Efacec: “Nenhum dos objectivos da nacionalização foi alcançado”

A reprivatização já custou aos cofres públicos 484 milhões de euros e poderá custar mais 80 milhões. Tribunal de Contas concluiu pela “não salvaguarda” das finanças públicas neste processo.

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Pedro Siza Vieira, o antigo ministro da Economia, Nuno Ferreira Santos
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A Efacec foi nacionalizada pelo Estado no Verão de 2020, na sequência do arresto preventivo dos bens da filha do ex-Presidente de Angola, Isabel dos Santos, que detinha uma participação indirecta de 71,73% na empresa de engenharia e tecnologia.

Quatro anos depois, o Tribunal de Contas vem dizer que “nenhum dos objectivos da nacionalização foi alcançado” e que, até Maio, a reprivatização custou aos cofres públicos 484 milhões de euros: 445 milhões de euros suportados pela Parpública, 35 milhões de euros suportados pelo Banco de Fomento e outros quatro milhões gastos com avaliações e assessorias do processo. O risco é o de que o valor suba até aos 564 milhões de euros, devido às responsabilidades contingentes assumidas pelo Estado, no montante de 80 milhões de euros.

“A nacionalização da Efacec foi realizada sem fundamentação, técnica e independente, do interesse público invocado [para a justificar], lê-se no relatório de auditoria, divulgado esta segunda-feira.

Já sob a condução do ministro António Costa Silva, o Estado vendeu a totalidade da Efacec ao fundo de investimento alemão Mutares, que injectou 15 milhões de euros em capital, providenciado garantias para empréstimos no valor de 60 milhões de euros.

Embora o Tribunal de Contas admita que a Parpública poderá hipoteticamente recuperar algum dinheiro com uma eventual venda (“A venda em cinco anos, projectada pela Mutares, mas dependente do sucesso desse projecto, prevê o retorno de 385 milhões de euros para a Parpública e de 178 milhões de euros para a Mutares (que 'gastou' 15 milhões)”, a entidade garante que o Estado se apropriou da empresa “sem validar as alegações da sua administração: empresa estratégica nacional, viável e economicamente sustentável, em situação de dificuldade provisória”.

Tão-pouco fez acompanhar a decisão de nacionalização de uma análise de impacto nas finanças públicas, “como deveria em desfavor do direito dos contribuintes a essa transparência”, refere o relatório.

O diploma que ditou a nacionalização da Efacec foi aprovado a 2 de Julho de 2020 em Conselho de Ministros e, na conferência de imprensa que se seguiu à reunião, o então ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, salientou a importância de uma empresa “centenária, com reputação e experiência de excelência na engenharia portuguesa” e exportadora. Invocou o interesse público para “resolver o impasse accionista” da empresa e a necessidade de assegurar um futuro à Efacec, garantindo haver interessados na sua reprivatização.

Mas a análise do Tribunal de Contas é taxativa: “Não foi evitada a deterioração da situação financeira e comercial da Efacec, não foi estabilizado o seu valor financeiro e operacional e não foram salvaguardados os postos de trabalho.” A passagem da empresa para a esfera pública “não regularizou a relação com os bancos financiadores, não evitou a entrada em falência técnica e, até 2022, quase um quarto dos trabalhadores tinha deixado a empresa”.

A instituição até agora presidida por José Tavares (Filipa Calvão tomará posse como presidente a 12 de Outubro) concluiu assim pela “não salvaguarda” das finanças públicas neste processo que sintetiza da seguinte forma: “O financiamento da Efacec até reprivatização (203 milhões de euros em empréstimos accionistas e 101 milhões de euros em garantias públicas) foi o solicitado pela empresa, sem apreciação técnica da Parpública que validasse a sua razoabilidade.”

Da dívida da Efacec, num total de 394 milhões, 87% do montante (ou seja, 345 milhões) foi incluído na pré-capitalização e no financiamento público. As instituições de crédito e os obrigacionistas perdoaram 35 milhões de euros (ou 9%) e apenas uma quantia de 15 milhões (ou 4%) foi reembolsada pela Mutares, em forma de capitalização da empresa.

A auditoria pedida pela Assembleia da República também deixa evidente a forma como os antigos accionistas privados – a sociedade MGI, partilhada pelos grupos José de Mello e Têxteis Manuel Gonçalves – não acompanharam o Estado nem nos apoios financeiros à empresa, nem nos custos relacionados com o processo de venda.

Acresce a isto o facto de existir “o risco material de as suas [da MGI] responsabilidades contingentes perante a empresa serem ressarcidas pelo Estado”, nos termos do contrato que foi assinado com a Mutares, que se tornou a única accionista em Outubro do ano passado.

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