Posição de Portugal sobre crise em Moçambique pode pôr em risco interesses dos empresários portugueses

Director do Centro de Integridade Pública pergunta-se como é que Marcelo Rebelo de Sousa e Luís Montenegro se mostram “dispostos a colaborar” com “um regime que mata cidadãos”.

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Marcelo Rebelo de Sousa com o Presidente cessante de Moçambique, Filipe Nyusi, em 2016 Miguel Manso
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A rapidez com que Portugal aceitou a decisão do Conselho Constitucional sobre as eleições de 9 de Outubro em Moçambique, prestando-se a trabalhar com o Presidente Daniel Chapo, ignorando a crise de legitimidade do poder e as muitas mortes da repressão policial contra manifestantes maioritariamente pacíficos, provocou indignação entre opositores e activistas.

Edson Cortez, director executivo do Centro de Integridade Pública (CIP), uma das mais importantes ONG moçambicanas, por exemplo, não entende como o primeiro-ministro, Luís Montenegro, e o Presidente, Marcelo Rebelo de Sousa, consideram a Frelimo e Chapo “vencedores legítimos” das eleições moçambicanas e se mostram “dispostos a colaborar” com “um regime que mata cidadãos”?!

“Queria ver se a PSP saísse à rua em Portugal e matasse mais de 200 portugueses, se achariam que as eleições também tinham sido justas, livres e legítimas?”, questiona Cortez. É, por isso, que “irrita bastante” ver Portugal “correr para ratificar e homologar” Chapo e a Frelimo. “Comportam-se como gangsters a proteger outros gangsters”, acrescenta.

Marcelo Rebelo de Sousa que, ainda por cima, mantém uma relação estreita com o país, de que o seu pai, Baltazar Rebelo de Sousa chegou a ser governador-geral no tempo do Estado Novo, desceu na consideração de alguns moçambicanos, ao agir como se “não percebesse patavina do que está acontecendo” no país.

Ao mesmo tempo, com a situação como está, em que as manifestações se têm vindo a radicalizar, à medida que a repressão policial se aprofunda, e se generalizam acções de saqueio e de vandalização de comércios e empresas, Cortez fala de uma possível consequência para essa decisão do Governo português: a de que os portugueses radicados em Moçambique possam tornar-se em alvos da ira dos manifestantes.

“Se os moçambicanos começarem a interpretar aquilo que o Governo de Portugal disse como sendo aquilo que os portugueses em Moçambique pensam, não sei até que ponto os interesses económicos dos pequenos e médios empresários portugueses não correm risco”, disse.

A posição portuguesa já tinha sido criticada por Venâncio Mondlane, mobilizador dos protestos pós-eleitorais que têm vindo a paralisar Moçambique desde 24 de Outubro. “É realmente lamentável que o primeiro-ministro e o Presidente da República portuguesa tenham feito pronunciamentos a confirmar ou a felicitar a Frelimo e o seu candidato em função de resultados altamente problemáticos, falaciosos e adulterados que foram proclamados pelo Conselho Constitucional”, disse o candidato presidencial da oposição, na sua conta do Facebook.

“É lamentável, um país que achávamos que podia ser a entrada de Moçambique para Europa, para que fossem nossos porta-vozes para alcançarmos uma situação de paz e passividade em relação à crise que Moçambique está a viver”, acrescentou Mondlane, citado pela Lusa.

“Concluído o processo eleitoral pelo Conselho Constitucional e designado Daniel Chapo como Presidente eleito de Moçambique, sublinhamos o propósito de que a transição que agora se inicia possa decorrer de forma pacífica e inclusiva, num espírito de diálogo democrático, capaz de responder aos desafios sociais, económicos e políticos do país”, escreveu Luís Montenegro na rede social X (antigo Twitter).

Enquanto Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota divulgada no site da presidência, assina pelo mesmo diapasão: “Reafirma a amizade fraternal entre os Estados e os povos de Portugal e de Moçambique, e a cooperação e a parceria em todos os domínios” e “saúda a intenção já manifestada de entendimento nacional e sublinha a importância do diálogo democrático entre todas as forças políticas, que deve constituir a base de resolução dos diferendos, no quadro e no reconhecimento das novas realidades na sociedade moçambicana e do respeito pela vontade popular”.

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