Burlas crescem há uma década e há mais droga nas cadeias

Criminalidade desce há seis anos consecutivos, mas Relatório Anual de Segurança Interna de 2014 mostra que as burlas teimam em crescer há mais de uma década, as cadeias registaram mais mortes, o tráfico de pessoas disparou e os crimes cresceram dentro das escolas.

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O arguido encontra-se detido PAULO RICCA/Arquivo

Espionagem com nova dinâmica
A espionagem clássica “tem ganho nova dinâmica no actual contexto europeu”, diz-se no relatório, que considera “expectável” que tal se verifique igualmente em território nacional. Identifica-se como principais objectivos desta actividade a recolha de “informação sensível de natureza política, que possa antecipar as posições do Estado português em determinados assuntos de relevância internacional nomeadamente no que se refere aos conflitos armados e à definição das prioridades do Governo português em matéria de política externa”. Rui Pereira interpreta estas considerações apenas como um juízo de prognose. “Trata-se apenas de uma previsão e não uma descrição do que tem acontecido”, afirma. O relatório tem ainda dois parágrafos dedicados à espionagem económica, referida como uma “realidade cada vez mais presente” à qual Portugal não está “imune”. “Neste quadro há a destacar a candidatura de Portugal a uma das maiores extensões da plataforma continental do mundo, como foco de interesse para os serviços de informação estrangeiros, entre outras entidades, que procuram obter conhecimento sobre as potencialidades, os recursos naturais, os operadores económicos, os projectos em curso e os seus intervenientes”, lê-se no documento. Uma afirmação muito similar já integrava o relatório de segurança interna de 2013.

Tráfico de pessoas sobe mais de 60%
É um crime com uma dimensão reduzida, mas que tem chamado cada vez mais a atenção das autoridades pela sua gravidade. De acordo com dados da Direcção-Geral da Política de Justiça o ano passado foram registado pelas autoridades policiais 48 crimes de tráfico de pessoas, mais 20 do que em 2013.  Num outro ângulo do problema, o relatório dá conta que em 2014 foram sinalizadas 182 presumíveis vítimas em Portugal (menos 39%) e 15 portugueses no estrangeiro (mais 67%). A maioria das presumíveis vítimas é do sexo feminino e está associada na quase totalidade ao tráfico para fins de exploração sexual. Tal constitui uma alteração face a 2013 em que 175 das vítimas sinalizadas eram do sexo masculino e, destes, 149 estavam associados a exploração laboral. Uma parte muito significativa destas vítimas acaba por não ser confirmada enquanto tal, um número não integrado no relatório. Apenas se refere que em 2014 receberam assistência em centros de acolhimento 15 das 25 vítimas confirmadas em Portugal. O documento realça ainda diversas condenações ocorridas o ano passado pelo crime de tráfico de seres humanos, como cinco arguidos que apanharam penas entre quatro e 16 anos de prisão por tráfico para escravidão.

Burlas em crescimento há mais de uma década
Desde 2003 que os crimes de burla têm vindo a crescer progressivamente, registando em 2014 um número recorde de participações: 12.582. Onze anos antes a contabilidade ficava-se pelas 5.799, o que significa que em pouco mais de uma década este crime mais do que duplicou. Os crimes informáticos também têm assistido a uma tendência crescente. Os valores absolutos são bastante menos significativos que as burlas (ficam-se pelas 468 participações), mas em termos relativos o aumento entre 2003 e 2014 é bastante mais alto: 592%. Na análise aos arguidos constituídos no âmbito dos crimes informáticos percebe-se que estas duas realidades se cruzam. É que num total de 464 arguidos, 372 são suspeitos de “burla informática e nas comunicações”.

Crimes dentro das escolas aumentam 11%
Apesar da tendência de decréscimo da criminalidade, os crimes aumentaram dentro das escolas no ano passado. Os dados mostram um crescimento de 10,8% deste tipo de ocorrência face a 2013 no interior dos estabelecimentos de ensino, com mais 325 registos que o ano anterior num total que atingiu os 3.324. No exterior das escolas os crimes contabilizados também aumentaram mas numa proporção inferior: 2,7%. No âmbito do programa “Escola Segura” a PSP e a GNR registaram 6.693 ocorrências, 72,5% das quais de natureza criminal. Destes, destacam-se as ofensas corporais (1.665), os furtos (1.220) e as injúrias/ameaças (669).

