São excelentes temas para televisão, mas as vidas reais, perspectivas e ambições dos “miúdos super-ricos” estão muitas vezes longe da mira do público. Para sabermos mais sobre eles, entrevistámos alunos de um dos colégios com ensino secundário mais caros do mundo, onde as propinas anuais ascendem a 120.000 francos suíços (cerca de 125.000 euros) — e voltámos a acompanhá-los cinco anos mais tarde.
Começámos a nossa investigação quando estes jovens estavam a estudar juntos nos Alpes suíços, observando-os e entrevistando-os durante 15 meses. Fizemos perguntas sobre os seus contextos, as suas opiniões sobre o ambiente escolar e os seus planos para o futuro. Cinco anos mais tarde, perguntámos-lhes o que tinha acontecido desde que se formaram, sobre a sua vida quotidiana e as suas ambições. Nessa altura, a maioria tinha terminado os seus estudos universitários e estava a iniciar a sua carreira.
As nossas conclusões, que apresentamos aqui, foram publicadas em vários artigos.
Algumas características mostraram-se universais — estes jovens provinham de famílias extremamente ricas nos seus países de origem, e os seus pais tinham-nos incentivado a estudar no estrangeiro, a aprender inglês e a viver um estilo de vida global. No entanto, os seus percursos para se juntarem às fileiras dos super-ricos globais variavam consoante a sua origem e o que pretendiam fazer com as suas vidas.
Cidadãos do mundo?
Ainda que a escola suíça exclusiva onde estudavam prometesse que seriam “cidadãos do mundo”, o que acontecia é que estes membros da Geração Z pertenciam a grupos de amigos determinados pela sua origem nacional ou língua — justificado em parte porque partilhavam referências e valores culturais e em parte devido à pressão para se conformarem. Como nos disse um estudante: “Se eu me quisesse sentar com outros amigos, [o meu grupo] diria: ‘Estás zangado connosco?’”
Mesmo quando começaram a fazer carreira no estrangeiro, estes jovens não romperam totalmente os laços com os seus países de origem. Viver no estrangeiro pode “ser solitário”, dizem-nos, enquanto o país de origem oferece “mais recursos e mais apoio... família e também amigos”.
No entanto, estes jovens também estavam conscientes de que conhecer colegas ricos de todo o mundo na escola poderia levar a oportunidades de negócios internacionais no futuro. Como um deles explicou: “Sem dúvida que há vantagens em fazer amigos de todo o mundo. O perfil geral dos estudantes aqui é o de famílias de classe alta, por isso, estaríamos a fazer amigos poderosos e ricos e isso é uma vantagem.”
“Não voo em companhias comerciais”
Quando eram adolescentes, abraçaram o consumo flagrante. Ficavam em hotéis de cinco estrelas, faziam compras de marcas de luxo e um deles até doou uma mochila Louis Vuitton pouco usada a refugiados locais. Como descreveu um estudante, não voavam em “companhias comerciais”.
Os recursos financeiros das suas famílias tornavam estes hábitos possíveis, mas os próprios hábitos eram um produto do tédio: “Vou atrás de uma coisa quando quero essa coisa, sabes? Anseio por isso. Preciso dela. Movia montanhas para a ter se fosse preciso. Mas quando realmente a tenho... não tem significado para mim”, disse-nos uma jovem. A compra de objectos e experiências proporcionava um alívio a curto prazo do tédio. Mas a facilidade com que obtinham estas coisas apenas os deixava mais aborrecidos.
No entanto, quando se tornaram jovens adultos, tinham empregos com significado para eles e viviam de acordo com os seus rendimentos, embora muitas vezes contassem com o dinheiro da família e os contactos a que recorriam em caso de necessidade. Ainda assim, estes jovens orgulhavam-se da auto-suficiência, que associavam ao “crescimento”, ao “carácter” e ao “respeito por si próprios”.
Embora um dos entrevistados ainda conduzisse um Aston Martin, o estilo de vida luxuoso e estereotipado dos super-ricos da sua juventude parecia ter menos importância à medida que envelheciam.
Racismo e geopolítica: sair da bolha da escola
No colégio, a riqueza era a norma — os poucos alunos bolseiros eram em grande parte deixados de fora dos grupos sociais — e isso definia grande parte das identidades sociais destes jovens. Como explicou um jovem russo: “O tipo de pessoas que vem para cá é muito rico, certo? Por isso, as pessoas daqui vêem frequentemente os russos como pessoas muito ricas. Não sei — é estranho, mas fica bem”.
No entanto, na transição para a universidade, estes privilégios foram postos em causa pelas realidades geopolíticas e pelo racismo. Esta situação intensificou-se com o tempo.
A geopolítica, por exemplo, significava que um estudante ucraniano abastado tinha de pensar em “coisas mais importantes (...) do que em qualquer coisa que quisesse ter”.
O racismo levou um jovem chinês que se tinha mudado para os EUA a repensar a sua decisão: “Basicamente, voltar para a China é dizer: ‘Oh, podia ser a pessoa branca, o homem branco da sala. E isso não seria bom? Não quero viver num lugar onde as pessoas pensam que não tenho personalidade, ou onde as pessoas me dizem que há um tecto de vidro”.
Possibilidades ilimitadas num futuro incerto
Uma questão que se colocava a estes jovens era o que queriam ser. Alguns sabiam — artista, empresário ou, na maioria das vezes, dono do negócio da família — e outros estavam a tentar descobrir.
Outra questão era onde queriam estar. Estes jovens estavam a ponderar se queriam voltar para casa ou ficar no estrangeiro e se queriam criar raízes ou continuar a mudar-se ao longo da vida.
Alguns destes jovens tinham como objectivo juntar-se aos super-ricos globais, enquanto outros queriam continuar a fazer parte dos ricos nos seus países de origem. Alguns abraçaram a aventura do desconhecido. Outros sentiam-se ansiosos com a incerteza. Apesar de pontos dos partida e oportunidades semelhantes, os seus percursos e objectivos eram muito diferentes.
Exclusivo P3/The Conversation
Karen Lillie é investigadora sénior no Instituto Max Planck para o Estudo das Sociedades. Claire Maxwell é professora de Sociologia na Universidade de Copenhaga.