Em minutos, programa de IA prevê melhor o tempo do que sistemas convencionais
Através da aprendizagem matemática e usando 40 anos de dados meteorológicos reais, o programa GenCast conseguiu obter resultados melhores do que os do Centro Europeu de Previsão Meteorológica.
A inteligência artificial continua a dar cartas na área da ciência. Desta vez, um programa de previsão meteorológica chamado GenCast mostrou que consegue produzir previsões de variáveis atmosféricas com mais precisão do que o Centro Europeu de Previsão Meteorológica a Médio Prazo (CEPMMP) em 97,2% das vezes. O trabalho foi publicado esta quarta-feira na revista Nature.
“Este trabalho ajuda a abrir o próximo capítulo na previsão meteorológica operacional, em que decisões cruciais, dependentes da meteorologia, são feitas com mais eficiência e exactidão”, lê-se no sumário do artigo, assinado por Ilan Price, da DeepMind Technologies Limited, uma empresa subsidiária do Google dedicada à investigação na área da inteligência artificial, e outros autores. O avanço pode vir a ser particularmente importante para fenómenos extremos, como os furacões.
Nos últimos anos, a inteligência artificial tem entrado no mundo da previsão meteorológica. Até agora, as previsões são feitas a partir de modelos matemáticos que tentam traduzir as leis da física que regem a hidrodinâmica da atmosfera, que produz chuvas num território e céu aberto no território ao lado. Para isso, centros como o CEPMMP usam supercomputadores e informação obtida por satélites e estações meteorológicas.
“A execução destes modelos em supercomputadores só é possível através de códigos informáticos de grande complexidade que fornecem previsões para diferentes variáveis atmosféricas, tais como a temperatura, a pressão atmosférica, o vento, a precipitação”, explica-se no site do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, que dá o nome a esta técnica de “previsão numérica do tempo”.
Com isso, estes supercomputadores vão produzindo previsões que, além dos 15 dias, deixam de ter uma capacidade preditiva eficaz, que não consegue contemplar toda a complexidade dos fenómenos que influenciam o estado do tempo. De qualquer forma, estas previsões feitas pelo CEPMMP usam “uma série de previsões que representam a gama de possibilidades da meteorologia futura”, que “produz uma gama de possíveis condições meteorológicas”, adianta o CEPMMP.
Em inglês, esta técnica chama-se “ensemble weather forecast (EWF)”, algo como “previsão meteorológica de conjunto”, e permite lançar previsões com probabilidades para a precipitação e outras variáveis atmosféricas. Este trabalho, apesar de contar com supercomputadores, ainda demora horas a produzir uma previsão.
Quarenta anos de dados
O novo programa da Google DeepMind faz algo semelhante e produz uma previsão a partir de probabilidades, o que é um passo à frente do anterior programa de inteligência artificial de previsão meteorológica, que oferecia uma única previsão para uma localidade e para um momento.
O GenCast usa aprendizagem automática e foi treinado a partir de 40 anos de dados meteorológicos verdadeiros, entre 1979 e 2018. Isto permitiu ao programa identificar as complexidades e as relações dos fenómenos que determinam as condições meteorológicas e inserir isso nas suas previsões para 2019. O resultado é uma previsão global a cada 12 horas para os 15 dias seguintes, para 80 variáveis atmosféricas e de superfície, na grande maioria das vezes superior ao CEPMMP. Tudo em apenas oito minutos.
“Superar o desempenho do CEPMMP marca uma espécie de ponto de inflexão no avanço da inteligência artificial para a previsão meteorológica”, diz Ilan Price, citado pelo jornal britânico The Guardian. “Pelo menos a curto prazo, estes modelos vão acompanhar e estar lado a lado nas abordagens tradicionais actualmente existentes.”
A Google DeepMind vai permitir que os investigadores tenham acesso ao programa e às suas previsões.