Falcões e águias da GNR em teste final para caçar incêndios nos céus do Gerês
Até 2016, três milhões de euros serão investidos em 14 drones. Centro de Meios Aéreos de Arcos de Valdevez, onde estão sediadas equipas do Grupo de Intervenção de Protecção e Socorro e do Serviço da GNR, vai controlar pequenas aeronaves. Com elas vai descobrir pequenos fogos e prevenir incêndios maiores. São torres de vigia no ar que revolucionam a prevenção e o combate aos incêndios.
É um militar da GNR, de férias, quem é apanhado a fazer fogueiras. Mas legais, percebem depois os quatros guardas que velozes se lançam ao caminho em dois jipes apetrechados. João Araújo, de 31 anos, sabe como fazer queimadas. Está a limpar os terrenos da família com o sogro e dois trabalhadores. “Estamos fora da época de risco máximo e fizemos pequenos montinhos. Fiz tudo como manda a lei. Vou ter problemas?”, pergunta o guarda de 31 anos com o rosto marcado pela fumaça que sobe da madeira que estala a arder. Ao lado, o primeiro-sargento Jorge Cruz sorri surpreendido com o achado. “Ai és tu! Está tudo muito bem feito.”
Falcão e águia são os dois modelos de drones que vão patrulhar aquela zona já em Junho, na altura de maior risco na época de incêndios. Serão os olhos da GNR nos céus do Gerês graças às câmaras que carregam. Funcionarão como um Big Brother para proteger a floresta das chamas. As imagens que captam são transmitidas em tempo real através de ondas rádio para os computadores do centro de comando em Arcos de Valdez. Através da Internet podem também chegar a qualquer tablet ou telemóvel. Na comunicação chegam ainda as coordenadas do local exacto para onde os guardas se deslocam com mangueiras e material de sapador.
Os drones fazem o combate e a detecção de incêndios dar um salto tecnológico face às tradicionais torres de vigia. Está em curso uma “revolução”, vaticina o major-general Rui Moura, responsável pelo Centro de Doutrina e Formação da GNR e mentor deste projecto. “Somos pioneiros. Aquilo a que aqui assistimos ainda não aconteceu em parte alguma do mundo”, assegura. Os 1908 incêndios que entre 2000 e 2012 consumiram mais de 31.900 hectares de mato e floresta no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) são a maior motivação para o projecto VIANA, acrónimo de Sistema de Vigilância do Ambiente e da Natureza no Alto Minho.
Até 2016, a GNR espera ter 14 naves não tripuladas a sobrevoar o PNPG. Dez falcões, que são mais pequenos e têm uma autonomia de apenas duas horas e um alcance de 10 quilómetros, e quatro águias que têm cerca de quatro metros de largura e uma autonomia de dez horas que lhes permite um alcance de 60 quilómetros. Os falcões podem ser lançados manualmente e são operados a partir de qualquer lugar. Já as águias, com motor a gasolina, são lançadas de uma espécie de fisga gigante e podem atingir os 120 km/h.
“A missão está com alguns problemas. As rajadas estão fortes. O vento está com uma velocidade de quase 50 km/h. É muito”, diz o cabo Duarte Barreira que olha preocupado para um pequeno computador portátil através do qual comanda o falcão.
Preparados para aterrar
O drone está de regresso à base e ao longe parece uma ave frágil de asas estendidas. Para manter a direcção, bate-se com o vento que o faz zigue-zaguear. “Está a levar muita porrada. Não foi um bom dia para fazer testes”, lamenta um militar. A poucos segundos da aterragem, uma equipa da GNR corre para o local onde o drone toca o solo. O falcão abre o paraquedas e precipita-se na vertical. “Que grande tombo!”, diz um guarda.
O vento forte não abafa o som da queda, mas estes drones, que aterram sempre desta forma, estão preparados para estas aterragens. A águia tem até um airbag que lhe amacia a queda. Lançada de seguida, aterrou, contudo, sem que o airbag funcionasse. “Talvez tenha sido mal enrolado. É normal e os drones estão preparados para isso”, explica Ricardo Mendes, o administrador da Tekever, empresa parceira da GNR neste projecto que implica um investimento total de três milhões de euros.
A Tekver tem já parcerias, neste ramo, com o Exército, a Marinha, a PSP, o Ministério da Defesa britânico, a Marinha brasileira e com as Forças Armadas colombianas. Os seus drones são usados para vigiar as zonas de narcotráfico na Colômbia e em breve a empresa, que colabora com a produção de satélites no Centro de Engenharia de Micro-satélites de Xangai, lançará tecnologia para o espaço
“Esperamos um financiamento através de fundos europeus”, refere Ricardo Mendes. Porém, nem o administrador nem o Major-General adiantam o valor concreto que a GNR terá de investir. “A GNR essencialmente coloca aqui a sua vertente humana e a sua capacidade de operar estes meios nas suas áreas de responsabilidade”, diz Rui Moura. Já Ricardo Mendes assegura que a “maioria do investimento” será sustentado por fundos europeus cuja atribuição ainda aguarda. Também as autarquias da zona deverão investir no projecto.
Vazio legal
A águia e o falcão não poderiam ser operados por bombeiros. A lei em Portugal é omissa quanto a estes aparelhos. A legislação “ainda está em construção”, destaca Rui Moura enquanto o administrador da Tekever sublinha, nessa lógica, a importância da parceria com a GNR. A “convenção de Chicago [que Portugal assinou em 1944, sobre a aviação internacional civil]” permite que “forças de segurança operem estes aparelhos". A questão é polémica e a Agência Europeia para a Segurança na Aviação enviou quinta-feira uma proposta aos Estados membros para que os drones sejam separados na lei em três categorias, cada uma com regras específicas.
No ermo do Centro de Meios Aéreos, Rui Moura, sublinha, contudo, que apesar do vazio legal, Portugal já é “pioneiro”. “Estes aparelhos são demasiado caros para desempenharem uma única missão e estarem depois fechados num armário.” Os drones vão trabalhar durante todo o ano no Gerês na fiscalização da floresta e na cartografia da zona. Serão também uma grande ajuda nos rescaldos dos incêndios como vigias atentos a reacendimentos e nas operações de busca e salvamento.
“Este ano, com a ajuda dos drones vai tudo correr melhor quando vierem os incêndios. É a tecnologia a ajudar”, diz o cabo Filipe Rodrigues, enquanto ao volante do jipe da GNR, no regresso da queimada legal ao centro de meios aéreos, se bate com problemas na caixa de velocidades.