Quando "Morrer como um Homem" parte em viagem, com Variações no carro e em direcção a Baby Dee no bosque, João Pedro Rodrigues aventura-se: é o pedaço mais livre da sua obra, um pedaço de cinema que vem do "underground", na estética, no gesto, na desarmante frontalidade de tudo... (E é uma ilha de afectos - por ali andam os fantasmas de Fassbinder, Anger, Jack Smith...).
À volta desta ilha, em que uma personagem, Tonia, tem o seu momento de encantamento e perdição, uma Alice que espreita o lado de lá do espelho (como em "O Fantasma", primeira longa do realizador), está o resto do filme: menos abstracto, enrolado numa dramaturgia que se coloca sempre à frente das personagens, quando não fora delas - por isso há mais convenções de escrita do que figuras habitadas. Mas se nisso "Morrer como um Homem" pisa os caminhos de "Odete", a segunda longa do realizador, escolhemos ficar dentro da "ilha" (quase um filme dentro do filme...), esse tira-teimas existencial onde um corpo que se construiu, o travesti Tonia, se confronta com a natureza e é desafiado, encantado e, finalmente, derrotado por ela - uma tragédia portuguesa, triste como o fado, de contornos menos olímpicos e ofegantes do que a das personagens, por exemplo, de David Cronenberg, sempre ávidas da superação dos seus limites, da sua natureza.