Magistrados: combate à corrupção depende da vontade real do poder político

Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público diz que magistrados do MP “são insuficientes” para dar a resposta necessária, pelo que fica comprometido um efectivo combate.

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Paulo Lona, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) Sérgio Azenha
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O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), Paulo Lona, considerou nesta segunda-feira que o combate à corrupção depende de vontade real do poder político para dotar esta magistratura e as polícias de meios.

Nas comemorações do Dia Internacional contra a Corrupção que, este ano, decorrem na Marinha Grande (Leiria), Paulo Lona afirmou que o combate efectivo à corrupção depende, "em primeiro lugar, de uma vontade real e efectiva do poder político que o leve a dotar o Ministério Público (MP), titular da acção penal, e as polícias dos meios" para o fazerem.

Além dos meios, esse combate depende, também, de "pequenas alterações, algumas legislativas, que agilizem o processo e eliminem entropias existentes".

Ao abordar a temática "Eficácia no combate à corrupção", Paulo Lona salientou que "o actual Governo colocou como prioridade o combate à corrupção", mas este exige um MP "institucionalmente independente e magistrados funcionalmente autónomos", e recursos materiais, humanos e tecnológicos.

Por outro lado, impõe "polícias, técnicos, peritos e magistrados especializados, que possam trabalhar em equipas multidisciplinares, por vezes em exclusividade de funções".

Contudo, os magistrados do MP "são insuficientes para dar a resposta que a sociedade e os cidadãos merecem", pelo que fica comprometido um efectivo combate, sustentou o dirigente do SMMP.

O problema dos recursos humanos estende-se à falta de oficiais de justiça, registando-se um "enorme e persistente défice de preenchimento dos quadros dos funcionários de justiça nos serviços do MP", faltando "mais de 500".

Paulo Lona advertiu ainda que, "sem polícias especializados que no terreno, em tempo útil, realizem as diligências de recolha de prova necessárias, é fácil comprometer o sucesso de qualquer investigação", defendendo, entre outros aspectos, o reforço de meios para a Polícia Judiciária e Inspecção-Geral das Finanças, ou o aumento de magistrados nos tribunais administrativos e fiscais, para "garantir a celeridade em decisões com impacto económico-financeiro".

Após elencar também necessidades ao nível dos recursos materiais e tecnológicos, o dirigente do SMMP lembrou que a autonomia financeira do MP é uma recomendação europeia, mas o Estado "continua a fazer depender os meios necessários para o exercício das [suas] funções" das opções políticas do Ministério da Justiça.

"Isto compromete a autonomia financeira e, consequentemente, a independência do MP", declarou o presidente do SMMP.

Paulo Lona enumerou depois algumas alterações, que "podem tornar mais eficiente o combate à corrupção", enviadas à tutela e grupos parlamentares.

Entre as sugestões está a possibilidade de conferir o acesso do MP aos contribuintes da Autoridade Tributária, o acesso à central de responsabilidade de créditos e contratos de seguro, acesso às bases de dados do Banco de Portugal e acesso irrestrito ao Portal Base.

A concentração da legislação relativa à criminalidade económico-financeira e a revisão do regime da instrução, para evitar que se torne num pré-julgamento, "arrastando os processos para além do razoável e necessário ao exercício do direito de defesa", estão entre as propostas.

Outros aspectos passam pela consagração de um regime que permita a aplicação de uma taxa de justiça similar àquela que é aplicada pelo Tribunal Constitucional às situações de requerimentos, incidentes e recursos efectuados com intenção manifestamente dilatória, e a criminalização do enriquecimento ilícito, enumerou.

Ao nível da prevenção, Paulo Lona defendeu a "incorporação de um módulo específico sobre os efeitos nefastos da corrupção na disciplina de educação cívica no sistema de ensino", assim como a "definição de um apertado regime de incompatibilidades para os titulares de cargos públicos" e a regulamentação da actividade de "lobbying".

Paulo Lona apontou, igualmente, a regulamentação, de "forma geral e absoluta", em todos os sectores, "da questão dos presentes e ofertas", e das "transições entre cargos públicos e sector privado, bem como associações, fundações e similares".

"Continua a faltar o essencial, isto é o real, sério e efectivo investimento nos meios humanos, materiais e tecnológicos necessários, sem o qual tudo o resto é escasso e insuficiente", acrescentou o presidente do SMMP.