Tribunal rejeita nomear curador de Ricardo Salgado no julgamento do BES

Defesa do ex-líder do BES reafirma que o antigo banqueiro “está incapaz” e insiste numa nova perícia neurológica agora.

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Salgado foi ao primeiro dia do julgamento, a 15 de Outubro, tendo sido dispensado de voltar a comparecer Daniel Rocha
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O colectivo de juízes que está a apreciar o processo BES/GES rejeitou um pedido de alguns dos assistentes do processo para que fosse nomeado um curador “especial ou provisório” para Ricardo Salgado, arguido a quem foi diagnosticada doença de Alzheimer, já confirmada por duas perícias do Instituto Nacional de Medicina Legal (IML) no âmbito de outros processos.

Num despacho emitido na segunda-feira, a juíza que preside ao colectivo, Helena Susano, indefere os requerimentos argumentando que a lei processual penal não admite que um curador preste “declarações no lugar do arguido ou que o substitua no exercício da defesa em termos que a representação técnica” pelos advogados não seja capaz de assegurar.

A decisão coincide com a posição assumida pelos próprios mandatários de Ricardo Salgado. Notando isso mesmo, que os “defensores do arguido” se opunham à designação do curador, a juíza refere que, por um lado, a indicação dessa figura se destina a “suprir a incapacidade judiciária de quem não tenha representante nomeado” (um advogado), o que aqui não se coloca; e, por outro, não serve para “substituir-se ao arguido naquilo que são os direitos que a lei lhe reserva pessoalmente”.

“Nem o pressuposto processual da capacidade judiciária nem as formas de suprimento da incapacidade judiciária em processo civil se harmonizam com o processo penal, resultando manifesto que a nomeação de curador especial ou provisório ao arguido Ricardo Salgado se constituiria como uma solução jurídica contra legem [contra a lei]”, conclui a juíza, no despacho a que o PÚBLICO teve acesso.

O Ministério Público também pugnava pelo indeferimento, sustentando que Ricardo Salgado subscreveu uma procuração aos seus advogados quando “não se colocava uma situação de anomalia psíquica”, antes de lhe ser diagnosticada a doença de Alzheimer.

À saída do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa​, onde nesta terça-feira continua a decorrer o julgamento à queda do BES, o advogado de Salgado, Francisco Proença de Carvalho, manteve que seria um “absurdo” apontar alguém para assumir esse papel.

“Como é que um curador poderia substituir o doutor Ricardo Salgado a prestar declarações e a explicar as coisas? É impossível”, reagiu aos jornalistas, aproveitando para frisar que Salgado “está incapaz, como o próprio tribunal reconhece”, e que a sua incapacidade se mantém “totalmente” para compreender e discutir factos em julgamento.

Os mandatários do antigo banqueiro continuam a pugnar para que haja uma nova perícia neurológica, para se aferir o estádio da doença de Alzheimer. O tribunal aceitou a realização de uma nova perícia, embora remetendo-a para um “momento oportuno.”

Para a defesa, cabe ao tribunal explicar o que quer dizer com isso. Questionado se poderá significar que a perícia ocorrerá apenas quando houver uma definição da pena, o mandatário diz que não consegue “interpretar isso” na decisão do tribunal.

Questionado de que forma a decisão do tribunal em rejeitar a indicação de um curador em tribunal afecta a intenção da defesa de ir para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) contestar a continuidade de se julgar Salgado nestas condições, Proença de Carvalho garante que “não afecta nada” esse objectivo.

“Existe jurisprudência que nos dá total razão, se o Estado português insistir neste caminho... E vamos continuar a batalhar serenamente”, disse, acrescentando que a defesa está “há muito tempo” a apelar a que se evite que “o Estado português seja humilhantemente condenado por violação dos direitos humanos já foi várias vezes infelizmente.”

Para a defesa, “se a doença do doutor Ricardo Salgado continuar a ser ignorada da maneira que está a ser ignorada, e face à jurisprudência que existe no TEDH”, não há dúvidas de que Portugal sairá condenado. “Uma pessoa nestas condições, que não se pode defender, que não pode entender confessar, negar os factos — o que quer que seja — sobre a matéria que está em causa, não pode ser julgada da forma em que está a ser julgada”, disse.

O antigo líder do BES esteve presente no primeiro dia do julgamento, a 15 de Outubro, durante alguns minutos, foi identificado pelo tribunal e ficou dispensado de estar presente no resto do julgamento. O banqueiro responde por 62 crimes, por actos alegadamente praticados entre 2009 e 2014. No rol de imputações estão associação criminosa, corrupção activa no sector privado, burla qualificada, manipulação de mercado e branqueamento de capitais.

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