Quem eram os 50 arguidos no caso Gisèle Pelicot, condenados a penas entre 3 e 15 anos
Cinquenta homens foram acusados de fazerem parte do esquema de Dominique Pelicot, que drogava a ex-mulher e recrutava homens para a violar. Todos foram considerados culpados: de violação ou agressão.
Dominique Pelicot foi condenado a 20 anos de prisão, considerado culpado de todas as acusações relacionadas com a violação agravada da sua ex-mulher, Gisèle Pelicot, e ainda de tentativa de violação agravada da mulher do co-arguidos Jean Pierre Marechal e de ter recolhido imagens íntimas e sem consentimento da filha, Caroline, e das noras, Aurore e Céline. Cinquenta outros homens, identificados como agressores de Gisèle Pelicot, enquanto ela estava drogada, ouviram a deliberação de tribunal, sendo que 48 estavam acusados de violação, um de tentativa de violação e um de agressão sexual: todos foram considerados culpados e receberam como sentença penas que oscilam entre os três e os 15 anos.
Entre as penas mais pesadas está Marechal, sentenciado a 12 anos, já que estava a ser julgado pela violação da sua própria mulher, que também drogou; mas também aqueles que reincidiram no crime: Romain Vandevelde, um condutor de empilhadores de 63 anos, que visitou a casa Pelicot seis vezes e que sabia ser seropositivo, não tendo usado preservativo em nenhuma das ocasiões, foi condenado a uma pena de 15 anos de prisão; Charly Arbo, 30 anos, que também visitou a casa seis vezes e que chegou a ser filmado a conversar com Dominique sobre a possibilidade de drogar e violar a sua própria mãe, foi condenado a 13 anos.
Entre os 50 homens que Dominique Pelicot recrutou para violarem a mulher, alguns admitiram o crime, embora tenham ressalvado o facto de o terem feito “sem intenção”, tendo aproveitado o tempo em tribunal para pedirem desculpa a Gisèle Pelicot; outros afirmaram que acreditavam estar a participar num jogo sexual do casal e até que o consentimento do marido de Gisèle contrariava a ideia de violação, como Vandevelde e Arbo.
No entanto, os detalhes sobre os encontros, que eram filmados pelo marido, acabaram por tornar inadmissíveis as desculpas. Aos homens, foi relatado, era-lhes pedido que não usassem perfume, que se despissem antes de entrarem no quarto, que lavassem e aquecessem as mãos, que não deixassem qualquer marca na mulher — tudo para que não se corresse o risco de ela sair do estado quase comatoso e que suspeitasse de qualquer coisa após acordar.
O plano foi bem-sucedido durante nove anos. Gisèle Pelicot tinha frequentes “apagões” de memória, que a levaram a suspeitar de ter doença de Alzheimer, e vários problemas ginecológicos, aparentemente inexplicáveis — as análises, já após o esquema ter sido descoberto, em 2020, revelaram que padecia de quatro doenças sexualmente transmissíveis e que fora exposta ao HIV seis vezes. Até 2020, quando Dominique foi apanhado a filmar por baixo das saias de mulheres, com o seu telemóvel, num supermercado em Carpentas, uma cidade perto de Mazan, e a polícia ter descoberto os vídeos de Gisèle a ser violada.
Os agressores acusados, e agora condenados, incluem um enfermeiro, um jornalista, um guarda prisional, um soldado, camionistas e trabalhadores agrícolas. Alguns têm um passado violento, com condenações prévias, e vários relataram ter sido vítimas de violência durante a infância e adolescência, como Cyrille Delville, de 54 anos, que falou do pai alcoólico, que o esperava à porta da escola com um cutelo para o atacar. Depois de ter sido brutalmente espancado em público pelo seu pai à porta da escola, Cyrille foi colocado num centro de acolhimento, era adolescente.
Já Lionel Rodriguez, 44 anos, que também admitiu a violação e pediu desculpa a Gisèle, disse ao tribunal que tinha sido abusado sexualmente entre os 12 e os 13 anos pelo presidente do clube de petanca da sua aldeia, enquanto Fabien Sotton, 39 anos, contou ter sido abusado sexualmente pelo pai desde os 2 anos, tendo sido entregue a diferentes famílias de acolhimento, com mais violência e abusos; foi internado em cuidados psiquiátricos aos 16 anos, tendo, dos 18 aos 28, vivido na rua.
