Se dez deputados do PSD mudarem de opinião, as "barrigas de aluguer" chumbam
Sociais-democratas entregaram requerimento a pedir adiamento da votação das alterações à gestação de substituição. Deputados decidem esta tarde.
Bastará que apenas dez dos 24 deputados do PSD que em Maio votaram a favor da proposta do Bloco sobre a gestação de substituição mudem o seu sentido de voto para um 'não' para que o diploma chumbe esta tarde no Parlamento.
A direcção da bancada parlamentar do PSD pediu esta quarta-feira o adiamento da votação das alterações ao diploma da maternidade de substituição, conhecida como as “barrigas de aluguer, marcada para a sessão plenária desta manhã. Os sociais-democratas defendem que o tema é “relevante e complexo”, foi alvo de veto político e merece “maior ponderação em sede parlamentar”, e argumentam ainda que deu entrada uma petição a pedir um referendo sobre a matéria.
Perante o requerimento, o presidente da Assembleia da República decidiu mudar para o início da tarde a votação das alterações ao diploma que deviam ser feitas durante a manhã. Primeiro será votado o requerimento do PSD e só depois, se este for chumbado, serão votadas as alterações propostas pelo BE para responder às dúvidas expressas pelo Presidente da República quando vetou o diploma, em Junho. Na mensagem enviada ao Parlamento, Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que “não estão salvaguardados os direitos da criança a nascer e da mulher gestante, nem é feito o enquadramento adequado do contrato de gestação”.
O requerimento do PSD tem chumbo praticamente assegurado, já que as bancadas do PS, BE, PEV e o deputado do PAN somam 108 deputados, contra os 107 que somam o PSD e o CDS-PP. Há dúvidas, porém, sobre os dois deputados socialistas que votaram contra o diploma do BE em Maio podersão votar, agora, ao lado do PSD no requerimento pedindo um maior debate público sobre o assunto.
O Bloco de Esquerda, por seu turno, insiste na votação do seu diploma ainda hoje. Mas isso coloca em risco a sua aprovação: se 10 deputados do PSD que votaram a favor da gestação de substituição em Maio fizerem como promete Pedro Passos Coelho - mudar o sentido de voto para contra -, o diploma chumba.
Na votação final global, a 13 de Maio, o projecto de lei do BE foi aprovado pela bancada do PS (com dois votos contra), do BE e pelo voto a favor de 24 deputados do PSD, incluindo o próprio líder do partido. PCP e CDS votaram contra.
No debate desta quarta-feira, o Bloco argumentou que as alterações que propõe reforçam e clarificam os direitos da criança e da gestante e a estabilidade contratual, assim como prevêem situações em que possa ser necessário recurso à interrupção voluntária da gravidez ou casos de malformação do feto, e prazos para a revogação do consentimento. "Respondemos às questões suscitadas", defendeu Moisés Ferreira.
A socialista Isabel Moreira elogiou o "trabalho cuidado" do Bloco e o "triângulo jurídico fundamental de garantias entre beneficiários, gestante e feto", e confirmou o apoio do PS a um diploma que "retira barreiras jurídicas à realização de projectos de felicidade". Tal como a socialista, o deputado André Silva, do PAN, realçou a multiplicidade partidária que aprovou o diploma e manteve o seu voto a favor.
Da centrista Isabel Galriça Neto vieram críticas contra a "ligeireza" com que boa parte da esquerda avançou para a lei e contra o "experimentalismo social" que ela implica. "O útero da mulher não é uma incubadora e a mulher não pode ser instrumentalizada em nome de aspirações atendíveis [vontade de terem filhos] mas não propriamente um direito", afirmou a deputada. Considerando que as dúvidas e reservas do Presidente e do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida não são "devidamente enquadradas e respondidas", a deputada argumentou que "não é a existência de um contrato escrito que passa a assegurar a protecção dos direitos da criança nem a ausência do pagamento que torna este negócio jurídico, moral e socialmente aceitável, principalmente para a criança".
A deputada vincou que "os direitos dos adultos não se afirmam contra os direitos das crianças" e criticou a ausência de uma discussão "séria e ponderada" prévia sobre o assunto. Este foi precisamente o argumento usado pelo PSD no requerimento e pela deputada Ângela Guerra na intervenção esta manhã no plenário - apesar de ter sido uma das 24 pessoas do partido que votou, em Maio, ao lado do Bloco. Afirmou que a "discussão e a decisão não se devem eternizar", mas é preciso antes "abrir o debate a toda a sociedade portuguesa - um debate que deve e tem de ser feito".
Paula Santos reiterou as razões já usadas pelo PCP para votar contra o diploma em Maio e considerou que as alterações são "insuficientes" e não respondem à necessida de "ponderação" sobre, por exemplo, as "questões clínicas objectivas" para uma mulher beneficiar da gestação de substituição, os direitos e deveres da gestante durante a gravidez e no pós-parto, a revogação do consentimento durante a gravidez ou depois do nascimento, ou casos de malformações fetais e interrupção da gravidez.
E Heloísa Apolónia (PEV) defendeu que adiar a lei que permite a gestação de substituição "não é um bom serviço ao país" e em especial às famílias que não podem ter acesso à maternidade.
Passos insiste na Caixa
No final da reunião da bancada do PSD, o líder parlamentar não quis adiantar nada sobre as votações desta quarta-feira, preferindo fazer uma crítica ao Governo pela “instabilidade” que está a criar ao sistema bancário pela “cavalgada noticiosa” que está a promover sobre a Caixa Geral de Depósitos. “Queria instar o Governo a esclarecer os portugueses e sobretudo a não plantar de forma diária posições que não se percebem e que trazem incerteza ao sistema financeiro”, disse aos jornalistas Luís Montenegro. O social-democrata quis ainda responsabilizar os partidos que apoiam o Governo pela aprovação do próximo Orçamento de Estado. Os deputados do PSD seguiram depois para um jantar de fim de sessão legislativa que, ao contrário do que é hábito, foi fechado à comunicação social.