Ambiente de trabalho
Caro trabalhador, chegou a hora de pedir a reforma
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Caro leitor,
Provavelmente já se confrontou ou conhece alguém que se tenha deparado com alguma destas situações. No ano em que fez 60 anos, Margarida foi chamada aos recursos humanos da empresa onde trabalhava há mais de 30 e propuseram-lhe uma rescisão amigável com acesso ao subsídio de desemprego. Num primeiro momento sentiu-se ofendida - afinal achava que continuava perfeitamente capaz de continuar a desenvolver as suas funções -, mas perante a pressão acabou por aceitar. João estava a quatro anos da reforma quando a empresa onde fez toda a sua carreira lhe propôs deixar o cargo de responsabilidade que ocupava e ir para a pré-reforma. A partir dos 55 anos, Mário foi sendo sistematicamente preterido das acções de formação promovidas pela empresa.
Todos estes nomes são fictícios, mas os casos em concreto são bem reais e exemplificam aquilo que é o idadismo no mercado de trabalho.
Um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, baseado num inquérito a 1000 trabalhadores, mostra que, em Portugal, os trabalhadores são alvo discriminação etária e que ela é bi-direccional: "se, por um lado, os jovens são mais discriminados pelos trabalhadores mais velhos, é a população jovem que, por outro, perpetua estereótipos associados às gerações mais velhas", que consideram ter menor capacidade de adaptação, competências menos valiosas e pior desempenho.
Sendo um problema que afecta também os jovens, nesta newsletter vamo-nos concentrar nas práticas usadas pelas empresas para, de forma directa ou indirecta, incentivarem a saída antecipada dos trabalhadores mais velhos, ignorando competências e experiências acumuladas ao longo de uma vida.
Esta visão, nota Gustavo Sugahara, investigador do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa que tem feito trabalho na área do envelhecimento activo, é comum e muitas vezes encarada com naturalidade na sociedade. Além disso, as próprias políticas públicas dão sinais que podem incentivar estas práticas ou que são contraditórios.
Por um lado, há uma pressão crescente para que as pessoas continuem a trabalhar, através do aumento da idade da reforma para responder ao aumento da longevidade e às alterações demográficas. Por outro, "temos assistido a um aumento do desemprego entre as pessoas mais velhas e, ao mesmo tempo, não há uma preocupação em criar as condições para que as pessoas continuem a desenvolver a sua actividade", sublinha.
Num ambiente hostil ou pouco adaptado às suas necessidades, os próprios trabalhadores também se desligam ou desejam sair, embora muitas vezes tenham de continuar a trabalhar noutras actividades para compor o seu rendimento.
E isso é muito visível na actividade de Joana Carneiro, advogada especialista em direito do trabalho no escritório JPAB, que nota que muitos trabalhadores, a partir de uma determinada idade, começam a informa-se junto da Segurança Social para saberem de quanto tempo ainda têm de trabalhar até à reforma.
Um instrumento que tem sido muito utilizado pelas empresas são os acordos de revogação, que dão acesso ao subsídio de desemprego, assim como a revogação por motivos de requalificação técnica que obriga a que o trabalhador seja substituído por outro mais qualificado.
Joana Carneiro defende que, entre outras medidas, a lei laboral devia sofrer alterações para promover o emprego dos mais velhos. Embora a lei proíba a discriminação dos trabalhadores (conceito que proíbe que uma pessoa seja sujeita a tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável), não existe nenhuma norma específica relacionada com a idade.
E, destaca a especialista, "pior do que isso, as normas que temos no Código de Trabalho prevêem que, a partir do momento em que o trabalhador está reformado (e a empresa tem conhecimento disso) ou atinge os 70 anos, o contrato converte-se automaticamente em contrato a termo". Na função pública, a reforma é obrigatória aos 70, embora possa haver uma autorização especial para que o trabalhador possa manter a sua actividade.
"Era preciso que essas normas fossem alteradas e prever em legislação avulsa medidas e incentivos para que os empregadores tenham interesse em ter pessoas mais velhas a trabalhar", defende, dando como exemplo o acesso preferencial ao trabalho em part-time ou ao teletrabalho ou normas que evitem que o empregador o ponha a fazer turnos ou trabalho suplementar.
E embora considere que a contratação colectiva desempenha também um papel fundamental, Joana Carneiro entende que é também preciso pensar em incentivos para que as empresas adaptem os postos de trabalho a partir de uma determinada idade, colocando os trabalhadores mais experientes em papéis de coordenação de equipas ou de formação dos mais jovens.
