Moções de censura votadas na quarta-feira abrem conflito político em França
Governo, esquerda e extrema-direita trocam acusações no hemiciclo e pela imprensa perante a ameaça iminente da queda do executivo de Michel Barnier.
O conflito político entre o Governo e os partidos da oposição acentuou-se depois da apresentação de duas moções de censura, da extrema-direita da União Nacional e da França Insubmissa, apoiada pelos grupos parlamentares de esquerda que formam a Nova Frente Popular. Ambas serão discutidas e votadas nesta quarta-feira a partir das 15h (hora em Portugal continental), segundo a FranceInfo.
Nesta segunda-feira, segundo fontes da comitiva do primeiro-ministro Michel Barnier, citadas pela FranceInfo, a União Nacional recusou encontrar-se por três vezes com Barnier na residência oficial, o Hotel Matignon, antes de accionar o mecanismo do artigo 49.º n.º3 da Constituição. Em resposta, fontes da comitiva de Marine le Pen, citadas pela FranceInfo, negaram os relatos “formalmente”.
Michel Barnier, na Assembleia Nacional, chamou à atenção para os possíveis efeitos que a moção de censura, que será discutida e votada nesta quarta-feira, pode ter. Perante uma situação orçamental “difícil”, Barnier avisou que “a [moção de] censura tornará tudo mais difícil e mais grave”.
“Disse-o desde o início, tentando dizer a verdade aos franceses. É mais grave do que pensávamos, com uma dívida que todos terão de pagar um dia”, conta Barnier.
Bruno Retailleau, ministro do Interior citado pelo Le Monde, acusou a União Nacional de “aceitar misturar os seus votos (...) com os da extrema-esquerda”, chamando-lhe “patético”.
“Amanhã, algumas pessoas, em ambos os extremos do espectro, preparam-se para jogar à roleta-russa com o destino da França e do povo francês”, acrescentou Retailleau.
"Captura do poder"
“Infelizmente, censurar este orçamento é a única forma que a Constituição nos permite para proteger o povo francês de um orçamento perigoso, injusto e punitivo”, justificou, por seu lado, Marine le Pen. Para Jean-Phillipe Tanguy, deputado da União Nacional, aprovar a moção de censura era o “dever” do partido.
“Não vamos continuar a confiar os cordões da bolsa de França a pessoas que são incapazes de gerir as finanças do país”, acusou ainda Tanguy, à televisão Europe1.
À esquerda, as palavras mais fortes vieram da França Insubmissa. Mathilde Panot, líder do grupo parlamentar do partido, aquando do anúncio de que o partido iria apresentar uma moção de censura ao Governo, disse que a utilização do mecanismo do artigo 49.º n.º3 era “uma captura de poder a mais por parte de um governo ilegítimo” e avisou: “Macron será o próximo."
A destituição do Presidente francês, Emmanuel Macron, é uma intenção dos “insubmissos” desde que Macron demorou quase dois meses entre a segunda volta das legislativas, a 7 de Julho, e nomear Barnier, a 5 de Setembro, e pelo Presidente francês se ter recusado a nomear a candidata da Nova Frente Popular, Lucie Castets, depois da aliança da esquerda ter vencido a segunda volta.
Já Olivier Faure, líder do Partido Socialista, foi mais contido do que a França Insubmissa, tendo ainda assim acusado Barnier de ter fechado a porta aos socialistas e aberto as negociações somente à extrema-direita numa entrevista à France 2.
“Tentámos, durante dois meses, negociar com o primeiro-ministro, mas ele só se dirigiu a Marine le Pen. Foi a única pessoa com quem dialogou. No final, não conseguiu, mas a verdade é que nunca tentou falar connosco. Reconheceu-se prisioneiro da sua base comum e, por isso, incapaz de fazer o mínimo gesto na nossa direcção”, acusou Faure, que apelou a Macron que nomeasse alguém de esquerda para liderar o Governo e que seja “aberto ao bloco central”.
“É o chefe de Estado que nomeia o primeiro-ministro, mas eu digo-lhe simplesmente para nomear um primeiro-ministro de esquerda: a frente popular no Governo e a frente republicana na Assembleia, é assim que podemos progredir”, acrescentou.