Costa e Passos com "poucochinho" para apresentar a Cavaco
Presidente do PSD terá na mão apenas um governo minoritário. Líder socialista surgirá com uma negociação ainda em curso.
Tendo em conta a “solução governativa que assegure a estabilidade política e a governabilidade do país”, que Cavaco Silva pretendia dos partidos depois das últimas legislativas, qualquer um dos dois principais líderes políticos se reunirá esta terça-feira com o Presidente da República com "poucochinho" para convencer o mais alto magistrado da nação.
António Costa vai comparecer perante o Presidente da República com um entendimento moribundo à direita e negociações em curso à sua esquerda. Em qualquer dos casos, sem qualquer resultado prático para mostrar a Cavaco Silva. Isso mesmo transparece da carta que o secretário-geral do PS remeteu esta segunda-feira ao presidente do PSD.
Mas não é só daí que transparece o potencial posicionamento do socialista no encontro com o chefe de Estado. A indefinição reflecte-se também no facto do líder do PS não ter ainda agendado uma reunião da Comissão Política do seu partido. Dois dias depois das eleições, os socialistas decidiram mandatar o seu líder para “desenvolver, na globalidade do quadro parlamentar, todas as diligências julgadas necessárias” para que a “vontade dos portugueses não se perca na ingovernabilidade”.
Uma vez que o mandato era somente para negociar, o mesmo órgão teria de ser convocado para ser ouvido sobre um eventual entendimento conseguido com outras forças políticas. O facto de tal não ter ainda acontecido revela que Costa não tem ainda qualquer acordo em mãos.
Já na resposta ao convite de partilha de Governo - feito no domingo, por carta, por Passos Coelho - Costa termina com o aviso à direita de que a direcção socialista não pretendia ficar quieta nas próximas semanas.
“Por fim, reafirmo-lhe que, responsavelmente, o PS procurará assegurar as melhores condições de estabilidade e governabilidade que garantam esta reorientação, no quadro plural da nova representação parlamentar.” Ou seja, o líder socialista anunciava na carta que a sua linha de orientação para os próximos meses é trabalhar na aproximação à esquerda, não passando por um entendimento com a coligação.
Esse distanciamento levou mesmo António Costa e ser categórico em relação ao apelo de Passos. O socialista fechou, categoricamente, a porta a um governo de Bloco Central. “O que nos separa não são lugares no governo, que recusámos desde o início, ou o relacionamento pessoal - bastante cordial, devo reconhecê-lo - mas a imperiosa necessidade do país e a soberana vontade dos portugueses de uma reorientação de política, que persistem em não aceitar”, escreve na carta enviada ao presidente do PSD.
Desde há meses que o líder socialista insiste na ideia de que um governo com PSD e PS seria nocivo para a democracia portuguesa, por entender ser mais salutar a existência de uma alternativa clara no espectro político português.
Já por mais de uma vez, Costa explicou qual a “reorientação” política que exige à coligação. Além do “virar de página na política de austeridade”, o líder socialista exigiu a aposta nas políticas de Ciência e Conhecimento, além da defesa dos serviços públicos.
Governo minoritário à direita
Por seu turno, Pedro Passos Coelho leva ao Presidente da República uma solução de governo minoritário, mas sólido. A coesão entre o PSD e o CDS foi selada num acordo de Governo e de colaboração assinado dois dias depois das legislativas. Um acordo para toda a legislatura, com “coerência e estabilidade”, e assumindo o respeito pelas regras do Tratado Orçamental e propostas do Programa de Estabilidade apresentadas em Bruxelas em Abril deste ano.
Essa proposta de Governo, liderada por Passos Coelho, pretende actuar com um “permanente espírito de compromisso” e desenvolver os “necessários entendimentos”, segundo o texto assinado pelos líderes do PSD e do CDS, a 6 de Outubro. Nesse texto, os dois partidos já incluíam alguns pontos colocados por António Costa no caderno de encargos do PS para as conversações, mas como se veio a perceber, as negociações acabaram num impasse.
Esse Governo PSD/CDS, que Passos Coelho espera vir a ser chamado a formar, terá o apoio das duas bancadas, num total de 107 deputados . É minoritário, mas tem maior expressão do que o último governo de maioria relativa, liderado por José Sócrates, e que apenas era sustentado pela sua bancada de 97 parlamentares.
Nessa legislatura – de 2009 e 2011 –, PSD e CDS juntos ultrapassavam o PS. E os sociais-democratas com os bloquistas resultavam num empate. A expressão do apoio dos deputados do PSD e do CDS agora eleitos – faltando-lhes nove deputados para a maioria absoluta - será um dos argumentos que a coligação tem para defender a indigitação de Passos Coelho como primeiro-ministro.
Outro argumento tem sido repetido pelos dirigentes do PSD e do CDS: quem ganha as eleições, governa. “Uma regra constitucional que tem 41 anos”, lembrou esta segunda-feira Paulo Portas. O vice-primeiro-ministro tem sublinhado a importância de não pôr em causa a recuperação económica e tem estabelecido a associação entre a estabilidade e a confiança para prosseguir esse objectivo do crescimento económico e criação do emprego.
Nesse sentido, a coligação PSD/CDS quis dar um sinal sobre a capacidade de dialogar com a área social – e em certa medida reforçar a expressão do seu apoio público – ao fazer esta ronda pelos parceiros sociais. Esse é outro trunfo que Passos Coelho levará para a audiência desta terça-feira com Cavaco Silva.
Depois de ouvidos todos os partidos, o que acontece na quarta-feira, o líder do PSD espera ser nomeado primeiro-ministro. Passos Coelho já se comprometeu em manter Paulo Portas como vice-primeiro-ministro. É o único ponto dado como certo nesse futuro Executivo, caso venha a ver a luz do dia.
Opinião de João Miguel Tavares: Aquilo que Cavaco tem de fazer
Opinião de José Vítor Malheiros: A direita está triste porque acabou o apartheid
Opinião de Paulo Rangel: Linhas vermelhas. Vermelhas mesmo