Fabricante do iPhone na China enfrenta vaga de suicídios
A empresa contratou monges, cantores e psicólogos e já colocou redes à volta dos dormitórios
As notícias têm chegado espaçadas. Mas com a morte de um trabalhador de 19 anos na terça-feira são já nove os suicídios desde o início do ano na fábrica da Foxconn na cidade de Shenzhen, no Sul da China, onde é fabricado o iPhone da Apple, bem como componentes da Dell ou da HP. Face às críticas sobre as condições de trabalho, a Foxconn abriu ontem as suas portas a um grupo de jornalistas.
Segundo a imprensa de Hong Kong, a maior fabricante de componentes electrónicos está a pedir aos funcionários para assinarem documentos a garantir que não se vão suicidar. A empresa desmente e sublinha a atenção que está a dar a estas mortes, notando que a taxa de suicídio entre os seus operários não é muito superior à média dos jovens chineses.
Entretanto, chamou monges budistas para afastar maus espíritos, contratou 2000 psicólogos, cantores e bailarinos, abriu uma linha telefónica de ajuda e inaugurou um centro de libertação de stress onde os operários podem esmurrar a fotografia do superior. Nos dormitórios do complexo, onde trabalham 400 mil pessoas, há já redes para tentar travar as quedas.
Para além dos nove trabalhadores que se suicidaram em Shenzhen, com idades entre os 18 e os 24 anos, outro funcionário matou-se numa instalação Foxconn no Norte da China e dois sobreviveram às quedas em Shenzhen.
Com os jornalistas, chegaram a Shenzhen sociólogos e psiquiatras para debater o problema. "Eles estão assustados", disse ao Los Angeles Times Peng Kaiping, um psicólogo social que se encontrou com Terry Gou, o director da empresa-mãe, a Hon Hai Precision Industry, sediada em Taiwan. "Ele não parava de me perguntar: "O que podemos fazer?""
A empresa garante que ninguém trabalha mais de 60 horas por semana, mas há relatos de muitos trabalhadores a fazerem horas extraordinárias para aumentarem o salário de 106 euros. "O trabalho é longo e monótono. A rapidez é muita e não se pode abrandar, pelo menos durante dez horas. Percebe-se que alguém possa ficar dormente e se transforme numa máquina", diz Lui Kaiming, investigador de questões laborais.
Um grupo de Hong Kong que combate o "mau comportamento corporativo", e já organizou protestos contra a Foxconn, divulgou terça-feira um relatório sobre o aumento do suicídio na China. O estudo sugere que por trás destas mortes está o fosso entre as expectativas que os jovens migrantes trazem ao deixar o mundo rural e a realidade que encontram na cidade. Ali contactam com o "sonho chinês, mas depressa percebem que realizá-lo é impossível", cita o Times.