Outros, como o ex-bombeiro Jacques Cubeau, 72 anos, ou Husamettin Dogan, 43 anos, que tem o papel de cuidador de um filho deficiente, garantiram até ao fim que estavam certos de que se tratava de um jogo entre o casal ou ainda que não sabiam “o que era consentimento”, como alegou Joan Kawai, 26 anos, soldado das Forças Armadas francesas, que tinha 22 anos quando visitou a casa dos Pelicot.
Houve ainda quem se declarasse inocente, como Redouane El Farihi, de 55 anos, um antigo anestesista, que trabalhava na época como enfermeiro comunitário. “Declaro-me inocente”, disse, alegando que fora “vítima de uma armadilha” e que estava demasiado “aterrorizado” para contrariar a vontade de Dominique. Ou ainda quem pretendesse um encontro com Dominique e não com a sua mulher, caso de Patrick Aron, de 60 anos, que se apresentou como homossexual e queria ter um encontro com Dominique Pelicot e não com a sua mulher, que disse ter violado para agradar o homem; de Didier Sambuchi, 68 anos, que afirmou ter ido a casa de Dominique Pelicot “exclusivamente para ter um encontro homossexual” com ele; ou do jornalista freelancer Nicolas François, 42 anos, que declarou que a sua intenção era um encontro homossexual com Dominique, apesar das provas de vídeo o mostrarem na cama com Gisèle.
Entre todos, apenas dois não estavam acusados de violação, mas de agressão sexual ou tentativa de violação. O gerente de vendas Joseph Cocco, 69 anos, disse que, quando foi a casa dos Pelicot, estava presente outro homem, Vandevelde, e que apenas tinha “acariciado” Gisèle e que saiu após ouvir a mulher ressonar. Também o arguido Saifeddine Ghabi, 37 anos, um camionista, admitiu a “tentativa de violação”, mas acabou por ser condenado por agressão sexual.
Os 51 condenados e as penas
Dominique Pelicot, 72 anos, ex-marido de Gisèle Pelicot
Culpado de violação agravada da sua ex-mulher, Gisèle, da tentativa de violação agravada da mulher de um dos co-arguidos, Jean-Pierre Marechal, Cillia, e da recolha de imagens íntimas da sua filha, Caroline, e das suas noras, Aurore e Celine. Condenado a 20 anos de prisão.
Abdelali Dallal, 47, ex-carpinteiro
Culpado de violação agravada. Condenado a oito anos, mas sai em liberdade devido a problemas médicos e será colocado numa prisão especial, de acordo com o juiz.
Adrien Longeron, 34, antigo empreiteiro
Culpado de violação agravada e de posse de imagens de abuso de crianças. Condenado a seis anos de prisão.
Ahmed Tbarik, 54, canalizador e antigo campeão de boxe
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Andy Rodriguez, 37, trabalhador agrícola desempregado
Culpado de tentativa de violação, com factores agravantes; seis anos de prisão.
Boris Moulin, 37, trabalhou numa empresa de transportes em Avignon
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Cédric Grassot, 50, técnico de software
Culpado de violação agravada. Condenado a 12 anos.
Cendric Venzin, 44, antigo soldado da Legião Estrangeira Francesa
Culpado de violação agravada. Condenado a nove anos.
Cyprien Culieras, 43, ex-camionista
Culpado de violação agravada. Condenado a seis anos.
Charly Arbo, 30, trabalhador da vinha
Culpado de violação agravada. Condenado a 13 anos.
Christian Lescole, 56, bombeiro
Culpado de violação agravada e absolvido do crime de posse de imagens de abuso de menores. Condenado a nove anos de prisão.
Cyril Beaubis, 47, camionista
Culpado de violação agravada. Condenado a nove anos.
Cyrille Delville, 54, talhante
Culpado de violação agravada. Condenado a oito anos de prisão.
Didier Sambuchi, 68, ex-condutor de camiões
Culpado de violação agravada; cinco anos de prisão.
Dominique Davies, 45, condutor de camiões e antigo soldado
Culpado de violação agravada. Condenado a 13 anos.
Fabien Sotton, 39, profissão desconhecida
Culpado de violação agravada; 11 anos de prisão.
