CGD aumenta pressão sobre Carlos Costa
Governador do Banco de Portugal esteve reunido com o Presidente da República e já sabe que esquerda lhe pede explicações. No Parlamento, o PSD promete avançar com a comissão de inquérito, mesmo contra a vontade dos socialistas.
Depois do BES, do Banif, da solução para os obrigacionistas séniores do Novo Banco, a pressão por causa da situação da Caixa Geral de Depósitos (CGD) está outra vez em Carlos Costa. O governador do Banco de Portugal esteve na tarde desta sexta-feira reunido com Marcelo Rebelo de Sousa, dois dias depois do anúncio do PSD de que vai impor uma comissão de inquérito à gestão da CGD sob a tutela de várias administrações e governos. Além disso, o PS vai pressionar o regulador bancário para ter mais respostas sobre o banco público.
O Presidente da República, que ainda nada disse sobre a iniciativa do PSD, que tem dividido políticos e comentadores, negou já à noite que o tema da recapitalização da CGD e a comissão de inquérito tenha estado na agenda do encontro, remetendo antes para a situação europeia: "Não. [A conversa] tem a ver com a situação económica e financeira europeia que realmente vai condicionar a situação portuguesa e que vai ser determinada, como imagina, por alguns votos a meio da semana que vem, no final da semana que vem". Mas no primeiro dia em que esteve em Lisboa após o anúncio do PSD, esteve com Carlos Costa num encontro fora da agenda pública.
Entretanto, na Assembleia da República poucos foram também os avanços públicos do dossier. Os sociais-democratas acabaram por não enviar ao BE (nem entregar no Parlamento) o texto com o objecto da comissão de inquérito, que querem acertar com os bloquistas. "O PSD está a ultimar o texto que tentará consensualizar com o BE, o único partido [à esquerda] que demonstrou disponibilidade para tal", justificou ontem o vice-presidente do grupo parlamentar, Hugo Soares, rementendo para o início da próxima semana o documento finalizado.
Mas entretanto, o partido de Catarina Martins tem uma proposta de auditoria forense à CGD em cima da mesa e está só à espera da resposta de António Costa, que no debate não se mostrou contra, para a pedir.
Por seu lado, Governo e PS vão fazer tudo para dissuadir os sociais-democratas da intenção de avançar com o inquérito parlamentar – o que se tem revelado infrutífero, uma vez que o PSD diz que vai mesmo avançar com a proposta potestativa –, ou, pelo menos, para retirar força à comissão de inquérito. E jogam em várias frentes. O PS vai pressionar o Banco de Portugal para ter respostas sobre a CGD, em especial para que o regulador "esclareça o que apurou na Caixa Geral de Depósitos e que intervenções fez", disse ao PÚBLICO o porta-voz do PS, João Galamba. E nos corredores do Parlamento, há quem ponha em cima da mesa a possibilidade de contrapor com uma comissão eventual ao sistema bancário, em vez de um inquérito. Ou seja, sem os poderes para-judiciais de que dispõe uma comissão de inquérito.
António Costa voltou a falar no assunto, na sexta-feira, para criticar o PSD e dizer que a CGD tem sido alvo de "várias auditorias", o que faz com que a realidade do banco público seja "conhecida e identificada pelas autoridades regulatórias". Contudo, sublinhou que a Comissão Europeia tem de fazer uma avaliação às reais necessidades de capital da CGD antes da recapitalização – isto depois de a TSF ter noticiado que a Comissão Europeia (CE) e o Banco Central Europeu preparavam uma auditoria ao banco público e de Bruxelas ter dito que apenas poderia fazer uma análise.
As negociações com Bruxelas estão assim a avançar, mas aos poucos, até porque a CE ainda tem de avaliar o valor de que a Caixa realmente precisa. “Para que a Comissão Europeia se possa pronunciar, tem de proceder a uma avaliação das necessidades efectivas de recapitalização da CGD. Bruxelas tem de verificar se a capitalização é adequada às necessidades ou é uma capitalização que, ultrapassando as necessidades efectivas da Caixa, pode configurar uma ajuda de Estado", disse Costa.
Em causa estão as três partes da recapitalização que o primeiro-ministro insiste em salientar: o valor que o banco público precisa para fazer face às normas regulatórias; o valor necessário para a restruturação e outra parcela para gerir os non performing loans (NPL’s, ou seja o crédito mal parado). E é aqui que se concentra a conversa com Bruxelas.
O Governo quer convencer as autoridades europeias para uma solução para o crédito malparado de toda a banca portuguesa, CGD incluída, o tal veículo financeiro para limpar o crédito malparado dos balanços dos bancos chamados de “banco mau”. Se as negociações chegarem a bom porto e houver uma solução para os NPL’s, o valor total que o Estado pode injectar na CGD pode vir a ser inferior aos quatro mil milhões de que falou Marques Mendes. Mas para isso, é preciso convencer Bruxelas. E o caminho ainda pode estar no início.
É pelo menos isso que diz o vice-presidente da CE, Valdis Dombrovskis, em entrevista ao PÚBLICO. Quando questionado sobre as negociações do plano de recapitalização e que impacto terá no défice público, Dombrovskis responde: “As discussões estão ainda numa fase muito inicial. Neste momento é a Direcção-Geral de Concorrência que está a lidar mais com o assunto. Eu diria que há ainda muito trabalho pela frente para as autoridades portuguesas detalharem os seus planos, antes que possamos fazer qualquer avaliação do impacto [da recapitalização] a nível orçamental” (ver página 23).
Apesar de António Costa ter dito na terça-feira que o assunto estava quase encerrado com Bruxelas, começam a surgir indícios que o fumo branco afinal pode ainda demorar.