospital de S. José, apresentou nesta terça-feira a demissão depois de um doente de 29 anos ter morrido naquela unidade hospitalar por não existir equipa de neurocirurgia vascular para o operar, após a ruptura de um aneurisma.

A decisão de Teresa Sustelo foi apresentada numa conferência de imprensa no Ministério da Saúde, que contou ainda com o presidente da Administração Regional de Saúde e Vale do Tejo, Luís Cunha Ribeiro, e o presidente do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, Carlos Neves Martins. Estes dois últimos responsáveis também se demitiram na sequência do caso.

“Nos últimos anos, com os cortes que tivemos na área da saúde, estes hospitais não tiveram a possibilidade de ter recursos humanos para dar resposta a situações de doentes como este”, explicou Luís Cunha Ribeiro. O responsável da ARS de Lisboa garantiu que já encontraram com a tutela uma solução e que agora ambos os centros hospitalares passam a conseguir tratar estes casos, independentemente da hora ou dia da semana. Cunha Ribeiro assumiu que “isto não limpa, não permite esquecer ou desculpar” a morte do doente, mas defendeu que a resposta encontrada demonstra “a vitalidade do Serviço Nacional de Saúde, a sua capacidade de resposta e a sua capacidade de se adaptar”.

O doente, de 29 anos, segundo adiantou o Correio da Manhã, deu entrada no Hospital de Santarém no dia 11 de Dezembro, uma sexta-feira, com dores de cabeça e paralisado do lado direito do corpo. Após o diagnóstico de uma hemorragia cerebral na sequência de um aneurisma, foi transferido para o Hospital de S. José, em Lisboa, com a indicação de que deveria ser operado de imediato para tentar reverter a situação.

No entanto, como a equipa de neurocirurgia vascular com capacidade para operar este tipo de casos deixou de integrar a prevenção feita aos fins-de-semana, o doente teve de esperar até segunda-feira. A situação agravou-se e acabou por não resistir às sequelas. Morreu na madrugada de domingo para segunda-feira, dia 14 de Dezembro. A família denunciou o caso à Ordem dos Médicos, que o PÚBLICO tentou ouvir, sem sucesso.

O Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC) confirmou ao PÚBLICO que “a prevenção aos fins-de-semana da Neurocirurgia-Vascular está suspensa desde Abril de 2014 e a da Neurorradiologia de Intervenção desde 2013” e lamentou a morte. Segundo o centro hospitalar, a prevenção é feita em “regime voluntário” e “existiu indisponibilidade por parte de alguns profissionais para a fazer, o que se deve às alterações dos regimes remuneratórios. Alguns daqueles profissionais rejeitaram os valores actualmente propostos para o pagamento dessas horas de prevenção, o que inviabiliza o indispensável trabalho da equipa”.

O CHLC adianta, ainda, que já enviou uma proposta à tutela para reactivar este tipo de prevenção, alertando para a “melhoria significativa dos cuidados que podem ser prestados no tratamento daqueles casos”. Na mesma nota, o hospital explica que existem dois neurocirurgiões em permanência no S. José. “Contudo, a cirurgia de urgência dos aneurismas, que é altamente especializada, carece de bloco operatório e de uma equipa de cirurgiões, anestesista, enfermeiros/as e assistentes operacionais especificamente habilitados para a realizar, não sendo possível efectuá-la com resultados satisfatórios sem as referidas condições técnicas, logísticas e de recursos humanos”, lê-se.

A namorada da vítima, numa carta publicada pelo Expresso, relata que na chegada a S. José lhe foi explicado que “se tratava da ruptura de um aneurisma, que o sangue se espalhou pelo cérebro e que, geralmente, estes casos de urgência teriam de ser tratados de imediato, ou seja, o doente teria de ser logo operado”. “Mas, como os médicos referiram, infelizmente calhou ser numa sexta-feira, logo não iria haver equipa de neurocirurgiões durante o fim-de-semana”.

“Deram-me a entender que o sangue espalhado pelo cérebro poderia, muito provavelmente, causar sequelas e posteriormente múltiplos AVC”, adiantou. No domingo, dia 13, foi dito à namorada e restante família que o rapaz de 29 anos estava em coma induzido por agravamento do estado.

“No dia seguinte, segunda-feira, dia 14, liguei várias vezes, querendo saber como tinha corrido a operação. No momento em que atenderam, por volta das 14h30, disseram-me simplesmente que não tinha sido realizada e que seria melhor deslocar-me ao Hospital São José, sem acrescentarem mais informações”. O doente tinha morrido.

Numa nota enviada esta terça-feira à noite, o Ministério da Saúde anuncia que decidiu abrir um inquérito ao caso. "Face às notícias hoje [esta terça-feira] difundidas na comunição social, referentes a um doente que faleceu no Hospital de S. José, o Ministério da Saúde solicitou ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), a abertura imediata de um inquérito para apuramento dos factos".

O Ministério da Saúde decidiu também solicitar à Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) a abertura de um processo de inquérito tendente a avaliar eventuais responsabilidades.

 

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