Concurso "Isto também é comigo!"

“A Igreja pouco faz e pouco deixa fazer”. Prémio para João Pinhal

Aluno do Agrupamento de Escolas de Sampaio, em Sesimbra, vence edição de março do concurso de textos de opinião.

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"A imoralidade da Igreja Católica portuguesa sobrevive", o que indigna João Pinhal DR

A Igreja pouco faz e pouco deixa fazer

O mês da vergonha acabou. Não obstante, a imoralidade da Igreja Católica portuguesa sobrevive e a resposta da sociedade permanece insuficiente perante a monstruosidade a que foram sujeitas as vítimas de uma instituição que, em vez de as salvaguardar, teima em proteger deliberadamente os alegados agressores. Sim, infelizmente, é tão simples quanto isto. Como o PÚBLICO noticiou a 3 de março, José Ornelas ousou considerar pouco plausíveis os dados revelados, que eram, porém, fruto de um trabalho de investigação rigoroso. Defendendo-se com questões jurídicas, a Igreja deixou não sei onde aquilo que tanto apregoa: a moralidade.

O que faz a instituição para honrar as vítimas do passado e evitar que outras engrossem a lista no futuro? Afastar suspeitos ou indemnizar vítimas? Não. Recorre a insensíveis palavras para defender a maculada Igreja. É assim que procede Manuel Clemente. Será para ele uma inóspita ideia oferecer aos mais jovens Educação Sexual? Sim: o cardeal-patriarca assinou, em 2020, um manifesto contra a obrigatoriedade da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Não quer, assim, que as crianças e os adolescentes sejam sensibilizados para a necessidade de compreender e denunciar abusos e de ter a consciência de que qualquer ato sexual sem consentimento é crime, seja com menores ou com adultos. Manuel Clemente deixa, desta forma, a proteção de crianças ser, ignobilmente, ultrapassada em importância pela indecência que será, para a Igreja, falar sobre sexo.

Em comunicado à imprensa, em junho de 2022, o partido de André Ventura, católico radical, considera “atentatório dos princípios elementares da liberdade” o caráter obrigatório da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Promover direitos humanos e construir uma sociedade ativa destrói a liberdade de quem? In extremis, evita que partidos profundamente perigosos para as liberdades cívicas alcancem o poder.

Os autoproclamados guerreiros contra a pedofilia em vez de a combaterem, perpetuam-na com populismos desbragados e ineficazes. A Igreja pouco faz e pouco deixa fazer. Ironia das ironias é, em agosto, ir dar uma festa com a sua mais alta figura hierárquica para celebrar a juventude. Qual? Aquela que não protegem, nem deixam que seja protegida em nome de dogmas religiosos subversivos da dignidade humana?

Pois, é essa mesmo.

João Miguel Rodrigues Pinhal
Agrupamento de Escolas de Sampaio, Sesimbra
12.ºano

[Com este texto, João Miguel Rodrigues Pinhal, aluno do 12.º ano no Agrupamento de Escolas de Sampaio, em Sesimbra, venceu a edição de março de 2023 do concurso “Isto também é comigo!”, promovido pelo PÚBLICO na Escola e pela Rede de Bibliotecas Escolares (RBE). Recebe uma colecção de livros do PÚBLICO e vê o seu texto publicado. A escola do aluno ganha uma assinatura digital anual do PÚBLICO ou uma colecção de livros para a biblioteca. A notícia do PÚBLICO que suscitou o texto de opinião vencedor é da autoria da jornalista Natália Faria. Integraram o júri desta edição do concurso: Carla Fernandes, em representação da RBE; Carolina Franco, jornalista, colaboradora do PÚBLICO na Escola; Cláudia Sá, professora de Português e coordenadora do Clube de Jornalismo da Escola Básica António Correia de Oliveira, em Esposende; e Gustavo Pereira, aluno do AE de Águas Santas​.]