ano 2021-22

Mar da Palha e Lyceu Newsletter vencem Concurso de Jornais Escolares

São jornais de todo o país, alguns da inteira responsabilidade dos alunos. Há onze vencedores para nove prémios.

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Quando recebeu a chamada a dizer que Lyceu Newsletter, o jornal que coordena, tinha sido distinguido no Concurso Nacional de Jornais Escolares, promovido pelo PÚBLICO na Escola, o professor José António Gouveia não acreditou. Mas não era engano: o jornal da Escola Secundária Jaime Moniz, no Funchal, foi um dos dois grandes vencedores desta edição do concurso, juntamente com o Mar da Palha, jornal do Agrupamento de Escolas Emídio Navarro, em Almada. Têm em comum a resiliência e longevidade de quase duas décadas.

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Neste Concurso Nacional de Jornais Escolares 2021/22, que contou com 129 candidaturas elegíveis, houve um pouco de tudo. Jornais em papel, digitais, newsletters, publicações já com muitos anos de existência e outras que surgiram mais recentemente. E a lista final de premiados foi um reflexo dessa diversidade de meios, abordagens e contextos. O destaque do grupo de vencedores vai para a grande “distribuição geográfica” e para a “forte presença de jornais da responsabilidade total de alunos”, diz Luísa Gonçalves, professora e coordenadora do PÚBLICO na Escola e jurada do concurso. Além de Lyceu Newsletter, melhor jornal de escola, e Mar da Palha, melhor jornal de agrupamento, foram premiados projetos de Norte a Sul de Portugal continental, e ainda um dos Açores.

Ao Mar da Palha a notícia chegou “com muita alegria”. Já haviam sido distinguidos nas duas edições anteriores do concurso com o prémio de Melhor Reportagem — e, por isso, participado no programa Põe a Tua Escola no Mapa — , bem como noutras edições há mais tempo. Mas esta foi a primeira vez que o jornal foi reconhecido pelo seu todo. Desde que surgiu, em 2002, houve que ultrapassar inúmeros desafios impostos pelo contexto socio-económico. Foi disso exemplo a chegada da crise económica e, com esta, a falta de recursos para a publicação de três edições anuais, de novo uma realidade nos últimos anos. O prémio vai para as mãos de Luís Maia, professor de Português e responsável pelo Mar da Palha desde a sua fundação, num momento particular: o ano letivo de 2021/2022 foi o último em que trabalhou na escola que viu nascer o jornal.

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O percurso de José António Gouveia, professor de artes visuais no Funchal, no mundo do jornalismo escolar não é muito diferente do de Luís Maia. Também o responsável pelo Lyceu Newsletter está no jornal desde a sua fundação, em 2003. No caso do jornal da Escola Secundária Jaime Moniz, houve um processo de metamorfose que foi acontecendo por força das circunstâncias. Passaram do papel para o online; da revista O Lyceu, que contou com 17 edições impressas, para a newsletter homónima. Primeiro a medo, depois convictos das potencialidades que o digital tem para oferecer. E se a transição para o digital no formato de newsletter fez com que inicialmente comunicassem maioritariamente os acontecimentos da escola, com a pandemia o jornal voltou a dar destaque aos trabalhos dos alunos. “Foi uma aposta ganha, começámos a ter mais trabalhos dos alunos e voltámos ao modelo antigo, que é o que faz mais sentido para nós como equipa”, conta o professor.

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Apesar de, ao contrário do Mar da Palha, o Lyceu Newsletter ser uma estreia no Concurso Nacional de Jornais Escolares desde o seu regresso (no ano lectivo de 2019/2020), também já tinha recebido uma menção honrosa numa das edições anteriores. Para o júri, a dispersão geográfica é um fator importante, mas também para este jornal do Funchal o reconhecimento tem algum peso: “Somos um grãozinho de areia no meio do oceano Atlântico e, quer se queira quer não, os insulares podem sentir um complexo de inferioridade relativamente àquilo que se faz fora”, sublinha José António Gouveia. “[O prémio] serve para estes alunos verem que hoje em dia não importa muito onde estamos, podemos chegar a todo o lado e divulgar os nossos trabalhos.”

