Disseram a Konate que não podia ser um Ronaldo. E ele confiou

O agora central do Liverpool queria ser como Ronaldo, mas acabou a ser mais como Thuram. E passou das “jaulas” de Paris aos relvados bonitos da Champions, com ajuda preciosa do Dragon Ball.

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Konate celebra pelo Liverpool Phil Noble / REUTERS
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Caro Ibrahima, vá lá para trás, que aqui à frente é só para craques. Foi algo como isto que disseram a Ibrahima Konate, defesa do Liverpool, quando ele começou a jogar futebol.

Ele queria ser avançado e estudou vídeos de Ronaldo – o brasileiro – no Youtube durante horas a fio, para poder replicar tudo aquilo com a bola nos pés. Mas quando foi fazer provas ao Paris FC – não confundir com Paris Saint-Germain – mandaram-no para o meio-campo. E nem era a oferecer golos, mas a evitá-los, como um 6 que destruía jogo alheio. Ele não achou piada, como já chegou a contar, mas acabou por ir ainda mais para trás, para central.

Serve esta história para contar que o percurso de Ibrahima Konate foi tudo menos linear. E quando começou a jogar futebol, em Paris, não era suposto ter chegado ao patamar de jogador que marca golos na Liga inglesa – como o que marcou neste sábado, ajudando o Liverpool a bater o Wolverhampton por 2-1.

O central francês não estava, em teoria, na rota para este destino. Até aos 11 anos, jogava nas tradicionais jaulas de Paris, com campos de piso duro e vedações metálicas a toda a volta.

“Não podíamos ver futebol em estádios, porque não tínhamos dinheiro. E não podíamos jogar em relvados, porque não tínhamos essa oportunidade. Fazíamos bolas de papel e fita na escola e jogávamos nas ruas, nem que fosse com bolas de plásticos ou esponja”, chegou a contar o jogador, citado pelo The Athletic.

Não é assim tão comum um jogador de topo entrar num clube apenas aos 11 anos, mas Konate teve de esperar por essa idade, até porque “acordou” para o futebol bastante tarde – gostava era do famoso frisbee, não da bola.

Começou a jogar no Paris FC, no tal sítio onde recebeu a notícia de que não iria ser um Ronaldo, e acabou por ir parar ao Sochaux, embora não tenha sido tido em especial consideração – foi deixado na equipa B quando subiu a sénior. Depois, com ajuda do RB Leipzig, tudo mudou.

É curioso que nos 13 jogos que fez pelo Sochaux como sénior teve apenas um triunfo – e foi numa partida na qual o adversário jogou meia hora com dez jogadores. Quer isto dizer que o Sochaux parecia tudo menos um viveiro de talento pronto a ser desbravado pelos caça-talentos – como os do Leipzig.

Mas os alemães viram ali coisas. Viram, no lado futebolístico, um defesa alto, rápido e com uma razoável capacidade na construção. E viram também, a título pessoal, a forma como os pais de Konate e o próprio jogador encaravam os planos para o futuro.

Já tinham sido as boas instalações escolares a convencerem os pais do jogador quando ele foi para o Sochaux e falavam, nesta fase pré-Leipzig, de exigirem formação académica aos oito filhos. E Konaté cumpriu-o em pouco tempo: em Leipzig, apressou-se a conseguir o certificado que lhe dava não apenas a conclusão do ensino secundário, mas também o acesso ao ensino superior. Se o futebol não der, ele tem algo a que se agarrar – tal como os pais queriam.

Mas o futebol deu. O rapaz que queria ser um Ronaldo acabou por se tornar mais um Desailly, um Thuram, um Blanc ou um Varane. Quando os alemães o contrataram já sabiam que estavam a contratar um central e não um médio-defensivo. A ideia era terem-no a fazer dupla com o também francês Upamecano e o plano saiu na perfeição.

Desenvolveram-se mutuamente em Leipzig e conseguiram grandes transferências: um no Liverpool, outro no Bayern. Além disso, o conhecimento mútuo e as rotinas juntos permitiram a Didier Deschamps aproveitar essa dupla na selecção francesa.

Jurgen Klopp preferiu Konate para o seu Liverpool e o jogador tem sido importante. Mas não decisivo – assistiu in loco à derrota francesa na final do Mundial 2022 e do Liverpool na final da Liga dos Campeões.

Talvez ande a ver poucos desenhos animados japoneses. “Os meus colegas dizem-me que sou demasiado velho para isso, mas eles não entendem que não é apenas prazer visual. O Vegeta, do Dragon Ball, é uma personagem temperamental, mas mostra uma mentalidade de trabalhar para ser o melhor. Às vezes, no treino, penso nele. E antes de alguns jogos ponho cenas de batalha do Dragon Ball que me dão inspiração”.

Provavelmente, não houve Dragon Ball antes das finais de Lusail e Saint-Denis.

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