Cerca de 80 denúncias de assédio no jazz português recebidas em poucos dias

Após acusação de violação contra o pianista João Pedro Coelho, que reclama “total inocência”, email de partilha de casos obteve queixas contra este e outros músicos.

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Estão identificadas 79 queixas, relativas a 18 pessoas sobretudo do meio musical, de crimes que vão do assédio sexual de menores à violação Miguel Manso
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A acusação de violação da DJ Liliana Cunha contra o pianista João Pedro Coelho e a respectiva abertura de canais de denúncia via email levou já à identificação de 79 queixas, relativas a 18 pessoas sobretudo do meio musical, de crimes que vão do assédio sexual de menores à violação, passando pelo stalking (perseguição) e stealthing (a não utilização de preservativo sem consentimento do/a parceiro/a). Destas, há queixas formalizadas no Ministério Público ou na Polícia Judiciária contra três nomes.

Estes são os primeiros números sistematizados, filtrados e confirmados pelas pessoas responsáveis pela recepção e gestão da informação partilhada pelo email testemunhasdamusica@proton.me após a divulgação pública do caso de Liliana Cunha, nome artístico Tágide, música que acusa o pianista e professor João Pedro Coelho de violação e stealthing, alegadamente cometida em 2023. A sua partilha do caso nas redes sociais, inicialmente sem identificar o alegado agressor senão pelo primeiro nome, desencadeou uma vaga de queixas e partilhas de jovens e mulheres que disseram, no fundo, #MeToo em português, e mais especificamente no jazz.

A lista, que o PÚBLICO consultou, é dominada por queixas relativas a João Pedro Coelho (50) e que envolvem, além de violação, assédio a menores e stalking (perseguição, neste caso sobretudo via digital, insistente e indesejada). O pianista nega ter cometido “factos, de cariz sexual”, como comunicou por escrito via Instagram na semana passada, dizendo que a acusação é “falsidade” e reclamando a sua “total inocência”. Liliana Cunha apresentou queixa à PSP e o caso seguiu para o Ministério Público, apesar de ter prescrito o prazo de denúncia de violação (um ano); porém, há outras vias legais para um potencial caso. O jazz é também a área de onde é oriunda a maior parte das queixas — o facto de a queixa da DJ, que não tem ligação com o meio do jazz nem foi aluna de Coelho, ter incidido sobre o pianista de 31 anos ajudará a explicar a prevalência tanto do seu nome quanto do sector visado.

O segundo nome mais focado (cinco acusações, entre assédio e agressão sexual) é o de um dos professores afastados da escola do Hot Clube, conceituado espaço do sector em Lisboa, no ano lectivo de 2021/2022.

A esmagadora maioria dos casos envolve assédio sexual, seguidos da violação e agressão sexual. Entre os nomes dados a conhecer pelas alegadas vítimas à rede que se construiu informalmente após a crescente notoriedade do caso de Liliana Cunha, há ainda profissionais de outras expressões musicais, bem como do cinema e televisão. As pessoas que recorreram ao email, criado depois de as contas nas redes sociais de Liliana Cunha e outras mulheres terem sido inundadas de mensagens, também relatam situações de abuso de poder. O PÚBLICO sabe que as denúncias recolhidas dizem respeito a alegados actos que terão tido como cenário instituições de ensino ou contactos através das redes sociais, e que abarcam um período de pelo menos cinco anos e situações recentes. Estes dados não incluem ainda as denúncias chegadas à mesma rede informal através das redes sociais.

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Na sexta-feira, o PÚBLICO contactou a Escola Superior de Música de Lisboa, que funciona no âmbito do Instituto Politécnico de Lisboa, cujo canal de denúncia funciona "numa plataforma informática, que permite fazer a gestão do mesmo, de modo a garantir o cumprimento do Regime Geral de Protecção de Denunciantes", segundo o instituto, e que foi instituído apenas em Setembro de 2023 — há pouco mais de um ano. Já no Hot Clube, onde João Pedro Coelho foi professor até ao ano lectivo de 2022/2023 e de onde, segundo o actual director, saiu sem que tenham sido formalizadas queixas contra si, existe desde Setembro de 2022 um canal de denúncia anónimo que, como ditam as melhores práticas de combate ao assédio, não está sob alçada da direcção pedagógica nem do conselho directivo do clube.

O Conservatório Nacional — Escola Artística de Música tem outro procedimento, que pode passar pelo provedor do aluno mas que como instituição pública de ensino segue as recomendações de que qualquer queixa deste foro seja feita directamente ao director do estabelecimento de ensino, que por seu turno tem a obrigação de a encaminhar para as autoridades.

As três instituições disseram ao PÚBLICO que não tinham recebido até à data quaisquer queixas de assédio através destas vias.

Notícia corrigida às 10h06: o canal de denúncias do IPL não funciona através do provedor do estudante mas sim numa plataforma informática própria.

Notícia corrigida às 11h55: O canal de denúncias no Hot Clube tem um canal próprio e não está sob alçada do conselho pedagógico nem do conselho directivo do clube.

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