"É preciso tornar o trabalho mais apelativo para os mais velhos e criar incentivos para que as empresas sintam que há vantagens em contratar pessoas mais velhas", resume.
Gustavo Sugahara deixa também algumas propostas para incentivar/manter a participação dos trabalhadores mais velhos no mercado de trabalho:
- Investir em políticas de promoção do contacto intergeracional, incluindo no local de trabalho;
- Apoiar mudanças de carreira e o desenvolvimento de funções de mentoria;
- Permitir que as pessoas possam continuar a trabalhar no ramo em que estão, se assim o desejarem, com adaptações;
- Valorizar a experiência.
O investigador lembra uma reflexão de Simone de Beauvoir que ilustra bem o papel da experiência no mundo do trabalho. Referindo-se às costureiras que continuavam a costurar muito bem até ao final da vida, a escritora francesa dizia que essas mulheres, apesar de já não verem bem, "têm o ofício na ponta dos dedos".
Sabia que…
O contrato dos trabalhadores que continuam no activo depois de se reformarem ou após os 70 anos converte-se automaticamente em contrato a termo? A regra está prevista no Código do Trabalho e determina que o contrato de um trabalhador que permaneça ao serviço decorridos 30 dias sobre o conhecimento, por ambas as partes, da sua reforma por velhice ou que atinja os 70 anos converte-se em "contrato a termo resolutivo".
De acordo com o artigo 348.º, e ao contrário do que determinam as regras gerais, o contrato não precisa de ser escrito; vigora por seis meses, renovados por períodos iguais sucessivos e sem limites máximos; e a sua caducidade (com aviso prévio de 60 dias por parte do empregador ou de 15 dias por parte do trabalhador) não determina o pagamento de qualquer compensação ao trabalhador.
Trabalho extra
Glovo anuncia contratação de todos os estafetas em Espanha
A plataforma digital Glovo anunciou que vai alterar o seu modelo de relações laborais em Espanha e contratar os estafetas como trabalhadores dependentes. De acordo com a imprensa espanhola, a decisão foi anunciada um dia antes de o responsável da empresa, Oscar Pierre, ir a tribunal na sequência de um processo laboral em que o Ministério Público acusa a Glovo de "suprimir" os direitos dos trabalhadores quando contrata falsos independentes.
A decisão tomada em Espanha não terá efeitos, pelo menos para já, em Portugal. Um porta-voz da empresa, citado pelo Jornal de Negócios, garantiu que a decisão anunciada em Espanha não vai afectar outros mercados, "nomeadamente Portugal", onde a questão tem estado a ser dirimida pelos tribunais.
Jogos e experiências ao ar livre estão a substituir os tradicionais almoços de Natal no Reino Unido
A tradicional festa de Natal no escritório, que no Reino Unido é muito associada ao consumo excessivo de álcool e à desinibição, está a passar por uma transformação. As normas no local de trabalho, o teletrabalho e uma maior consciência dos riscos legais associados a comportamentos inadequados durante estes eventos estão a levar as empresas a encontrar formas criativas de celebrar a época festiva com os seus trabalhadores.
O jornal The Guardian fala com várias empresas de organização de eventos e conclui que muitas entidades estão a optar por actividades de team-building, como caças ao tesouro, experiências de solução de mistérios, jogos, mini-golfe ou actividades ao ar livre, focadas na inclusão e no fortalecimento do espírito de equipa.
"Não é que [a festa de Natal no escritório] esteja morta, as pessoas exigem mais do que nunca das suas empresas", disse Francesca Hubbard, fundadora da Big Smoke Events, que tem como clientes a Meta (proprietária do Facebook), a Deloitte ou a Amazon.
Pensões mais baixas sobem 3,9% em 2025
O Governo assumiu finalmente qual será o aumento das pensões no próximo ano. Além do aumento normal, decorrente da fórmula automática, as pensões até 1567,5 euros terão um extra dado pelo Parlamento. A subida total vai oscilar entre 3,9%, para as pensões mais baixas, e 1,85% para as mais altas e, pela primeira vez, as pensões iniciadas em 2024 também serão abrangidas. Confirme aqui como vai subir a sua reforma, num guia prático que lhe permite perceber com o que contar a partir de Janeiro de 2025.