A vitória de James Blake foi a surpresa nos Mercury Awards
Overgrown venceu os favoritos AM, dos Arctic Monkeys, Sing to the Moon, de Laura Mvula, ou The Next Day, de David Bowie.
O músico londrino de 25 anos, criador de música que revela alma de cantautor numa era de sombras electrónicas (começou, não por acaso, na esfera do dubstep, a música electrónica da Londres do século XXI, confluência narcótica de hip hop, trip hop ou house), manifestou-se “em júbilo e confuso”, afirmando com humor, como se pode ler no Independent, que cita declarações nos bastidores da cerimónia: “Este é o primeiro prémio que ganho, à parte de um troféu de ténis quando tinha 12 anos. Tenho a mesma estima pelos dois.” O júri descreveu Overgrown como “música de noite alta para a idade digital”: “Um disco de grande beleza, inventivo, comovente e poético.”
Antes da entrega dos prémios, que teve lugar na noite de quarta-feira no Roundhouse, em Londres, os grandes favoritos à vitória eram a estreante Laura Mvula, com Sing to the Moon, os muito respeitados Arctic Monkeys, vencedores em 2006 com Whatever People Say I Am, That's What I'm Not, e agora nomeados por AM, ou, numa lógica de celebração e reconhecimento, o veterano David Bowie, que ressurgiu este ano com estrondo ao editar The Next Day. Para além da habitual discussão sobre os favoritos, a antecipação da edição deste ano foi também marcada pelo debate da natureza do Mercury. Estaria o prémio a tornar-se demasiado mainstream, questionava a imprensa, perante o facto inédito de cinco dos 12 nomeados (Arctic Monkeys, David Bowie, Jake Bugg, Disclosure e Rudimental) terem chegado a número 1 das tabelas de vendas. Em 2012, apenas um dos nomeados apresentava tal currículo e o álbum vencedor de 2009, Speech Therapy, de Speech Debelle, não teve sequer vendas suficientes para figurar nas tabelas de vendas.
Neste contexto, a vitória de James Blake surge, de certa forma, como prova de que os Mercury se mantêm como barómetro da música mais artisticamente válida criada no Reino Unido e na Irlanda. Como escreveu em título Alexei Petridis, crítico musical do Guardian, foi “a escolha surpreendente de uma lista previsível do Mercury Prize”. Algo, de resto, perceptível durante a cerimónia. Segundo o relato de Neil McCormick no Telegraph, o público presente no Roundhouse, formado na sua maioria por elementos da indústria discográfica, não prestou muita atenção à sua actuação durante a cerimónia. “Inicialmente, a sua torch song de alta tecnologia foi tão discreta que metade da sala nem sequer pareceu reparar que ele estava ali, tagarelando durante a sua soul ‘autotunada’ até que os sons sintéticos se tornaram tão profundos e ruidosos que as nossas entranhas vibravam.”
Essa evolução, uma imensa discrição que se vai entranhando pouco a pouco, serve de boa analogia para o impacto da música de James Blake, que se estreou em longa duração em 2011 com um álbum homónimo. O segundo, Overgrown, com colaborações de dois nomes tão distintos quanto Brian Eno e RZA, dos Wu-Tang Clan, aprofundou e solidificou as pistas deixadas em aberto pelas canções rarefeitas da estreia. Como escreveu Alexei Petridis, reflectindo sobre a vitória de Blake, “não é certamente o álbum mais imediato a vencer o Mercury Prize, mas assim que descobrimos o nosso caminho até Overgrown é difícil encontrar forma de sair dele.”
O segundo álbum de James Blake concorreu no Mercury com AM, dos Arctic Monkeys, Jake Bugg, de Jake Bugg, Settle, dos Disclosure, Holy Fire, dos Foals, Immunity, de Jon Hopkins, Once I Was An Eagle, de Laura Marling, Sing to the Moon, de Laura Mvula, Home, de Rudimental, Silence Yourself, das Savages, Awayland, dos Villagers e The Next Day, de David Bowie. Até ao início da cerimónia houve a expectativa de que Bowie a aproveitasse para ressurgir em palco, mas, tal como Laura Marling, não esteve presente. Enviou, contudo, um novo vídeo, o da remistura de James Murphy para Love is lost, que terá tido custos de produção inferiores a 10€.
Em 2012, o Mercury foi atribuído a An Awesome Wave, dos Alt-J. Outros vencedores foram xx dos The xx, I Am a Bird Now, de Antony & The Johnsons, Boy in Da Corner, de Dizzee Rascal, Different Class, dos Pulp, Dummy, dos Portishead, ou Screamadelica, dos Primal Scream, vencedor na estreia dos prémios, em 1992.