Florian Rocca, 32, motorista de entregas
Culpado de violação agravada. Condenado a sete anos.
Grégory Serviol, 31, pintor e decorador
Culpado de violação agravada. Condenado a oito anos de prisão.
Hassan Ouamou, 30, profissão desconhecida
Culpado de violação agravada e condenado a 12 anos de prisão, o arguido encontra-se em Marrocos; está emitido um mandado internacional de captura.
Hughes Malago, 39, ladrilhador
Culpado de tentativa de violação, com duas agravantes; condenado a cinco anos de prisão.
Husamettin Dogan, 43, cuidador do filho deficiente
Culpado de violação agravada; nove anos de prisão.
Jacques Cubeau, 72, ex-bombeiro
Culpado de violação agravada; cinco anos de prisão.
Jean Tirano, 52, ex-telhador
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Jean-Luc LA, 46, fabricante de espelhos
Culpado de violação agravada; dez anos de prisão.
Jean-Marc LeLoup, 74, ex-camionista
Culpado de violação agravada; seis anos de prisão.
Jean-Pierre Marechal, 63, ex-camionista
Culpado de tentativa de violação e violação agravada da sua mulher, bem como de a ter drogado. Condenado a 12 anos de prisão.
Jérôme Vilela, 46, ex-merceeiro
Culpado de violação agravada; 13 anos de prisão.
Joan Kawai, 26, soldado do Exército francês
Culpado de violação agravada; dez anos de prisão.
Joseph Cocco, 69, gestor de vendas reformado
Culpado de agressão sexual agravada; condenado a três anos de prisão.
Karim Sebaoui, 40, perito em informática
Culpado de violação agravada e de posse de imagens de abuso de crianças. Condenado a dez anos de prisão.
Lionel Rodriguez, 44, trabalhador de supermercado
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Ludovick Blemeur, 39, trabalhador de armazém
Culpado de violação agravada; sete anos de prisão.
Mahdi Daoudi, 36, trabalhador de transportes
Culpado de violação colectiva. Condenado a oito anos.
Mathieu Dartus, 53, ex-padeiro
Culpado de violação agravada. Condenado a sete anos.
Mohamed Rafaa, 70, antigo empregado de discoteca
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Nicolas François, 42, jornalista freelance
Culpado de violação agravada e de posse de imagens de abuso de crianças. Condenado a oito anos, tendo ficado proibido de trabalhar com crianças.
Nizar Hamida, 41, cabeleireiro
Culpado de violação agravada; dez anos de prisão.
Omar Douiri, 36, mecânico
Culpado de violação agravada. Condenado a oito anos de prisão.
Paul-Koikoi Grovogui, 31, pondera formar-se como pastor
Culpado de violação agravada. Condenado a oito anos de prisão.
Patrice Nicolle, 55, electricista
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Patrick Aron, 60, antigo operário fabril e proprietário de um clube de vídeo
Culpado de violação agravada. Condenado a seis anos, mas está em liberdade porque tem problemas de saúde e será colocado numa prisão especial, segundo o juiz.
Philippe Leleu, 62, jardineiro
Culpado de violação agravada; cinco anos, dois dos quais suspensos.
Quentin Hennebert, 34, guarda-prisional
Culpado de violação agravada; sete anos de prisão.
Redouane Azougagh, 40, desempregado
Culpado de violação agravada. Condenado a nove anos de prisão.
Redouane El Farihi, 55, enfermeiro e ex-anestesista
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Romain Vandevelde, 63, ex-condutor de empilhadores
Culpado de violação agravada; condenado a 15 anos de prisão.
Saifeddine Ghabi, 37, camionista de longo curso
Absolvido de violação e tentativa de violação. Culpado de agressão sexual; três anos de prisão.
Simoné Mekenese, 42, construtor
Culpado de violação agravada; nove anos de prisão.
Thierry Parisis, 54, ex-construtor
Culpado de violação agravada; oito anos de prisão.
Thierry Postat, 61, especialista em refrigeração
Culpado de violação colectiva agravada e de posse de pornografia infantil. Condenado a 12 anos e proibido de trabalhar com crianças para o resto da vida.
Vincent Coullet, 42, carpinteiro
Culpado de violação agravada; dez anos de prisão.