Há uma “relevância cada vez maior dos trabalhos”

Os vencedores dos primeiros prémios do Concurso Nacional de Jornais Escolares são veteranos no mundo do jornalismo escolar, mas os assuntos que levantam e a abordagem que utilizam não estão em nada ultrapassados. A relação com a atualidade é um dos pontos destacados por Andreia Sanches, directora-adjunta do PÚBLICO e membro do júri, nesta edição do concurso. Se tivesse de selecionar três grandes temas mobilizadores de conteúdos, diria “igualdade de género”, “crise climática” e “saúde mental”. Luísa Gonçalves acrescentaria “guerra na Ucrânia” e “pandemia”. E será o olhar dos jovens jornalistas válido e importante? “Seguramente”, responde Andreia Sanches.

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A directora-adjunta do PÚBLICO conta que parte do seu entusiasmo em pertencer ao grupo de jurados se prende com o facto de conseguir perceber “quais são as questões que mais preocupam estes jovens jornalistas escolares e os temas que consideram mais relevantes”. E que não são menos importantes do que aqueles em que os mais velhos se focam, alerta. “A crise climática é um paradigma disso: antes de muitos de nós, adultos, considerarmos este tema absolutamente urgente e prioritário nas nossas agendas, os jovens percecionaram-no como tal.”

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Ganhar um prémio do concurso é uma forma de ver reconhecido o trabalho feito pelos jovens durante o ano letivo transato, como refere o professor responsável do Lyceu Newsletter, mas pode também contribuir para a sua subsistência. Os dois melhores jornais, de agrupamento e de escola, receberão um prémio no valor pecuniário de 2000 euros. Já os segundos melhores de cada categoria recebem 1000 euros. Pela primeira vez nos últimos três anos, o segundo prémio de melhor jornal de escola foi atribuído a dois jornais ex aequo: o “Eça News”, do Agrupamento de Escolas Eça de Queirós, em Lisboa; e o Teixeira+, do Agrupamento de Escolas Manuel Teixeira Gomes, em Portimão. O segundo lugar do melhor jornal de escola foi para “Se bem nos lembramos”, da Escola Secundária Vitorino Nemésio, na Praia da Vitória, Açores. Três jornais de pontos geográficos distantes, mas com algo em comum: são geridos por alunos.

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O prémio ex aequo, que este ano é atribuído também na categoria de Incentivo, é um sinal da “relevância cada vez maior dos trabalhos que têm vindo a ser apresentados”. Quem o diz é José Carlos Sousa, director de Serviços de Projetos Educativos da Direcção-Geral da Educação que integra o júri há três anos. “Tenho vindo a verificar que os trabalhos têm tido uma projecção melhorada. Há muitos que se distinguem e que mereceriam, eventualmente, o primeiro prémio”, acrescenta. O avanço qualitativo é também apontado pela colega de júri Helena Soares, designer e professora, do ponto de vista estético: “Acho que as pessoas que estão envolvidas na elaboração dos jornais vão tendo cada vez mais consciência de que a comunicação fica incompleta sem essa parte visual bem trabalhada.” Ressalva, no entanto, que “continuam a existir grandes lacunas no que diz respeito ao design dos jornais”.

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Neste que foi um ano letivo de regresso à normalidade depois da pandemia, o surgimento de novas publicações não foi exceção. E mesmo perante algumas dificuldades, “nota-se que continua a haver um esforço grande por parte das escolas” para que o jornalismo escolar continue vivo e de boa saúde, reforça Luísa Gonçalves. A coordenadora do PÚBLICO na Escola nota também que ainda que alguns jornais continuem a resistir e a fazer o possível para manter edições impressas, “é evidente o salto para o digital alegando dificuldades financeiras, preocupações ambientais e possibilidade de alcance de um público mais alargado”. Uma vantagem, para Andreia Sanches: “Os jovens também estão a apostar em linguagens com as quais se identificam mais”, em projetos mais digitais, que incluem texto, vídeo, podcasts.

