Maternidade de substituição causa “preocupação” a Conselho de Ética
BE quer que as mulheres sem possibilidade física de conceber uma criança e que recorrem às chamadas “barrigas de aluguer” se tornem as suas mães legais.
O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) considera que o contrato subjacente à “gestação de substituição” provoca “grande preocupação” e não salvaguarda os direitos da criança nem da mulher gestante. Este parecer, que foi realizado a pedido da Comissão Parlamentar de Saúde, consta num relatório do CNECV que avalia os projectos de lei do PS, PAN, BE e PEV apresentados em Novembro sobre a Procriação Medicamente Assistida (PMA) e, apenas no caso do BE, também sobre a “gestação de substituição”.
O Bloco de Esquerda apresentou uma proposta para alteração nos processos da chamada “maternidade de substituição” — vulgarmente conhecida como "barrigas de aluguer" — que prevê duas alterações ao actual quadro legal em vigor: recomenda que se altere o nome dado ao processo, passando este a chamar-se “gestação de substituição” em vez de “maternidade de substituição"; e sugere a possibilidade de realização de um “negócio jurídico” entre a gestante e os beneficiários, através do qual a primeira se compromete legalmente a entregar a criança após o nascimento.
Este contrato só será aplicável a casos excepcionais em que a beneficiária não consiga conceber uma gravidez, "de forma absoluta e definitiva", quer por ausência de útero, quer por lesão ou doença. Este acordo não admite qualquer pagamento ou doação à gestante, excepto o relativo às despesas associadas a todos os procedimentos envolvidos, e tem de ser precedido por uma audição da Ordem dos Médicos e da autorização prévia do Conselho Nacional da PMA. Tendo o Conselho aprovado o processo, a criança é tida como filha dos respectivos beneficiários. Para os que não cumpram estes requisitos, está prevista uma pena de dois anos de prisão ou multa até 240 dias.
No que respeita a este projecto de lei, o Conselho de Ética mostrou também preocupações sobre a defesa dos direitos da mulher gestante, por considerar que “não estão salvaguardados os direitos da criança a nascer” e da sua mãe biológica. Por outro lado, diz que não é feito o “enquadramento adequado” do contrato de gestação. O relatório sublinha ainda que o projecto em consideração não contempla “em larga maioria” as 13 condições que o Conselho considera fundamentais para que o processo seja exequível.
Os autores do documento analisaram ainda o alargamento das técnicas de PMA num projecto de lei que junta as propostas do PS, PAN, BE e PEV. “As técnicas de PMA só podem ser utilizadas em benefício de pessoas com pelo menos 18 anos de idade e que não se encontrem interditas ou inabilitadas por anomalia psíquica e que tenham manifestado de forma esclarecida o seu consentimento”, pode ler-se no documento, que tem como principal objectivo alterar a legislação actual na parte em que esta refere que o acesso a estas técnicas só é permitido quando os envolvidos são um homem e uma mulher casados ou em união de facto.
O novo projecto de lei propõe que “toda e qualquer mulher” tenha acesso às técnicas de reprodução mesmo que esta seja “autora em exclusivo” do projecto parental. Quando a técnica se aplica a casais, pretende-se que todos os projectos que envolvam duas pessoas sejam incluídos, quer estas estejam ligadas por uma relação de vida em comum, com ou sem casamento (projecto do PS). O BE vai mais longe e pede a inclusão de todos os casais, sejam estes casais heterossexuais ou homossexuais. Caso se trate de dois homens, pede ainda a legalização do projecto de lei anterior — a “gestação de substituição.”
No que respeita à determinação de paternidade quando os beneficiários sejam dois homens ou duas mulheres, propõem que se use apenas a expressão “parentalidade”. Este regime também se aplicaria a projectos de parentalidade de uma só pessoa, sendo a criança registada apenas com um dos nomes dos progenitores.
No parecer, relembra-se também que as técnicas de PMA foram criadas para dar resposta a casos de infertilidade e considera-se que a aplicação das técnicas de PMA que não se enquadrem neste contexto precisam de uma “clara ponderação ética”. Por outro lado, e não obstante o beneficio da mulher, conclui-se que o interesse da criança deve ser valorizado acima dos demais.