Passos Coelho: “Sinceramente, fiquei satisfeito com as conclusões que li do Conselho de Ministros”
Na primeira entrevista depois das eleições de 4 de Outubro, Pedro Passos Coelho assume-se como candidato a primeiro-ministro e líder da oposição ao Governo do PS.
Matizando a radicalidade discursiva com que considerou ilegítimo o Governo do PS, Pedro Passos Coelho inicia em entrevista ao PÚBLICO o seu percurso como líder de oposição. E não adianta a posição que tomará no Orçamento do Estado para 2016, já que espera para ver o que o Governo vai apresentar. Faz o elogio da acção do seu Governo e sobre o actual executivo sustenta que . “As medidas que foram anunciadas valem 0,027% do PIB, 46 milhões é, portanto, o que nos separa de ter um défice excessivo. Isso parece-me o maior elogio à política que fizemos.”
Vai mesmo votar contra tudo o que vem do Governo no Parlamento?
Com certeza que não. Não faria nenhum sentido.
Mas declarou que o PSD não colaboraria com o PS em circunstância alguma.
Não.
É capaz de precisar, pois foi o que toda a gente entendeu.
Não. O que eu disse foi que este Governo não é apoiado pelo PSD. O que me parece uma evidência. Este Governo é minoritário, do segundo partido, que se recusou a colaborar e a apoiar os partidos que ganharam as eleições e que se coligou no Parlamento com a extrema-esquerda e a esquerda radical para formar Governo. É aí que deve procurar apoio para o seu Governo. Julgo que seria uma perversão completa que agora que perdeu as eleições, reclamasse de quem as ganhou que o apoiasse. Isso não faz sentido de espécie nenhuma. Dito isto, o PSD é um partido responsável que não é por estar na oposição que muda de opinião em relação aquilo que é importante para o país e votará sempre de acordo com aquilo que é a sua avaliação quer do mérito das propostas quer do interesse nacional.
Mudou o discurso em relação ao que disse antes.
Estou a dizer exactamente o que disse no discurso de encerramento do debate do programa do Governo e o que disse noutras circunstâncias. No dia em que o actual Governo precisar de forma essencial do apoio PSD para poder governar, então nesse dia o dr. António Costa deve reconhecer que conduziu o país ao embuste, que o seu Governo não tem o apoio que ele disse que devia ter e que ele deve demitir-se e pedir a convocação de eleições porque a função de quem ganha as eleições não é apoia quem perde. Isso seria uma perversão democrática.
Pode divulgar a orientação de voto que vai dar em relação ao OE2016?
Não, porque ainda não conheço o OE2016.
Há alguma matéria inegociável?
Não quero fazer esse tipo de abordagem, não vou antecipar o que vai ser o OE2016. Isso compete ao Governo. O Governo é que tem de dizer qual é a proposta que vai apresentar.
Pensa apresentar propostas de alteração?
É completamente prematuro estar a fazer esse tipo de avaliação. Primeiro vamos aguardar pela proposta de OE2016 e depois iremos pronunciarmo-nos.
Como viu as medidas aprovadas no Conselho de Ministros para que o défice fique abaixo de 3%?
Sinceramente, fiquei satisfeito com as conclusões que li do Conselho de Ministros. Eu tinha transmitido ao dr. António Costa que Portugal tinha ao seu alcance sair do procedimento por défice excessivo, tendo já este ano um défice inferior a 3%, claro que isso pressupõe que a trajectória do défice público continue para a futuro a manter um perfil de redução estrutural do nosso défice. E é isso que consagrará, em Maio, a decisão de retirar Portugal do braço correctivo do Pacto e passarmos a não ter défice excessivo. As medidas que foram anunciadas correspondem basicamente aquilo que eu na altura disse ao dr. António Costa, que me parecia razoável. Se o Governo quisesse realmente ter um défice inferior a 3% estava nas mãos do Governo desde que o primeiro-ministro se empenhasse nisso, porque é sempre preciso dar força ao ministro das Finanças, para não ceder às pressões e para que possa haver uma gestão da tesouraria pública consentânea com esse objectivo. Ora o que ontem foi divulgado pelo Governo foi isso mesmo. As medidas que foram divulgadas quer dizer que o défice inferior a 3% está perfeitamente ao nosso alcance. As medidas que foram anunciadas valem 0,027% do PIB, 46 milhões é, portanto, o que nos separa de ter um défice excessivo. Isso parece-me o maior elogio à política que fizemos.