“Aqui fazemos da escola a vida e da vida a escola”

É, contudo, ainda no papel que vivem os jornais aos quais foi atribuído o prémio Incentivo, no valor de 500 euros e com direito ao workshop “Como fazer um jornal”, orientado pelo PÚBLICO na Escola. Um deles é o Jornaleco da n.º5, da Escola EB1 n.º 5, em Olhão, que tem como finalidade “promover e estreitar os laços escola/família/comunidade”. Este “jornaleco” é quase tão antigo quanto o próprio PÚBLICO na Escola, já que o seu primeiro número em papel — e escrito maioritariamente à mão — surgiu perto do Natal de 1995. A partir de então, tem mantido uma publicação trimestral regular, com excepção dos primeiros dois anos de pandemia, e tem estreitado a relação com a comunidade. Desde 1999, o jornal inclui uma página ocupada por uma entidade externa à escola. Já por lá passaram o centro de saúde, a biblioteca municipal e até mesmo o Oceanário e clubes desportivos.

E qual será o segredo para a longevidade? “A estrutura organizativa do projeto”, escrevem no texto de apresentação enviado na candidatura. Juntam-se alunos, professores e também outras estruturas importantes dentro da escola, como a biblioteca escolar. Também no caso do outro vencedor do prémio incentivo, o jornal bianual Palavras&Companhia, da Escola Profissional de Desenvolvimento Rural de Alter do Chão, a biblioteca assume um papel preponderante: apoia a elaboração dos trabalhos dos alunos, ao facultar materiais de apoio, e funciona como a casa-mãe do jornal.

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Nesta escola profissional do ensino público aprende-se, entre outras coisas, a ser Técnico de Gestão Equina, Técnico de Produção Agropecuária ou Técnico de Jardinagem e Espaços Verdes. No editorial da edição de abril de 2016, lê-se: “Aqui fazemos da escola a vida e da vida a escola”. O jornal, que tal como o Jornaleco da n.º5 está aberto a toda a comunidade, é um reflexo dos valores e preocupações que surgem nesse cruzamento entre a escola e a vida. Segundo o texto de candidatura, os trabalhos são enviados através de formulário, “não revelando qualquer planeamento, nem intencionalidade”. Num ano viram duplicar a participação dos alunos, o número de páginas de cada edição e “a qualidade e diversidades dos trabalhos produzidos”.

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Neste grupo de Prémios Especiais, no qual o Prémio Incentivo se insere, mereceram também destaque BioHeitor, uma revista escolar de divulgação científica (Prémio Melhor Trabalho de Ciência); o jornal Face ao Douro, do Agrupamento de Escolas Diogo de Macedo, em Vila Nova de Gaia (Melhor Reportagem); ARTE ON, do Agrupamento de Escolas Vasco Santana, Odivelas (Prémio Melhor Design Gráfico); e a revista Ponto, da Escola Secundária José Saramago, Mafra (Melhor Trabalho de Cultura).

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Guillermo Vidal

O júri do Concurso Nacional de Jornais Escolares 2021/22 foi composto por Andreia Sanches (directora-adjunta do PÚBLICO), Helena Soares (designer e professora), Isabel Leite (Edulog-Fundação Belmiro de Azevedo), José Carlos Sousa (Direcção-Geral da Educação), Luísa Gonçalves (coordenadora do PÚBLICO na Escola) e Teresa Calçada (ex-comissária do Plano Nacional de Leitura). Os prémios serão entregues no dia 22 de novembro, no auditório da redacção do PÚBLICO em Lisboa.