Abuso sexual de menores aumentou
Um dos indicadores que se revela no Relatório Anual de Segurança Interna de 2014 com maior destaque é aquele que aponta o aumento dos crimes relativos ao abuso sexual de crianças. Relativamente a 2013, o “abuso sexual de crianças, adolescentes e menores dependentes” registou um aumento de 17,7%. Em 2013 registaram-se 859 crimes deste tipo, enquanto no ano passado ocorreram 1011 crimes deste tipo. Também os crimes de “maus tratos ou sobrecarga de menores aumentaram 23,3% com 292 crimes em 2013 e 360 em 2014. O mesmo aumento se verificou relativamente ao lenocínio (mais 40,2%) e ao tráfico de pessoas (mais 63,6%). O relatório sublinha ainda um aumento dos crimes de violação em 8,7% no ano passado face a 2013.

Maior violência doméstica ao fim-de-semana
A violência doméstica contra cônjuge ou análogo registou em 2014, mais 31 casos participados do que no ano anterior, ou seja, mais 0,1%, mas neste ponto a forma é fundamental destacar que de uma forma geral o crime de violência doméstica, entendido de forma geral a cônjuges e outros familiares diminui em 2014. No ano passado, foram participados 27.317 crimes daquele tipo quando em 2013 os crimes participados foram de 27.318. A diminuição corresponde a apenas um caso, mas o relatório faz questão de a sublinhar. “Verifica-se uma diminuição residual de -0,004%, o que se traduz em menos um caso”, atenta o documento. Foi o distrito de Lisboa aquele que em 2014 mais casos registou com uma conta de 5.851 crimes de violência doméstica participados às autoridades. Neste tema, 56,6% dos crimes ocorrem entre cônjuges ou companheiros, seguidos por situações de violência entre ex-cônjuges e ex-companheiros (15,9%), filhos ou enteados (13,6%) e em 5,6% dos casos as agressões ocorreram com pais ou padrastos. Nos restantes 8,3% dos casos a estatística do relatório não identifica o grau de parentesco entre as vítimas e os agressores.

O RASI revela ainda que a maior parte das agressões (33%) ocorreram durante o fim-de-semana, sendo que 44% das ocorrências registaram-se entre as 19h e as 24h. Em 77% dos casos, a polícia foi chamada a pedido de vítima, apenas 9% teve origem em informações de familiares ou vizinhos, 4% decorreu do conhecimento das polícias e em 3% das situações a situações foi descoberta através de uma denúncia anónima. Por outro lado, 38% das situações de violência foram presenciadas por menores e em 41% das ocorrências o agressor ficou conotado com problemas relacionados com o consumo de álcool.

Jihad recruta em Portugal
Até agora, os dados disponíveis não revelam um envolvimento “sistemático de cidadãos nacionais em palcos da jihad internacional”, mas o relatório aponta uma “tendência de participação de alguns concidadãos, na sua maioria convertidos, em actividades de redes terroristas transnacionais, tanto como combatentes, ou em domínios de recrutamento e encaminhamento de elementos para a Síria ou para o Iraque.

No capítulo dedicado ao terrorismo jihadista, o relatório deixa bem claro que existem “alguns cidadãos portugueses e luso-descendentes” envolvidos como combatentes. O documento faz esta referência no contexto daquele tipo de terrorismo na região síria-iraquiana considerando que em 2014 foi o “principal palco da jihad internacional, particularmente na sequência da ascensão regional do Grupo Estado Islâmico e do elevado contingente oriundo da Europa a combater naquela região”. Neste ponto, o RASI salienta o incremento da ameaça representada pelo terrorismo jihadista “de matriz islamita” e conotado com a “Al Qaida” e outros grupos afiliados. É possível perceber, através da leitura do relatório, que as autoridades portuguesas mantêm uma permanente monitorização desde fenómeno no sentido de avaliar a “projecto [deste terrorismo] sobre os interesses portugueses no mundo, sobre o território nacional e sobre o movimento de cidadãos nacionais para palcos da jihad”.

Menos reclusos, mais mortes e mais droga nas cadeias
Entre 2013 e 2014, as cadeias passaram a ter menos 281 reclusos. No total, existiam no ano passado 14.003 reclusos, 275 dos quais considerandos inimputáveis. Entre estes 2330 estavam enclausurados preventivamente, enquanto 11,673 cumpriam já uma pena efectiva de prisão. Os homens (93,9%) representam a maior parte dos reclusos. Outro ponto merece destaque neste contexto: Em 2014, ocorreram mais 11 mortes e mais nove suicídios nas cadeias do que em 2013. Os números totais referentes ao ano passado apontam um registo de 73 mortes nas prisões, entre as quais 22 foram suicídios e 51 ocorreram por doença. O número de reclusos evadidos também aumentou, apesar de terem diminuído as fugas. Também as apreensões de droga nas cadeias aumentaram de 2013 para o ano passado. As apreensões de haxixe aumentaram 35%, as de cocaína 47%. Mas já no caso da heroína, o número de o registo de apreensões diminuiu 63%. 

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