Era possível fazer melhor? Manter nos 2,7%?
2,7% parecer-me-ia difícil de alcançar, até porque havia expectativa de receitas que não se confirmaram, nomeadamente com algumas concessões e privatizações que acabaram por não se concretizar. E também porque houve alguns imprevistos do lado de alguns programas que foram executados que não tiveram tanto sucesso quanto nós esperaríamos e que acabaram por pesar um bocadinho mais em despesa do que nós tínhamos pensado. Mas julgo que dependendo da forma como a economia fechar este último trimestre assim poderemos ficar mais perto de 2,8 ou 2,9. Isso depende um bocadinho da evolução da receita fiscal e, portanto, da actividade económica deste último trimestre. O que é importante sublinhar é que aquilo que é mais discricionário dentro do Governo, que é a despesa, essa estava muitíssimo bem encaminhada. O relatório da Unidade Técnica de Apoio Orçamental reconheceu e vale a pena sublinhá-lo muito bem porque foi a primeira vez, desde que vivemos em democracia, que tivemos um ano de eleições em que a despesa corrente primária baixou e baixou mais do que estava previsto, o que mostra que houve um cuidado muito grande em não fazer demagogia, em não fazer eleitoralismos e populismos e em submeter a acção do Governo, mesmo em ano de eleições, aquilo que é o objectivo mais importante para o país que é livrar-se do défice excessivo e com isso ganhar espaço de manobra e de negociação com os nossos credores para podermos ter um crescimento mais sustentado nas finanças públicas nos próximos anos.
Em relação à reversão da venda da TAP e das concessões no Metro, Carris, que estão em cima da mesa, acha que ela não se colocava se Sérgio Monteiro tivesse sido mais rápido a concluir estes processos?
O dr. Sérgio Monteiro foi um magnífico secretário de Estado dos Transportes e sendo um objectivo do Governo, no seu todo, ter feito na área dos transportes a pequena revolução que se fez, deve-se muito à sua preparação e à sua determinação, os resultados que alcançamos. Andámos à velocidade que foi possível, demos os passos tão seguros quanto possível para termos bons resultados. Não creio que fosse, no essencial, possível ter feito melhor e mais depressa. Portanto, a resposta à sua pergunta é não.
Promoveu alguma diligência junto do Banco de Portugal e de outros operadores do sector para a nomeação de Sérgio Monteiro?
Não. Sou completamente alheio a essa escolha do BdP. Não é matéria que tivesse tido qualquer relação com o Governo.
Como comenta a remuneração de 30 mil euros que ele vai auferir?
Não comento porque nem sequer sei que renumeração é. Não é uma matéria que tivesse estado à disposição do Governo, foi uma decisão que coube ao BdeP. Não conheço os termos do contrato e, portanto, não vou fazer comentários sobre aquilo que não conheço.
Acha que este Governo vai cumprir a legislatura?
Não sou advinho e não gosto de formular palpites sobre isso. Posso dizer que é importante para Portugal a estabilidade e, independentemente, das referências que possamos ter sobre as escolhas dos programas dos governos. É bom princípio que eles possam durar para mostrar o que valem.
Conhecendo os meandros de Bruxelas, está a contar com uma ajuda de Bruxelas para que este Governo não consiga chegar ao fim? Por causa da acomodação da despesa.
Vamos ver as duas partes da sua pergunta. Primeiro, que atitude vai ter Bruxelas em relação ao novo Governo? Eu esperaria uma atitude de cooperação, de colaboração, porque é a atitude que se deve esperar.
O senhor próprio viveu essa exigência e provavelmente teve que engolir uns sapos de vez em quando para lidar com as exigências.
Repare, a vida não é fácil para ninguém. Eu não me costumo lamuriar nem queixar. Mas penso que a abordagem deve ser de cooperação. É do interesse da Comissão Europeia, da União Europeia e da zona euro, que Portugal seja bem sucedido e creio que será do interesse do Governo apresentar bons resultados. Portanto, à partida, deverá haver um bom relacionamento. Segunda questão, a Comissão Europeia vai adoptar uma estratégia, regras, objectivos feitos à medida do Governo português? Provavelmente não, porque esse não é o mecanismo europeu. Espero que haja exigência, mas não é em particular com este Governo. Também aconteceu com o anterior e também existe com os Governos dos outros países. Estou certo que a Comissão Europeia dentro dessas regras não deixará de ajudar o Governo português a cumprir essas regras.